rr.sapo.ptrr.sapo.pt - 26 jul. 10:30

Bruna Lourenço. "Diz-se que o futebol escocês é muito mais físico, mas vim para uma equipa que gosta de jogar"

Bruna Lourenço. "Diz-se que o futebol escocês é muito mais físico, mas vim para uma equipa que gosta de jogar"

Em entrevista à Renascença, a central internacional portuguesa explica a mudança para o Celtic, assume o desejo de chegar à fase de grupos da Liga dos Campeões e fala dos sonhos para o futuro de uma carreira que já passou por vários altos e baixos.

Um pagamento atrasado mudou a vida de Bruna Lourenço. Uma chamada levou-a para longe do Algarve e uma lesão frustrou a ascensão meteórica. Uma saída para o Benfica reabriu-lhe espaço no centro da defesa do Sporting. Numa carreira conduzida pelas casualidades – umas boas, outras más –, mas sempre pautada pelo desejo de evoluir e ser feliz, a internacional portuguesa decidiu, este verão, pegar no volante e viajar para a Escócia, em busca de um novo desafio.

Assim deixou o Sporting e rumou ao Celtic. As listas horizontais a verde e branco não são o único ponto em comum entre as equipas portuguesa e escocesa: ambas lutam por títulos, vão disputar a Liga dos Campeões na nova época e gostam de controlar os jogos com bola. Esse foi, aliás, um dos fatores para a preferência de Bruna pelas católicas, mesmo num contexto de jogo direto e maior fisicalidade.

Também a vontade de continuar a crescer: "Acredito que me vai obrigar a crescer na agressividade dos duelos e, principalmente, no controlo da profundidade."

Em entrevista à Renascença, a defesa-central, de 25 anos, fala também dos benefícios de ter jogado com rapazes até aos 17 anos, da mudança para o Sporting - e dos tempos difíceis em que batalhou com uma lesão que nunca mais acabava - e dos sonhos para o futuro. Afinal, o futebol inglês está mesmo ali ao lado.

O que é que te levou a escolher o Celtic para continuares a carreira?
Eu queria um desafio novo na minha carreira, sempre quis ter uma experiência fora de Portugal. Acabou por surgir a oportunidade do Celtic, que estava perto de vir à Champions e de ser campeão. Obviamente, foi sempre um objetivo, também, jogar a Champions, ter essa possibilidade. Acabou por ser a oportunidade perfeita.

Senti que me queriam muito aqui, que me valorizavam, e isso fez-me, obviamente, escolher o Celtic. Estou muito feliz. Também é um clube grande, com condições muito similares ao Sporting. Portanto, seria sempre uma mais-valia para mim ter esta experiência.

A época só começa daqui a uns dias, mas que grandes diferenças é que tens detetado até agora entre o futebol português e o escocês?
Para mim é ainda difícil fazer essa comparação. O que se diz é que o futebol escocês é muito mais físico, no entanto, eu vim para uma equipa – e essa também foi uma das minhas prioridades – que gosta de jogar e gosta de ter bola. E é uma equipa bastante ofensiva, portanto, acaba por mascarar um bocadinho essa parte física do futebol escocês. Mas já tivemos dois jogos de treino e senti que é ligeiramente mais físico que em Portugal. No entanto, acho que será fácil adaptar-me a essa parte.

Como é que sentes que as tuas características podem ser valorizadas?
Eu sou uma jogadora que gosta muito de ter a bola e, mesmo sendo defesa-central, gosto de assumir alguns riscos. Obviamente, fiz a minha pesquisa antes de vir, e tive, também, uma conversa com a treinadora. Fez-me perceber que as minhas características seriam valorizadas e destacadas aqui, exatamente por ser uma equipa que também gosta de jogar. E felizmente, tem um sistema muito parecido ao do Sporting, a que eu estava habituada. Portanto, essa adaptação também está a ser facilitada e acho que pode destacar as minhas qualidades com bola.

Por outro lado, é um futebol mais direto, ou seja, vai obrigar-me a adaptar em termos de controlo de profundidade. Mais nesse sentido, no sentido mais defensivo. Acredito que me vai obrigar a crescer na agressividade dos duelos e, principalmente, num controlo de profundidade mais preciso.

