eco.sapo.ptRui Castilho Dias - 26 jul. 18:22

A IA na Administração Pública Local: Transformar a gestão do território centrada no cidadão

A IA na Administração Pública Local: Transformar a gestão do território centrada no cidadão

A evolução da Inteligência Artificial é uma oportunidade para melhorar a interação dos cidadãos com a Administração Pública local, existindo alguns casos de sucesso implementados em vários contextos.

O ideal defendido pelo sociólogo alemão Max Weber, na sua teoria burocrática da administração, pretendia garantir, por via da burocracia, a racionalidade na gestão de processos em instituições complexas, nomeadamente organismos públicos. Atualmente conotada de forma menos positiva, a burocracia é na verdade um princípio fundamental, que nos garante a igualdade e equidade de acesso e tratamento nos serviços públicos, através da impessoalidade, formalidade, profissionalismo e estrutura hierárquica de decisão.

Com os anos, a nossa sociedade tornou-se mais complexa, assim como a própria relação dos cidadãos e empresas com a Administração Pública. Novos quadros legais, regulamentos, uma panóplia de exceções, impostos, taxas, benefícios, apoios, métricas e indicadores tornaram também as entidades públicas mais intrincadas sobre si mesmas, com grande parte destas responsabilidades de gestão a serem transferidas para a administração local.

Deste modo, o processo contínuo de modernização dos agentes com impacto nos territórios (Autarquias, CIMs, Universidades e Politécnicos) é essencial para garantir eficiência no tratamento dos processos administrativos, potenciar a integração de sistemas e diferentes “linguagens”, acelerar procedimentos e colmatar a falta de recursos.

Nesse sentido, a Inteligência Artificial (IA) surge como uma ferramenta capaz de transformar a administração de cidades e territórios, potenciando a automatização de processos e promovendo uma gestão mais transparente e eficaz, melhorar a relação com o cidadão, visitantes e empresas, em processos cada vez mais “citizen-centred” e participativos.

O recurso à IA permite-nos automatizar o atendimento, o processo de pedidos e gestão de documentos, reduzindo o tempo de resposta e melhorando a precisão do procedimento, enquanto liberta recursos para outra áreas de gestão. Por outro lado, algoritmos de IA permitem analisar grandes volumes de dados rapidamente, facilitando processos de decisão abertos à comunidade e implementação de políticas mais informadas e consolidadas. Plataformas automatizadas podem analisar comentários dos cidadãos, identificar padrões e sugerir melhorias nos serviços, enquanto a categorização automática de documentos torna as informações mais acessíveis para qualquer cidadão ou empresa.

Apesar dos benefícios, a implementação da IA não está isenta de desafios. Questões éticas, como a privacidade e segurança de dados, são preocupações legítimas que precisam de ser endereçadas. O relatório Ascendant Digital 2024, que analisa as motivações que levam as empresas a adotarem a IA, reporta que 39% das organizações nacionais apontam a falta de um modelo de governação de dados como o principal obstáculo à adoção de ferramentas de IA. Para superarmos esses desafios, é importante garantir que a implementação de ferramentas de IA sejam previamente acompanhadas de um trabalho de “data governance” dentro das organizações e assegurar que a regulamentação acompanha a evolução tecnológica, garantindo o seu bom uso.

A evolução da Inteligência Artificial é uma oportunidade para melhorar a interação dos cidadãos com a Administração Pública local, existindo alguns casos de sucesso implementados em vários contextos, que o evidenciam. Efetivamente, existem soluções práticas e de execução relativamente rápida que podem ajudar a mitigar esses desafios. E aqui é importante desmistificar que a implementação de ferramentas de IA não tem de passar necessariamente por investimentos exorbitantes, nem por implementação de projetos altamente complexos. Efetivamente, esta pode ser uma ferramenta prática e acessível, capaz de resolver problemas específicos e melhorar significativamente a qualidade dos serviços prestados.

São vários os exemplos em IA com elevada aplicabilidade, desde já, a transformação e produção automatizada de conteúdos sobre apoios, subsídios e emprego público, usando numa linguagem simples e compreensível; criação automática de resumos a partir de resoluções municipais; assistente generativo para apoio a turistas e visitantes; vigilância inteligente para deteção de resíduos abandonados e reconhecimento de esplanadas em vias urbanas, entre outros.

Considerando a administração local como a “última milha” de governo, é inspirador ter entidades públicas mais eficientes, transparentes e participativas graças à IA. De facto, um estudo da Public First, encomendado pela Google, revela que a IA pode aumentar a economia portuguesa em 15.000 milhões de euros, o equivalente a 6% do PIB.

Assim, é crucial desmistificarmos a implementação de casos de uso de IA como projetos complexos e dispendiosos. Existem desafios, sim, mas as soluções estão ao nosso alcance e podemos construir cidades mais eficientes, sustentáveis e participativas que contribuem para o desenvolvimento da boa relação entre a sociedade e a sua administração.

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