www.sabado.ptJosé Maria Pimentel - 11 jun. 13:58

Uma mão cheia de nada? Implicações das Europeias para a política nacional

Uma mão cheia de nada? Implicações das Europeias para a política nacional

Opinião de José Maria Pimentel

Muito se tem analisado os resultados das Eleições Europeias do passado dia 9 de junho, em particular o excelente resultado da Iniciativa Liberal e a forte queda do Chega, dos 18% das Legislativas de março (que meio país ainda estava a digerir) para nem 10% dos votos, e, para este último, têm sido aventadas várias causas alternativas — não raro, contraditórias entre si, frequentemente, com uma boa dose de ‘wishful thinking’ — , sempre com um objectivo: retirar ilações práticas para a política interna, quer para o partido de André Ventura quer, sobretudo, para PS e AD. Mas a verdade é que, numas eleições de uma natureza completamente diferente das legislativas e que decorreram meros 2 meses depois da tomada de posse do actual governo, há provavelmente mais de irrelevante nestes resultados do que de grandes mensagens dos eleitores para os partidos. Vejamos. 

As Europeias sempre tiveram resultados distintos dos das legislativas. Em alguns casos, é verdade, os eleitores usaram-nas para dar um cartão amarelo ao partido do governo, ou mesmo à oposição. Mas com um governo tão recente, será verosímil que tal tenha acontecido? Parece-me improvável. Para compreender estes resultados basta, parece-me, ter em conta dois aspectos que diferenciam a forma como os eleitores olham para estas eleições em comparação com as eleições legislativas.

Primeiro, há sempre muito mais eleitores a absterem-se nas Europeias do que nas Legislativas. Há muitas pessoas que se interessam apenas moderadamente por política e que apenas em eleições que ditam o governo do país entendem que se justifica o esforço de acompanhar a campanha e, depois, de deslocar-se à assembleia de voto. Partindo deste pressuposto, que partidos é provável terem sido mais afectados por esta maior abstenção? Precisamente aqueles que em março conseguiram ir buscar mais votos aos abstencionistas. É esse foi, tudo indica, o caso do Chega.

Segundo, para muitos eleitores (partindo de um equívoco de base, é certo, mas isso é outra questão), as Europeias não são eleições "a sério". Não se disputa o governo do país; não têm um impacto directo no dia-a-dia. Isso implica que, mesmo para quem participa, o voto seja encarado de outra forma, com maior liberdade para se libertar das amarras do voto útil ou para premiar candidatos mais carismáticos. Veja-se o resultado do Bloco de Esquerda em 2019 (9,8%) ou do MPT de Marinho Pinto em 2014 (7,1%). E veja-se o resultado da Iniciativa Liberal em 2024, com Cotrim de Figueiredo. Cotrim era, de longe, o candidato mais bem preparado do centro à direita, e não me parece descabido admitir que muitos eleitores potenciais da IL haviam cedido em março ao voto útil para tirar o PS do poder. No caso do Chega, aplica-se quase o inverso. O candidato, Tânger Correia, foi manifestamente um erro de casting: alguém que consegue o combo difícil de ser um político inepto e parecer (ainda) mais radical que Ventura.

Em eleições de natureza diferente e com um governo tão recente, estes factos parecem-me mais do que suficientes para explicar a forte queda do Chega, o resultado da IL e mesmo o desempenho dos dois principais partidos (ambos mais resistentes à abstenção e a um voto menos pensado e ambos com candidatos razoáveis, sem serem brilhantes). Não é preciso puxar pela criatividade para encontrar causas na postura quer do governo quer da oposição neste início de legislatura, e muito menos é aconselhável o optimismo infundado de achar que uma parte substancial dos eleitores do Chega tiveram subitamente um rebate de consciência e regressaram aos partidos mainstream. Mais crónicas do autor 11 de junho Uma mão cheia de nada? Implicações das Europeias para a política nacional

Não é aconselhável o optimismo infundado de achar que uma parte substancial dos eleitores do Chega tiveram subitamente um rebate de consciência e regressaram aos partidos mainstream.

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