Se fosse descrever-te, diria que és uma central que se sente confortável com a bola, mas também inteligente, no sentido em que compensas a falta de velocidade com a capacidade de perceber o movimento das avançadas e onde é que a bola vai parar, para conseguires intercetá-la. Como é que tu te descreves?
Eu descrevo-me como uma jogadora que gosta de ter bola, que gosta de pensar o jogo, gosta de correr riscos em termos ofensivos, procurar passes que quebram linhas de pressão. Defensivamente, estou a tentar crescer um bocadinho na parte da antecipação, mas sinto que, por ser uma jogadora que, por ler bem o jogo, e por pensar o jogo, acaba também por me ajudar e compensar essa falta de velocidade. Porque, infelizmente, não sou uma central muito rápida.

Mas esse conhecimento do jogo tático permite-me também, de alguma forma, compensar essa lacuna. Portanto, sim, tentar antecipar um bocadinho o que os outros vão fazer. Também acredito que no Sporting tive um ensinamento técnico muito grande. Esse conhecimento do jogo permite-me estar bem posicionada, com apoios corretos, para conseguir chegar a algumas bolas.

Sei que tiveram um treinador que insistia muito nessa parte dos apoios defensivos...
Sim, não só nos apoios, mas depois também no controlo das avançadas, para perceber onde é que estão. Por exemplo, quando elas começam a acelerar nós temos de corresponder à velocidade delas. Várias coisas, ainda estou a tentar evoluir também um bocadinho nesse sentido, no controlo das referências, no controlo da profundidade, mas pronto, a parte teórica eu diria que sei toda, a prática nem sempre é fácil de aplicar. Mas, obviamente, vamos crescer nisso.

Glasgow é uma cidade industrial e aquela zona é um bocadinho mais rural. Vindo de Lisboa, como é que tem sido a adaptação a uma cidade tão diferente? E fora da costa.
Eu acho que essa parte da costa é que mais me está a custar, porque eu sou do Algarve e estou muito habituada a ter a praia por perto. Ainda por cima, estamos no verão e eu gosto muito das “vibes” de verão, dos convívios. E embora aqui também seja verão, não é um verão português. A parte do clima eu acho que é a que mais me influencia.

Mas está a ser uma adaptação fácil. Eu acredito que não tanto pela cidade, mas pelas pessoas. Os escoceses são pessoas muito simpáticas. Diria que, pelas minhas colegas de equipa, e também porque nós temos algumas estrangeiras e vivemos todas muito perto – uma casa ao lado da outra, na verdade –, está a ser bastante fácil. Elas tornaram esta integração muito, muito fácil. Após a primeira semana, não diria que estava totalmente confortável, mas estava bastante.

Em relação a Glasgow em si, ainda não tive a oportunidade de conhecer assim tanto. Mas é uma cidade que tem alguma vida. Embora não tenha praia, tem muitos parques. A Escócia está cheia de parques. O Reino Unido, no fundo. E eu também gosto disso, portanto, será substituir quase uma coisa pela outra, na procura de tentar, não diria ser feliz, mas estar super bem aqui

A título de curiosidade, Glasgow, em gaélico, quer dizer "[querido] lugar verde”. E é das cidades com mais espaços verdes da Europa.
Não sabia, mas é bom saber. Mas faz todo sentido, porque tem muitos parques por aqui.

Estavas a falar do balneário, da receção que a equipa te fez. Já tens algum episódio que te tenha marcado?
Estou a pensar se tenho algum episódio, acho que não. A única coisa que dizem aqui é que o meu inglês é muito australiano, não sei porquê, não faço ideia.

Obviamente, é muito difícil entender os escoceses. Nos primeiros dias... Eu ainda me perco, às vezes. Elas às vezes estão a conversar e eu perco-me, porque é impossível entender [o sotaque] escocês. Mas só isso. Mas as colegas com quem eu vivo são quase todas americanas e esse inglês é mais fácil, é mais tranquilo de perceber.

Mas quando estou dentro da equipa, às vezes, ou mesmo no treino... Eu tenho uma central que é muito escocesa. Eu diria que é o escocês mais difícil que até agora encontrei. E ela dá-me “feedback” ou fala para mim e eu, sinceramente, às vezes não percebo nada.

Tenho uma central que é muito escocesa. O escocês mais difícil que até agora encontrei. E ela dá-me 'feedback' ou fala para mim e eu, sinceramente, às vezes não percebo nada."

No fundo, chegas à Escócia australiana e vais sair americana.
Sim [risos]. Mas é curioso, porque, mesmo no Sporting, o meu contato era mais com o americano. Acho que a única australiana com quem eu tive contato foi com a Jazz [Jacynta Gala], que curiosamente esteve aqui antes de mim.

