expresso.ptRui Oliveira - 12 fev. 11:59

A crise habitacional em Portugal requer ação imediata, comprometida e apartidária

A crise habitacional em Portugal requer ação imediata, comprometida e apartidária

“O preço de uma habitação é hoje tão impeditivo de um jovem sair de casa dos pais e esse processo é de tal forma atrasado que a nossa ineficácia coletiva em encontrar e concretizar soluções prejudica o desenvolvimento de uma geração inteira”, diz o presidente do Conselho Nacional da Juventude

Hoje, falo-vos sobre habitação e a sua centralidade enquanto tema, problemática e direito constitucionalmente reconhecido.

É comum ouvirmos falar sobre a importância de resolver a crise da habitação com que convivemos, a sua dimensão tornou-a inescapável, como temos visto, para qualquer dirigente político que pretenda encontrar apoio junto dos eleitores.

Não sendo um problema novo, o tiro de partida parece ter soado com atraso e apenas nos últimos 2 anos se tornou central na agenda política e, nestes últimos dias, com propostas concretas para os jovens.

O preço de uma habitação é hoje tão impeditivo de um jovem sair de casa dos pais e esse processo é de tal forma atrasado que a nossa ineficácia coletiva em encontrar e concretizar soluções prejudica o desenvolvimento de uma geração inteira.

E porque um problema nunca vem sozinho, deparamo-nos com outra questão central para o nosso país: a natalidade, que não sendo o foco hoje, não deve ser esquecida. Uma emancipação adiada é um projeto de vida adiado e, por vezes, abandonado ou reduzido.

Ao longo dos anos, o Conselho Nacional de Juventude tem vindo a defender um conjunto de propostas que considera importante para este plano.

A primeira, a médio e longo prazo, é a expansão do parque habitacional público, que tem de ser considerada uma prioridade nacional. Os nossos vizinhos europeus compreenderam há décadas a relevância de garantir um parque habitacional público que fosse além do meramente assistencialista. Conhecemos atualmente diversos países europeus que contam com uma oferta situada em 30%, por contraste aos nossos 2%.

Esta é uma proposta que poderia parecer extrema na sua natureza e talvez até ideologicamente vincada. Mas é errada essa avaliação, pois, se por um lado assenta numa aposta pública para encontrar uma solução, assenta de igual forma numa lógica de mercado, onde a criação de oferta afeta necessariamente o preço médio do praticado. Por isso, o valor do investimento público em habitação não pode continuar a ser direcionado maioritariamente, como tem sido, para a reabilitação do existente porque, dessa forma, pode-se melhorar as condições de vida de uma franja da população que já beneficia deste apoio, mas não se alarga o acesso àqueles que neste momento não têm alternativas. É essencial uma maior canalização de dinheiro e meios para este investimento e em especial para a construção de novas casas, bem como, a concretização das residências do Ensino Superior.

A segunda passa pela criação de mecanismos de apoio ao acesso ao crédito, para aquisição da primeira habitação, que é cada vez mais um bem adquirido por entidades de grande dimensão, não sendo vistos como casas para pessoas, mas como ativos financeiros.

Novamente, se Portugal acredita num Estado Social forte, deve intervir:

  • Isentando de impostos a aquisição da primeira habitação;
  • Garantindo o acesso aos empréstimos bancários, principalmente a disponibilização de ofertas sem valor de entrada, com garantia pública;
  • Aumentando a despesa dedutível em IRS, para despesas relacionadas com habitação, inclusive na aquisição;
  • Reduzindo o IVA da construção de habitações para 6%, reconhecendo que não se taxa como bem de luxo aquilo que é uma necessidade fundamental;
  • Inventariando o património público, convertível em habitações e a sua cedência aos municípios.

Por último, resta-nos falar sobre soluções de curto prazo, porque há respostas que têm de existir já hoje e as necessidades são evidentes e para isso, o próximo governo terá que continuar a dar respostas, seja no programa de arrendamento acessível e/ou no Porta 65 ou a solução de caráter imediata que possa vir a ser apresentada.

No Porta 65, o financiamento do programa deve ser atribuído a todos os jovens que se candidatem e que cumpram os critérios de admissibilidade, pois é de extrema injustiça que os jovens que se candidatem nos últimos meses do ano possam não ver atribuído o apoio, mesmo que com maiores dificuldades financeiras, por limitações orçamentais. Acreditamos também que é importante abandonar, para efeitos de admissibilidade, o conceito de renda máxima, transformando-o numa renda de referência para atribuição do apoio. É fundamental regulamentar a figura de um “seguro de renda” que substitua o fiador e albergar os jovens que estão a sair de casa para os seus primeiros meses de emprego e que não tendo ainda descontos de IRS com pelo menos 6 meses, possam candidatar-se de igual forma, pois esta é provavelmente uma das fases mais sensíveis e onde o apoio é ainda mais fundamental.

Finalmente, garantir condições habitacionais adequadas é uma prioridade. Investir em infraestruturas, normas de qualidade e reabilitação de edifícios antigos são alicerces para a construção de comunidades sustentáveis e habitáveis.

Concluo apenas que a crise habitacional em Portugal requer ação imediata, comprometida e até apartidária. Não podemos criar soluções que precisam de 10 anos para ter efeitos reais se não conseguirmos criar entendimentos político-partidários estáveis, que ultrapassam legislaturas.

É hora de transformar as palavras em ações concretas, pois no ano que marcamos os 50 anos de Abril, relembramos que este é um direito que nunca cumprimos, e sem ele estamos mais longe de construir um futuro melhor para Portugal.

Ao longo das próximas semanas, Rui Oliveira escreve sobre os temas que o Conselho Nacional da Juventude, enquanto órgão representante dos jovens, identifica como prioritários no pós-eleições. Depois dos Salários e Oportunidades e este segundo texto sobre Habitação, seguir-se-ão Educação, Coesão Territorial, Saúde e Democracia.

NewsItem [
pubDate=2024-02-12 12:59:43.371
, url=https://expresso.pt/opiniao/2024-02-12-A-crise-habitacional-em-Portugal-requer-acao-imediata-comprometida-e-apartidaria-d7485e34
, host=expresso.pt
, wordCount=860
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2024_02_12_1738023603_a-crise-habitacional-em-portugal-requer-acao-imediata-comprometida-e-apartidaria
, topics=[opinião]
, sections=[opiniao]
, score=0.000000]