www.sabado.ptAna Gabriela Cabilhas - 10 fev. 16:50

O maior investimento de sempre em anúncios

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Opinião de Ana Gabriela Cabilhas

A escassez de residências públicas, os preços elevadíssimos dos quartos e a diminuição da oferta no mercado de arrendamento, confrontada com a grande procura, continuam a empurrar os estudantes para situações em que o risco de abandono escolar é real.

Os estudantes são colocados no ensino superior, mas ficam desalojados. Uma etapa feliz na vida de um jovem rapidamente se transforma num cenário pouco animador. A cada ano letivo multiplicam-se histórias de quem não consegue encontrar quarto com condições dignas e a valores compatíveis com os rendimentos das famílias. Sem quarto, há estudantes que acabam por fazer longas viagens até à faculdade, chegando a perder mais de 4 horas por dia em transportes, resistindo ao cansaço, ainda que com impacto no desempenho académico. As associações de estudantes há muito que denunciaram este flagelo. Não foi por falta de aviso.

É preciso recuar mais de 5 anos para evidenciar o fracasso do Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior (PNAES). Em 2018, foi feito um levantamento das residências públicas, que mostrou que apenas 13% dos estudantes deslocados conseguiam encontrar vaga. Surgiu, assim, o primeiro plano de intervenção apresentado pelo Governo. O objetivo assentava na construção, reabilitação e requalificação de mais de 14 mil camas, sendo 12 mil o número de novas camas, entre 2019 e 2022. O PNAES resumiu-se a um plano cheio de boas intenções que não foram levadas a sério.

Com a falta de dinheiro para concretizar o investimento anunciado e com o agravamento da crise do alojamento estudantil, o Governo agarrou-se ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que veio trazer o reforço financeiro para construir e requalificar as residências. Aos estudantes foi transmitida uma certeza: o PRR seria a solução para a insuficiente oferta pública. O compromisso foi relançado como o "maior investimento de sempre" em alojamento estudantil, com a meta de intervencionar 18 mil camas até 2026.

O PRR seria, efetivamente, uma boa solução se não tivéssemos, nesta fase, apenas 474 camas concluídas, ou seja, 3% das camas prometidas. O ponto de situação, de dezembro de 2023, mostra ainda que 18% das camas estão com empreitada em curso, 32% com adjudicação da empreitada e 47% encontram-se na fase de trabalhos preparatórios, em projeto e em licenciamento. Convém recordar que Portugal foi o primeiro dos 27 a entregar o seu PRR em Bruxelas, sendo, de igual modo, o primeiro a ter nota positiva por parte da Comissão Europeia em junho de 2021. O PRR avança a passo de caracol e o tempo perdido é irrecuperável. Assim como são dificilmente irremediáveis as consequências para os estudantes, pela falta de soluções palpáveis desde 2018, que coloca o alojamento como barreira para aceder e frequentar uma formação superior.

Segundo o Observatório do Alojamento Estudantil, o preço médio de um quarto no Porto ronda os 420 euros e em Lisboa são 475 euros. Se considerarmos as despesas com o crédito à habitação ou o arrendamento de casa, existirão famílias com estudantes a frequentar o ensino superior a desembolsar mais de 1000 euros mensais só com habitação. O Estado tem o dever de agir de forma adequada e em tempo útil. As Instituições de Ensino Superior têm uma obrigação moral para com os estudantes e essa responsabilidade não se esgota nas paredes da sala de aula. Há Universidades e Politécnicos que não tiveram, até ao momento, qualquer cama a acrescentar às poucas que dispõem.

É necessário mais: mais ambição, mais camas públicas, mais empenho, mais recursos, mais rapidez e melhor acesso. Todas as instituições são poucas para assegurar uma oferta com qualidade e a preços acessíveis. As famílias não conseguem viver de grandes planos, pomposos anúncios e falsas promessas. Os estudantes precisam de soluções. Hoje, porque ontem já era tarde e amanhã será tarde demais.


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