Tens facilidade com o inglês, os teus posts nas redes sociais normalmente são em inglês. Ou seja, também sentes que isso te deu facilidade para chegares a um país de língua inglesa e integrares-te melhor?
Sim, curiosamente, o meu inglês foi evoluindo. Na escola, línguas nunca foram, e continuam sem ser... As línguas continuam sem ser o meu forte. Mas eu sempre soube que o inglês seria uma língua importante para o meu desenvolvimento e para o meu futuro. Diria que evoluí muito no Sporting. Por exemplo, eu tinha a Hannah Seabert [guarda-redes norte-americana] atrás de mim e nós tínhamos uma relação próxima. Portanto, o facto de falar com elas [falantes de língua inglesa do Sporting] e tudo mais obrigou-me, de certa forma, a evoluir o meu inglês. Elas não falam português. Acabou por ser bom para mim.

E mesmo quando eu cheguei cá, o facto de eu ser portuguesa e falar um inglês fluente foi uma surpresa para elas. Acredito que por algum preconceito, também, porque estamos muito perto da Espanha e os franceses também não falam muito inglês, então acredito que mais por esse lado elas ficaram um bocadinho surpreendidas por eu ter um inglês fluente. Mas é uma coisa que facilitou. Ainda que não perceba totalmente o sotaque escocês, acabo por perceber a maioria e, obviamente, o tempo vai passando e eu vou percebendo melhor e será mais fácil para mim. Mas, sim, o facto de ter um inglês minimamente fluente – não é perfeito – ajuda-me muito.

Jogaste com rapazes até aos 17 anos, no São Luís. Consideras que isso ajudou ao teu desenvolvimento?
Considero que me ajudou muito, principalmente pelo momento em que isso aconteceu. E no fundo foi uma opção própria, com a ajuda, na altura, da Associação de Futebol do Algarve (AFA). Quando eu passei para os iniciados, isso foi uma regra que foi alterada mesmo nesse ano e foi a nível nacional, mas quando eu passei para juvenil isso não acontecia e, então, a AFA reuniu-se na altura para eu poder continuar a jogar com rapazes a nível distrital e só no meu segundo ano de juvenil é que passou a ser a nível nacional.

Foi uma opção própria, na altura, mas eu acredito que me ajudou muito, pelo contexto que se vivia na altura. Eu era do Algarve e a única equipa feminina, que tinha acabado de ser criada, era o Guia e as condições não eram muito boas. Acredito que me ajudou muito, pelo ritmo, pela agressividade, por serem rapazes – é sempre um contexto que é bom para qualquer jogadora. Sei que não é um ambiente fácil para todas as raparigas e nem todas conseguem estar nesse ambiente até tão tarde.

Mas eu também acredito que, hoje em dia, seja diferente e que a formação do futebol feminino em Portugal já é um contexto diferente – já existe, antes não existia, portanto, para mim, seria impossível integrar uma formação no feminino. Hoje em dia, isso já existe e com condições muito diferentes e muito boas.

No Algarve, ainda não. E em certas regiões do país eu acredito que muitas raparigas ainda beneficiem de continuar a jogar com rapazes até tarde, se assim conseguirem. Mas em clubes como Sporting, Benfica e clubes com uma formação desde cedo, acredito que elas hoje em dia já beneficiem muito mais dessa formação feminina.

Como foram os teus primeiros toques na bola? Ou seja, como é que tu te apaixonaste pelo futebol?
É uma história bastante caricata. O meu irmão jogava. Tenho um irmão mais velho, dois anos mais velho, que jogava. Eu ia com a minha mãe, assistia aos jogos e trocava umas bolas com os irmãos mais novos [dos jogadores] da equipa do meu irmão. E, portanto, esse contacto sempre foi frequente. Também jogava com o meu irmão fora dali. Mas a minha entrada para o futebol acontece por volta dos oito, nove anos, só.

Eu estive na ginástica, depois fui para a natação e fui de férias com o meu pai e, quando voltei, tínhamos falhado, tipo, um dia do pagamento da natação e, quando eu cheguei, não me deixaram entrar. Depois disso, eu fui para a lista de espera. Mas estava a demorar e a minha mãe disse: “Tens de fazer alguma coisa. Portanto, queres experimentar o futebol?” A ideia foi dela e eu só fui [risos]. E acabou por correr bem, eu adorei e até hoje.

