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Orçamento deu milhões e milhões em apoios mas ainda saiu a lucrar com a crise em 2022

Orçamento deu milhões e milhões em apoios mas ainda saiu a lucrar com a crise em 2022

Mais receita à boleia da inflação, menos investimento público porque falharam fundos europeus, como os do PRR. É a execução orçamental de 2022.

O défice orçamental, medido em contabilidade pública (lógica de caixa, calculado pelas Finanças), terminou o ano de 2022 nos 3.590,8 milhões de euros, menos 1.600 milhões de euros ou menos 31% face ao previsto no Orçamento do Estado aprovado que vigorou durante o ano passado (OE2022), revelou o Ministério das Finanças, ontem, sexta-feira.

De acordo com um levantamento feito pelo Dinheiro Vivo com base nas séries da execução orçamental da Direção-Geral do Orçamento (DGO), a tutela do ministro Fernando Medina consegue assim a maior redução do défice público anual em 2022 desde 2019, o ano do "brilharete" do então ministro das Finanças, Mário Centeno.

Medina cortou o défice (contabilidade pública) em mais de 58% no ano passado, o que abre caminho a um resultado ainda mais baixo do que a meta estabelecida de 1,9% do produto interno bruto (PIB), em contabilidade nacional. Medina e o próprio primeiro-ministro, António Costa, já acenaram que isso irá acontecer: aventaram um défice de 1,5% ou mesmo 1,4% do PIB.

Por exemplo, há receitas de impostos, como IVA, que ainda vão ser cobradas este ano (janeiro e fevereiro), mas que correspondem a atividades de 2022. Assim, na lógica do compromisso (contas nacionais), essa receita vai ser imputada a 2022 e contribuir para baixar mais o défice do ano passado.

Esta redução do défice obtida por Medina só tinha sido superada (desde 2013) por Centeno, responsável por um desbaste do saldo (negativo) em mais de 72% em 2019, o que lhe permitiu obter o primeiro excedente orçamental da democracia: 0,1% do PIB. Portando, a compressão do défice em 2022 acaba por ser a segunda maior desde que Portugal saiu do programa de ajustamento do governo PSD-CDS e da troika.

Orçamento deu apoios mas ainda saiu a lucrar com a crise

No OE2022, o governo tinha obtido uma autorização do Parlamento para poder ir até um défice de 5,2 mil milhões de euros: resultado de um limite de 106,6 mil milhões de euros na despesa e de 101,4 mil milhões de euros na receita.

Mas, mesmo com os apoios às famílias e empresas contra os efeitos da crise inflacionista e energética, avaliados pela tutela em mais de 5,7 mil milhões de euros, o ministro Fernando Medina conseguiu o que sempre disse que queria: contas certas e rigor orçamental.

Assim, obteve uma folga assinalável na execução orçamental do ano passado, os tais 1600 milhões de euros que não foram redistribuídos pelos contribuintes, nem mesmo parcialmente.

Um dos grandes argumentos para conservar este tipo de margens ou execuções mais positivas do que o esperado é que o País tem uma dívida demasiado grande e precisa destas folgas para não ir tanto aos mercados, fazendo assim baixar o endividamento excessivos, que ainda hoje, mesmo a descer, continua acima de 110% do PIB.

Mais receita que o esperado e muita poupança no investimento

De referir que, do lado da receita, o governo conseguiu cobrar mais 3,8 mil milhões de euros face ao que estava previsto no OE2022, fruto de vários fatores, mas o que se destacou mais foi o efeito inflação que insuflou a faturação e os preços praticados pelas empresas, logo mais impostos arrecadados dessa forma.

Além disso, o mercado de trabalho continuou a andar bem, houve criação de empregos, o que se reverteu em mais 1,1 mil milhões de euros em contribuições para a Segurança Social face ao que estava orçamentado.

Do lado da despesa, a grande poupança aconteceu no investimento público, muito por causa da execução fraca e pobre dos fundos europeus (designadamente do PRR - Plano de Recuperação e Resiliência). Esta despesa em novo investimento ficou 2,4 mil milhões de euros abaixo do que se previa no OE.

A outra "poupança" aconteceu nos juros da dívida: o Estado pagou menos 240 milhões de euros face ao que estava à espera no OE.

Fonte oficial das Finanças explica que "as Administrações Públicas registaram um défice orçamental de 3.591 milhões de euros em 2022, na ótica da contabilidade pública", mas que "comparando com anos anteriores verifica-se uma melhoria [redução do défice] de 5.018 milhões de euros face a 2021, momento fortemente marcado pela pandemia".

Face a 2019, quando ainda não havia crise pandémica, o défice de 2022 é superior a 2.975 milhões de euros.

A redução do défice orçamental registado até dezembro de 2022 em relação ao período homólogo resulta de "um acréscimo de receita de 11% face a 2021 (e de 14,6% face a 2019) justificado pelo dinamismo do mercado de trabalho e da economia e pelo efeito da subida de preços [inflação]", confirma a fonte do gabinete do ministro das Finanças.

O recuo no défice entre 2021 e 2022 reflete ainda "um aumento de despesa de 5,1% face a 2021, influenciado pela redução em 37% de despesa efetiva associada à pandemia. Face a 2019, regista-se um aumento da despesa de 17,9%. A despesa primária aumentou 5,9% em termos homólogos (21,5% face a 2019)".

Mas "excluindo o efeito das medidas Covid-19, a despesa primária [despesa total sem juros] cresceu 8,5% em termos homólogos e 17,4% face a igual período de 2019", diz uma nota enviada aos jornais.

Impostos começam a vacilar

Como referido, os impostos e descontos sociais foram muito importantes para a execução orçamental em 2022, mas na reta final do ano começaram a vacilar e a refletir a maior debilidade da economia, o receio provocado pela subida rápida e forte das taxas de juro do Banco Central Europeu (BCE) e, ato contínuo, uma quebra da confiança na maioria dos agentes económicos.

A tutela de Medina confirma que "o crescimento da receita fiscal e contributiva abrandou no final do ano", mas que, ainda assim, "a receita fiscal e contributiva arrecadada em 2022 aumentou 12,4% face ao mesmo período de 2021, o que se deveu sobretudo ao contributo da receita fiscal (13,8%)".

E comparando com o ano de 2019, antes destas crises todas, "a receita fiscal e contributiva cresceu 14,4% face a 2019, tendo a receita fiscal aumentado 12,8%".

Quanto ao impacto do choque geopolítico nas contas públicas este "supera os 5,7 mil milhões de euros em 2022".

"As medidas de mitigação do impacto do choque geopolítico ascendem a 5.722 milhões de euros em 2022 (dos quais, 2.142 milhões de euros do lado da receita e 3.580 milhões de euros do lado da despesa)", sendo que "estas medidas explicam o fundamental da degradação do saldo orçamental verificada em dezembro".

Nas medidas de apoio às famílias, há a redução do ISP, "cujo impacto já ascende a 1.490 milhões de euros".

Além desta, o MF destaca "o complemento excecional de pensão: 987 milhões de euros", "o apoio extraordinários às famílias (apoio de 125 euros + 50 euros por pessoa dependente): 749 milhões de euros" e "o apoio a famílias mais carenciadas: 368 milhões de euros".

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