expresso.ptLourenço Pereira Coutinho - 13 jun. 10:31

Resultados das europeias: muito para refletir e pouco para festejar

Resultados das europeias: muito para refletir e pouco para festejar

Boa parte do “centrão” continuará indeciso entre reforçar o voto de confiança em Montenegro, ou em acreditar na apregoada moderação de Pedro Nuno Santos. Sobretudo, não quererá arriscar uma crise política nos tempos mais próximos e espera que os partidos cheguem a consensos sobre matérias fundamentais. Desde logo, o próximo orçamento do Estado.

Sobre o resultado das europeias do passado domingo, começo com um dado positivo: a abstenção diminuiu em relação a 2019, de cerca de 69%, para cerca de 62%. A taxa de abstenção de 2024 foi, inclusive, a mais baixa dos últimos 20 anos. Agora, o dado negativo: Portugal é o quinto país da UE com maior taxa de abstenção em europeias. Na maioria das vezes, as explicações para as abstenções elevadas tendem a “culpar” os partidos. Ora, a “culpa” não será inteiramente “deles”. Os cidadãos têm o direito de exigir do poder público e dos políticos mas, também, têm o dever, se não legal, pelo menos cívico, de participar e contribuir para a comunidade.

Com tantos partidos que, no conjunto, representam uma ampla pluralidade política, com tanta informação disponível e, agora, com a mobilidade de voto, não consigo entender como quase dois terços do eleitorado se abstém de exercer um dos atos de cidadania definidores da democracia: o voto. Ainda para mais, numa altura crucial para a União Europeia. Como já escrevi noutras ocasiões, a abstenção é uma opção legítima mas questionável, pois acaba por ser um ato de demissão do exercício de cidadania. Além, do mais, quem quer manifestar o seu protesto contra o “sistema” e os partidos tem sempre a opção de votar em branco. Á atenção dos quase dois terços de meus concidadãos que acharam que não valia a pena perder meia hora do seu domingo para contribuir para a escolha dos nossos representantes no Parlamento Europeu.

Sobre os resultados, é curioso constatar que a relação entre as duas principais forças partidárias, AD e PS, continua como há três meses, ou seja, num quase empate técnico, sem que este tempo de governação e oposição tivesse um impacto de monta, positivo ou negativo. A vitória dos socialistas terá ficado mais a dever-se a uma menor abstenção do seu eleitorado de março, que à transferência de voto da AD. Ou seja, boa parte do “centrão” continuará indeciso entre reforçar o voto de confiança em Montenegro, ou em acreditar na apregoada moderação de Pedro Nuno Santos. Sobretudo, não quererá arriscar uma crise política nos tempos mais próximos e espera que os partidos cheguem a consensos sobre matérias fundamentais. Desde logo, o próximo orçamento do Estado.

Já a subida da IL justifica-se não só por João Cotrim de Figueiredo ser um fator de soma, como, também, pela composição do eleitorado dos liberais, tendencialmente cosmopolita e interessado em participar na construção europeia. Tudo o contrário do que se passou com o Chega, onde António Tânger-Correia foi um claro fator de diminuição. O resultado das europeias provocou decerto muitas incertezas na cabeça de André Ventura. É que o voto de protesto não é militante. Pelo contrário, é incerto e volátil. Apostar quase tudo no eleitorado justicialista pode resultar em vitórias surpreendentes, mas estas são vitórias insufladas, que se esvaziam ao sabor do vento tão rapidamente quanto encheram.

Voto militante é o do PCP, que continua a concorrer coligado com “Os Verdes” na CDU (tão inexistentes nesta campanha quanto o PPM na da AD). Apesar de ter conseguido eleger um deputado, o resultado da CDU é mais um sinal do seu lento mas irreversível declínio. Os 4,3% que obteve seriam por certo ainda menos num cenário de eleições com maior participação, isto partindo do principio que, tendencialmente, os comunistas são dos eleitores que menos se abstêm. Também, o resultado do BE confirmou a sua tendência de declínio pós geringonça. Durante anos, PCP e BE disputaram algum eleitorado comum. Neste momento, não só tal continua a acontecer, como o BE tem de disputar praticamente o mesmo eleitorado com o Livre. Neste momento, estes três partidos equivalem-se, e o facto do desconhecido Francisco Paupério ter feito uma campanha praticamente sozinho, pode justificar porque o Livre teve menos umas décimas que BE e PCP, não conseguindo eleger qualquer deputado. No entanto, dos três, é o Livre que tem maior potencial de crescimento. Tem potencial para, em breve, suplantar BE e PCP.

É certo que os resultados das europeias não podem ser extrapolados de forma literal para o plano nacional. Contudo, servem para tomar o pulso ao eleitorado, pelo menos aquele que não se demitiu do seu contributo cívico. As europeias deixaram muito para refletir e pouco para festejar. Como escrevi aquando das legislativas, o atual cenário politico pede ainda mais bom senso, responsabilidade e sentido de Estado. Este é o tempo do diálogo, da moderação, e das reformas, não da demagogia, ou das atuações para as redes sociais. Á atenção de todos os extremistas, tanto de direita, quanto de esquerda.

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