"Fui de férias com o meu pai e, quando voltei, tínhamos falhado, tipo, um dia do pagamento da natação e não me deixaram entrar. Fui para a lista de espera, mas estava a demorar e a minha mãe disse: 'Tens de fazer alguma coisa. Queres experimentar o futebol?' A ideia foi dela e eu só fui. E acabou por correr bem."

Quando a tua mãe te sugeriu isso, qual foi a tua reação?
Foi um “porque não?” Essa ideia também surgiu porque uma colega minha da ginástica estava nessa equipa para onde eu fui. Então, pronto, era uma cara conhecida, que me facilitava, era um clube acabado de criar. Tinha, se calhar, um ano, nem isso. Portanto, fui só, experimentei, adorei. Acho que jogar com rapazes foi muito bom. O meu pai não adorou a ideia, mas agora reconhece que foi bom.

Porque é que o teu pai não adorou a ideia na altura?
Acho que teve muito a ver com a logística dos balneários, que sempre teve de haver, e de eu estar num ambiente cheio de rapazes e ter de existir essa logística. Mas sempre foi uma logística muito tranquila, as pessoas responsáveis no clube sempre me trataram super bem. Eles muitas vezes tiveram de esperar que eu tomasse banho primeiro que eles, porque não havia um balneário para mim, mas ainda hoje em dia eu sou a princesa daquele clube. Sempre foi muito, muito engraçado.

Bruna Lourenço no Sporting. Foto: Isabel Silva/Sporting CP Bruna Lourenço no Sporting. Foto: Isabel Silva/Sporting CP

Já alguma vez fizeste o exercício de imaginar, “se eu não tivesse falhado aquele pagamento, o que é que seria hoje em dia a minha carreira?” Talvez não fosses futebolista. Ou se calhar serias.
Exato. Nunca fiz esse exercício, na verdade. Mas acho que, na eventualidade, acabaria por ser futebolista na mesma. Porque, lá está, sempre existiu esse contacto com o futebol. E a verdade é que, hoje em dia, não vou fazer outra coisa. Eu nunca seria nadadora, porque... não era má, posso dizer que era boa nadadora, mas nunca quis competições naquele contexto. Portanto, isso é uma coisa que eu nunca seria ou que dificilmente aconteceria.

Acho que acabaria sempre por acabar no futebol, mais cedo ou mais tarde. Ainda bem que aquilo aconteceu, porque assim foi um bocadinho mais cedo.

Como é que foi a transição para o Sporting?
Foi uma transição fácil, diria. Eu estava mentalizada que tinha de sair do Algarve nesse ano, porque era o meu último ano a jogar com rapazes e, portanto, estava mentalizada que, se queria levar isto um bocadinho mais a sério, teria de sair de lá. E curiosamente a oportunidade do Sporting acabou por surgir exatamente nesse ano, no primeiro ano do [futebol feminino no] Sporting. Eu lembro-me de estar na escola e receber um telefonema da Raquel [Sampaio, antiga diretora desportiva do Sporting], que hoje em dia é minha agente, a convidar-me. Depois, acertámos tudo para eu ir e acabou por ser uma transição muito fácil, até porque na altura eu fui com uma das minhas melhores amigas, que tinha conhecido na seleção, a Constança [Silva]. Também já conhecia a [Ana] Capeta, já conhecia algumas jogadoras que também foram e, portanto, essa transição acabou também por ser fácil.

Obviamente, um contexto de balneário feminino e de uma coisa um bocadinho mais profissional foi diferente. No entanto, esse profissionalismo também foi crescendo ao longo dos anos que eu estive lá. Foi um ano bom, em que eu me consegui impor numa primeira equipa com 17 anos, no meu primeiro ano de futebol feminino. Infelizmente, depois, acabei por me lesionar no final dessa época e depois foram dois, três anos complicados, mas diria que o primeiro ano foi um dos melhores anos.

Tiveste alguns problemas com lesões, mas como é que foi esse período em que tiveste de batalhar com os problemas físicos, como é que foi o teu processo psicológico? Agora conseguiste deixar esse período para trás, mas como é que foi na altura, tão jovem, lidar com as lesões?
Não vou mentir, foi difícil. Eu estava a conseguir impor-me num contexto de equipa A, tinha acabado de chegar à I Liga e estive, inclusivamente, no onze do ano dessa época, portanto, as coisas estavam a correr muito bem. E lesionar-me foi difícil, porque estive praticamente um ano de fora após isso. E nesse ano em que eu me lesionei era ano de europeu também [Euro 2017]. A chegada à seleção A estava em vista, já nesse ano.

