expresso.ptDuarte Costa - 14 mai. 07:04

A extrema-direita e o novo Processo de Radicalização Em Curso

A extrema-direita e o novo Processo de Radicalização Em Curso

As próximas eleições europeias, agendadas em Portugal para o dia 9 de junho, constituem talvez o último ato eleitoral em que podemos acordar antes que seja tarde demais

É hora de acordar. Nunca assistimos a uma situação tão grave no que concerne à radicalização das sociedades ocidentais para agendas de direita radical ou extremista desde a Segunda Guerra Mundial. É precisamente neste contexto que se inserem estes últimos acontecimentos a que assistimos, em que um jovem de inspiração ideológica nazi congemina com outros a morte de sem-abrigos que seria transmitida pela Internet, ou o caso do grupo extremista que invadiu de madrugada e atacou imigrantes nas suas casas, no Porto, enquanto dormiam. A ocorrência destes episódios constitui um sinal demasiado grave do alargado processo de radicalização em curso (PREC) e que não pode ser ignorado.

O PREC não teve início hoje, e tudo indica que a tendência seja para o seu agravamento. Desde os Estados Unidos da América (EUA), passando por França, Alemanha e até Portugal, generalizam-se os discursos de ódio e normalizam-se ideias radicais. Neste momento, a direita radical já se encontra no poder em vários governos, e em muitos casos acabou por se afirmar como o maior partido da ala direita.

Tudo isto reforça o ambiente hostil nas redes sociais, que são por definição um lugar internacional, onde abundam as narrativas que falam a língua do ressentimento, desde os EUA à Alemanha, e que vão estimulando a estigmatização de partes da população. Os empreendedores políticos e os extremistas em todo o mundo copiam-se uns aos outros e viralizam. Muitas vezes, estes discursos saltam das redes sociais para as televisões, e destas para o Parlamento, ou vice-versa, criando uma normalização do discurso de ódio perante as audiências. Em vários países, o discurso vai-se radicalizando e vão se criando discursos ainda mais extremados.

Para esta normalização do discurso de ódio, contribuem os representantes políticos (e outras figuras públicas), não só do Chega, mas até de partidos que começam a usar e abusar da mesma narrativa, e acabam, uma vez mais, por sinalizar que é aceitável ter atitudes claramente discriminatórias, que outrora seriam intoleráveis. Um dos casos mais graves e que marca a atualidade são as declarações do presidente do partido ADN que vem promover o Tarrafal e o uso de tortura e violência contra oponentes políticos e imigrantes irregulares. Estas são talvez as declarações mais graves feitas por um líder partidário na democracia portuguesa pós 25 de abril e mereceram da parte do Volt um pedido de apreciação das mesmas junto da Provedoria de Justiça, com vista a solicitar a extinção do partido por perfilhar ideologia fascista.

Para além disto, há um nível mais preocupante de radicalização, onde as pessoas se organizam e passam das palavras aos atos!

Não podemos ignorar também a radicalização que está a existir sobretudo entre os segmentos mais jovens, muitos destes menores de idade, e que passa por redes sociais como o YouTube, X ou TikTok, bem como no mundo dos videojogos, do qual são exemplo os chamados Incels. Estes Incels são caraterizados por serem normalmente jovens solitários que se radicalizam através da Internet e partilham de uma mundivisão de extrema-direita. Como exemplo desta radicalização dos mais jovens, podemos destacar o caso da Alemanha, país em que se assistiu a uma grande mudança no último ano no perfil eleitoral jovem, com estudos a indicarem que na faixa etária dos 14 aos 29, o partido de direita radical AfD é o mais popular. Esta também é uma realidade portuguesa, onde o Chega lidera a preferência entre os mais jovens, à boleia justamente da sua forte presença em redes sociais, como Instagram e TikTok. Outros estudos recentes indicam também um aumento à escala global de visões ultraconservadoras entre os jovens do género masculino, e um aumento da diferença entre homens e mulheres em termos ideológicos, com as mulheres a ficarem tendencialmente mais progressistas.

A maioria silenciosa precisa de acordar e abrir os olhos perante aquilo que se está a passar com a nossa democracia e os nossos jovens. Só um verdadeiro esforço conjunto dessa maioria política poderá resgatar a nossa democracia. Para isso, é essencial dar voz a partidos como o Volt que, a título de exemplo, procura fomentar a mobilização dos mais jovens para a defesa da democracia e para a construção de uma União Europeia a uma só voz, caracterizada por um bloco de 27 economias prósperas.

É necessário, portanto, que o centro político consiga mobilizar as pessoas do arco democrático para serem ativas na criação de novas alternativas políticas que rejeitem o radicalismo. Só com um reforço na desconstrução de narrativas radicais e radicalizadoras e com a implementação de programas que invertam a tendência para a radicalização, se conseguirá estancar esta onda extremista, que carece também de um reforço nos meios de segurança que fazem frente às forças terroristas.

Para além disto, são necessárias medidas políticas que acelerem a desconstrução do ódio e preconceito. Sendo este um problema transversal à União Europeia e que ameaça a paz social no nosso continente, assume-se como absolutamente essencial a intervenção política da União. Nesse sentido, uma das propostas do Volt para o próximo mandato europeu é a criação de instrumentos de apoio financeiro e o incentivo a organizações de cidadãos, municípios, plataformas de informação e empresas do setor da economia social a promover oportunidades de diálogo e de despolarização sobre temas fraturantes, que envolvem preconceitos e narrativas de ódio. Entre eles, o tema dos direitos humanos de imigrantes, mas também de ódio contra pessoas da comunidade LGBTQIA+, de minorias étnicas e até de mulheres. Em Portugal, ao longo dos últimos anos, temo-nos deparado com organizações mais ativas e na linha da frente, que trabalham na inclusão de migrantes e na desconstrução de discursos de ódio radicalizadores. Estas organizações, cujo trabalho é tão nobre e diferenciador, são muitas vezes desprovidas dos apoios e meios proporcionais à enorme relevância estratégica do trabalho que desenvolvem em prol da paz na Europa e para o reforço e qualidade das nossas democracias.

Para salvar a democracia precisamos de todos os democratas e, principalmente, da participação e mobilização massiva desta maioria silenciosa para votar e levar todos à sua volta a fazer o mesmo, já que não votar potencia o crescimento da direita radical que está a radicalizar a nossa democracia e os nossos jovens.

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Duarte Costa, cabeça de lista às eleições europeias pelo Volt Portugal

Miguel Sacramento Monteiro, especialista em ciência política

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