publico@publico.pt - 9 jul. 19:12
O pódio dos doentes
O pódio dos doentes
Porque será que existe a ideia, a meu ver errada, de que um doente com doença avançada, com franca exigência de cuidados médicos e de enfermagem, está a “ocupar” uma cama de um doente agudo?
O diagnóstico de uma doença, seja ela qual for, é um momento de mudança e adaptação para todas as pessoas. Quando esse diagnóstico traz consigo uma ameaça à vida, torna-se então um ponto sem retorno e a necessidade de adaptação eleva-se a obrigação.
A caminhada é muitas vezes sinuosa e difícil, pelas constantes visitas a médicos, realização de exames, consultas de especialidades variadas, cirurgias e internamentos. Esta dinâmica enfraquece e diminui a força inicial que possa existir — e a vontade de acreditar que um dia melhor virá reduz-se perante os obstáculos. O acesso e a disponibilidade de cuidados vai diminuindo à medida que a complexidade da doença aumenta. Não deveria ser ao contrário?
O acesso e a disponibilidade de cuidados vai diminuindo à medida que a complexidade da doença aumenta. Não deveria ser ao contrário?
A equidade no acesso aos serviços hospitalares será igual para todos os doentes? Porque será, então, que existe a ideia generalizada, e a meu ver completamente errada, de que um doente com doença avançada, com sintomas complexos e com exigência franca de cuidados médicos e de enfermagem, está a “ocupar” uma cama de um doente agudo?
Colocando os pontos nos "is": um doente com doença avançada, com necessidade de cuidados intensivos de conforto, de terapêutica subcutânea e de apoio à família merece menos estar numa cama de um qualquer serviço de Medicina ou Oncologia de que um doente que sofreu um enfarte ou um AVC? É óbvio que os cuidados deverão ser adequados aos doentes, mas quando os cuidados hospitalares são necessários são-no para todos. Os doentes com doença avançada não são exceção.
Com toda a certeza, faltarão camas de cuidados em serviços de Medicina e de Oncologia para realização de quimioterapia em internamento e para internamentos de doentes agudos. Mas os doentes não são mais merecedores de cuidados em função do seu grau de curabilidade.
Os doentes em cuidados paliativos necessitam de cuidados especializados e ativos em várias fases da doença e não são casos sociais, como muitas vezes são rotulados. São pessoas que necessitam de cuidados tanto quanto qualquer outro doente.
Escudarmo-nos na constante catalogação dos doentes só os deixará mais à margem, onde nenhum de nós quer estar quando estiver doente.
A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico