www.publico.ptpublico@publico.pt - 12 jun. 17:41

Uma política industrial para acelerar a revolução dos veículos eléctricos na Europa

Uma política industrial para acelerar a revolução dos veículos eléctricos na Europa

No que diz respeito à importação de países terceiros, se são detectadas subvenções injustas, devem ser introduzidas tarifas mais elevadas para os veículos eléctricos.

A descarbonização é compatível com a competitividade industrial? Esta será uma das questões orientadoras do próximo ciclo institucional da UE. Esta questão está também no centro das reflexões sobre o futuro da competitividade económica da Europa que estão a ser levadas a cabo pelo antigo primeiro-ministro italiano e ex-presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, que afirmou recentemente no seu discurso em La Hulpe: “Temos, com razão, uma agenda climática ambiciosa na Europa e objectivos rigorosos para os veículos eléctricos. Mas num mundo em que os nossos rivais controlam muitos dos recursos de que necessitamos, essa agenda tem de ser combinada com um plano para proteger a nossa cadeia de abastecimento – desde os minerais essenciais às baterias e às infra-estruturas de carregamento”.

Concordamos plenamente com este apelo a uma política industrial forte no sector automóvel: prevê-se que um em cada quatro automóveis eléctricos vendidos este ano em todo o continente seja fabricado na China. Se não forem tomadas medidas, esta situação continuará a aumentar, minando o tecido industrial e social dos centros automóveis europeus na Alemanha e em França, bem como na Europa Central.

A Europa também está a lutar para conquistar a valiosa cadeia de valor das baterias no meio de uma dura concorrência mundial. Confrontadas com o forte apoio estatal e a supremacia tecnológica da China no Oriente e com os avultados subsídios dos Estados Unidos no Ocidente, muitas das empresas europeias emergentes estão a lutar para crescer.

Mas não tem de ser assim. A Europa tem um potencial significativo para se tornar um líder mundial no fabrico de várias tecnologias limpas, a começar pelos automóveis eléctricos. Os fabricantes europeus de automóveis comandam mais de metade das vendas mundiais de automóveis, o que lhes dá o capital e o reconhecimento da marca para terem êxito no mercado dos veículos eléctricos. A Europa pode também ser quase auto-suficiente em baterias de iões de lítio, uma vez que estão a ser construídas dezenas de gigafábricas em todo o continente.

Mas para que isso aconteça, precisamos de uma política industrial verde inteligente baseada nestes três aspectos.

Em primeiro lugar, a Europa deve manter-se fiel aos objectivos que fixou para si própria. A UE é o maior mercado único do mundo, com mais de 400 milhões de consumidores dispostos a comprar produtos de qualidade, o que a torna atractiva para o investimento. Mas esse investimento só se concretizará se houver uma visão política clara e uma política de longo prazo. É por isso que o Pacto Ecológico Europeu é a política industrial ecológica mais importante da União. Para os veículos eléctricos em particular, o objectivo de 2035 de eliminar gradualmente as vendas de motores de combustão é fundamental para a segurança do investimento. Só desde 2021, foram investidos cerca de 80 mil milhões de euros na cadeia de valor dos veículos eléctricos em toda a Europa.

Para os veículos eléctricos em particular, o objectivo de 2035 de eliminar gradualmente as vendas de motores de combustão é fundamental para a segurança do investimento

Mas todo este investimento pode estar em risco se passarmos os próximos cinco anos a questionar a direcção, como alguns querem fazer. Questionar as decisões da UE ou do Reino Unido relativas a 2035 no sentido de pôr termo à venda de novos automóveis fósseis pouco fará para melhorar os resultados das empresas ou preservar as suas quotas de mercado. Da Índia ao Chile, o mundo está a tornar-se rapidamente eléctrico. Em vez disso, a tónica deve ser colocada na execução desta visão. Isto significa duplicar a implantação do sistema de carregamento, oferecer modelos de automóveis eléctricos mais acessíveis e desenvolver cadeias de abastecimento nacionais de baterias limpas na fronteira da inovação.

Em segundo lugar, a UE precisa de tirar partido do poder do seu mercado único, tal como recomendado no relatório Letta. A aplicação de critérios de sustentabilidade mais rigorosos pode, por exemplo, recompensar a produção limpa local. Algumas empresas europeias já estão a construir baterias com uma das mais baixas emissões de carbono a nível mundial. Tanto a futura metodologia da UE no âmbito da nova lei relativa às baterias como o novo Fundo de Baterias devem recompensar este facto e estabelecer parâmetros de referência rigorosos em matéria de CO2 para promover a criação de um mercado.

Além disso, no que diz respeito à importação de produtos de países terceiros, se são detectadas subvenções injustas – na sequência de uma avaliação adequada baseada em factos devem ser introduzidas tarifas mais elevadas para os veículos eléctricos. Combinado com uma estratégia para impulsionar as cadeias de abastecimento europeias e o acesso a minerais de origem responsável, isto criaria uma atracção para investir localmente.

Em terceiro lugar, a UE precisa de aumentar o seu financiamento para tecnologias limpas inovadoras com um novo Plano de Investimento Verde da União. Nos próximos anos, a UE terá de desenvolver um orçamento “federal” forte para apoiar a implantação e o fabrico de tecnologias limpas, como as cadeias de abastecimento de veículos eléctricos. Isto pode ser feito, por exemplo, através do co-financiamento de projectos que sejam críticos para a resiliência ou que visem aumentar a produção industrial pan-europeia. Outro exemplo é o dos contratos públicos estratégicos, em que os fundos da UE podem ser utilizados para co-financiar contratos públicos nacionais de tecnologias inovadoras e incentivar a sua implantação à escala da UE sem criar custos excessivos para as entidades governamentais que efectuam os contratos.

Os próximos cinco anos serão decisivos para garantir que a descarbonização se torne uma oportunidade industrial importante para a Europa. Para que a Europa seja bem-sucedida, será necessária uma visão política forte, reforçada por um Plano Europeu de Investimento Verde e por uma política industrial mais incisiva.

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