Foi um voltar à terra. E depois, após isso, foram duas, três épocas muito complicadas, em que tive de ir jogar à equipa B para voltar a ganhar ritmo, porque não tinha espaço na equipa A. Portanto, foram épocas complicadas, com poucos minutos, quando o que eu precisava era de minutos para voltar a jogar e voltar a sentir essa confiança.

Eu digo sempre que o ano de covid acabou por ser um ano bom para mim, porque essa paragem foi um período em que eu tive tempo para refletir, para ter tempo para mim, para ter tempo para outras coisas também. Para me preparar, depois, para a época seguinte, não sabendo o que ia acontecer. Na altura, coincidiu com a saída da Carole [Costa] para o Benfica e isso também abriu espaço para mim. Porque, obviamente, a minha concorrência não era muito fácil. Com a Nena [Nevena Damjanovic] e com a Carole, era quase impossível entrar naquele onze. Mas pronto, depois, esse período em que eu consegui trazer uma mentalidade diferente e preparar-me de forma diferente para uma época nova coincidiu com essa saída e acabei por me voltar a afirmar e por voltar a ter muitos minutos. E foi bom, depois acabou por ser bom.

Bruna Lourenço num treino do Celtic. Foto: Celtic FC Bruna Lourenço num treino do Celtic. Foto: Celtic FC

Acabaste por evoluir com o Sporting, porque, à medida que o profissionalismo no futebol feminino português evoluía, tu também fizeste esse percurso. Que avaliação é que tu fazes desses oito anos no Sporting? O que é que terá ficado por fazer e de que é que te orgulhas de ter feito?
Eu diria que foram oito anos de muito, muito crescimento. Não só a nível futebolístico, a nível pessoal, esses anos mais complicados. Há sempre coisas boas a tirar disso e esses oito anos têm um balanço muito, muito positivo, ainda que com períodos mais complicados. Isso é em tudo na vida e haverá sempre. Há sempre coisas boas a tirar disso, portanto, eu diria que o balanço desses oito anos é muito positivo.

E acredito que, a nível futebolístico, cresci muito, principalmente, porque, lá está, fui acompanhando esse crescimento do futebol profissional, do profissionalismo em Portugal e, mais do que tudo, eu acredito que esse profissionalismo trouxe muito crescimento a nível tático no futebol feminino. Esse conhecimento do jogo e esses pormenores que antes não eram considerados.

Aprendi muito a nível tático no Sporting, porque todos os treinadores que tive, enquanto lá estive, eram muito focados nesses pormenores. Portanto, os princípios de jogo é algo que eu hoje em dia sei muito bem. E depois, lá está, a nível físico, as condições que nos foram dando e que nos permitiram crescer, esse conhecimento do nosso corpo e essa evolução física, que está a crescer no futebol feminino também... foi também algo que o Sporting me deu muito.

"Fui acompanhando o crescimento do futebol feminino, do profissionalismo em Portugal. Mais do que tudo, acredito que esse profissionalismo trouxe muito crescimento a nível tático no futebol feminino."

Uma central nunca joga sozinha, no meio. Jogas sempre com mais uma ou mais duas. Qual foi, até agora, a tua parceira de centro da defesa favorita? Com quem gostaste mais de jogar ou com quem havia maior conexão.
Eu posso estar a ser injusta, mas... Tive um prazer gigante com todas, todas me deram coisas diferentes e eu aprendi com todas. Mas, se tivesse de escolher, escolheria a Nena [Damjanovic]. Foram duas épocas com ela e numa altura em que eu estava a voltar, portanto, apanhou-me também numa altura em que foi importante para mim ter essa experiência e essa confiança que ela me transmitia ao meu lado.

Portanto, não só pelas características dela, mas também pela altura que eu estava a viver naquele momento, tenho de dizer a Nena, porque me ajudou bastante e me fez crescer muito.

Ainda hoje em dia, ela veio jogar a Glasgow e eu fiz questão de ir ver o jogo para estar com ela, porque já não estávamos juntas há algum tempo. Portanto, tenho de dizer Nena.

Qual é a sensação de poder disputar a Liga dos Campeões?
É muito especial. Lá está, foi uma das coisas que me puxaram para o Celtic. É um objetivo pessoal, acho que é um objetivo de quase todas as jogadoras, se não de todas, disputar a Champions League. Portanto, ter essa oportunidade aqui é muito, muito especial. Espero que corra bem.

Seria incrível conseguirmos chegar à fase de grupos [Celtic vai defrontar o KuPS, da Finlândia, e se vencer terá pela frente Gintra, da Lituânia, ou Agarista, da Moldova]. Não é, obviamente, um caminho fácil, mas é muito especial já estar nos “play-offs” e poder ter essa experiência. Seria ainda mais especial poder chegar à fase grupos.

Consideras que a experiência no Celtic te pode ajudar a regressar à seleção nacional?
Nunca vou esconder, a seleção é sempre um objetivo e eu gosto muito de representar Portugal e de estar naquele contexto. É sempre muito especial e espero que este contexto de Celtic me possa trazer de volta e que consiga, de alguma forma, marcar uma presença mais assídua na seleção. Não é algo fácil, porque é um grupo com muita qualidade, pouco espaço. Estou consciente disso, mas não deixa de ser um objetivo por isso. O sonho continua lá e o trabalho para lá chegar também.

Quais são os objetivos que delineias, a nível individual e coletivo?
Eu sinto que este ano é um ano que me vai trazer muitos desafios e que me vai fazer crescer muito. Por enquanto, também por a época passada não ter sido muito fácil para mim, o meu objetivo principal, por agora, é voltar a desfrutar do futebol e gostar de estar lá dentro. E é algo que está a acontecer.

Eu estou a desfrutar muito. Ainda que só esteja cá há quatro semanas, estou a desfrutar muito de voltar a jogar, de estar confiante e de fazer aquilo que sei e com vontade de crescer. É algo que tem sido muito bom nestas quatro semanas.

Em termos coletivos, um clube grande tem sempre o objetivo de ganhar tudo. Se esse objetivo já estava presente no Sporting, não vim para um contexto diferente, porque eu adoro ganhar e adoro essa pressão de querer ganhar e de ganhar troféus. Adoro a pressão de finais e de decisões importantes, portanto, acho que é isso também que me move um bocadinho e, portanto, adoraria ganhar tudo pelo Celtic.

Dizes que sentias necessidade de voltar a desfrutar do futebol. É algo que estavas a perder um bocadinho em Portugal?
Sim, também porque não tive tantos minutos como gostaria na época passada e, portanto, as coisas mudam sempre um bocadinho. E de alguma forma senti, não que estaria a estagnar, mas senti que aquilo tinha para fazer em Portugal, pelo menos por agora, estava feito. A título pessoal, não é que estivesse confortável ali, mas precisava de um contexto diferente e de um desafio novo para, talvez, poder dar o salto.

O que é que cada passo, até agora, te deu, que guardes para o resto da tua carreira, e o que é que esperas agora que o Celtic te dê também?
Eu diria que jogar com rapazes foi uma formação diferente, mas foi algo que me trouxe alguma intensidade no jogo e alguma capacidade de liderança. Acho que moldou um bocadinho a minha personalidade, o facto de jogar com eles durante tanto tempo, porque, lá está, não era um ambiente fácil – que acabou por ser fácil para mim, também, um bocado pela minha personalidade, mas acredito que também me tenha moldado um bocadinho, no bom sentido.

Depois, os oito anos de Sporting permitiram-me um crescimento a nível tático de futebol e de pormenores. E, obviamente, deu-me um contexto de balneário feminino. Foram oito anos muito bons, difíceis, que me fizeram crescer. Foi sair de casa, crescer muito a nível pessoal, passar por momentos mais complicados por que nunca tinha passado, de lesões, mas que me fizeram crescer muito. Ganhar títulos também foi muito bom. Fez-me também chegar à seleção A.

Agora, no Celtic, acaba por ser desfrutar, lutar por títulos, continuar a crescer nos meus objetivos pessoais e em características pessoais. Quem sabe, voltar à seleção A. Quem sabe chegar a uma fase de grupos de Champions.

E quais são os teus sonhos de futuro mais além?
Por enquanto, eu assinei por dois anos, portanto, tenho dois anos de contrato por aqui. Mas gostava de explorar, talvez, uma liga espanhola, uma liga inglesa, no futuro. É algo de que gostava, vamos ver o que acontece. Acho que passa um bocadinho por aí.

Entre a Escócia e a Inglaterra...
[risos] Geograficamente, está muito perto.

Seria um salto interessante, no futuro?
Sim, era bom. Não me importava.

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