Portugal é, há séculos, um país de exilados. Sempre tivemos, salvo nos últimos 50 anos, cidadãos que, forçados, ou por escolha que normalmente precedeu o uso da força pública, se viram obrigados a expatriarem-se.

Desde Dom João VI que se transferiu para o Brasil, passando por Republicanos e Monárquicos, antes e depois de 1910, até chegarmos aos opositores do regime deposto em Abril de 1974.

Uns forçados a um exílio interno que era graduado entre o distante Timor e as mais próximas ilhas atlânticas, as agora Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, enquanto outros eram inexoravelmente afastados para outros países. Em qualquer caso o exílio foi, genericamente, uma arma para afastamento de intelectuais ou de burgueses com meios de fortuna que lhe permitissem suportá-lo.

E, assim, vivemos, pelo menos nos últimos dois séculos, a ver o país afastar, por períodos mais ou menos longos, os seus melhores, ou, pelo menos, muitos dos que integravam as pequenas e incipientes elites que o país ia formando. Foi um contributo para o nosso empobrecimento numa história que está por fazer.

Hoje já não há portugueses obrigados ao exilio. Mas, por vezes, parecem lobrigar-se novas formas de exílio, de voluntário autoexílio. Cidadãos que se fecham sobre si próprios, que abdicam de participar na vida colectiva, que, porventura desencantados, se exilam nas suas casas, dentro de si próprios, inventando Fortalezas de Refúgio.

Não tenho a certeza se o farão forçados pela sua consciência, ou se o farão por livre escolha. Também não sei se e quando regressam. Sei que, em muitos casos, continuam a ser muitos dos nossos melhores e o país não pode prescindir dos melhores.

Vale a pena recordar o início de um trabalho de Luís Farinha sobre o exilio de José Rodrigues Miguéis, e cito:

Ei-lo que parte:

“E a peregrinação recomeça, indefinidamente”

O exílio de José Rodrigues Miguéis – que talvez seja mais um autoexílio ou um expatriamento –, tem o mérito de nos colocar perante a ocorrência de um fenómeno histórico repetitivo na história portuguesa – o do homem de cultura “estrangeirado” que inicia esse êxodo com um Damião de Góis ou com um Luís António Verney –, por sentir estreitas as amarras da miséria e da pequenez nacional –, mas que encarna o espírito do seu tempo de forma empenhada e combativa: do humanismo de Góis ao Iluminismo de Verney vai um passo de tempo curto, e pouco menor que aquele que os separa da luta democrática, socialista e antifascista do tempo de Rodrigues Miguéis. Partem porque no país os constrange a pobreza, a miséria e a ausência de liberdade para acompanharem as novidades intelectuais e culturais do seu tempo. Empenham-se cultural e politicamente na pátria de adoção e raramente voltam, porque se voltassem raramente o país se disporia a aceitá-los e a aprovar-lhes a “fuga”.

Também Herculano se exilou internamente no seu Vale de Lobos:

Em 1867, retira-se definitivamente para a sua quinta de Vale de Lobos (Azoia de Baixo, Santarém) para se dedicar (quase) inteiramente à agricultura e a uma vida de recolhimento espiritual — ancorado no porto tranquilo e feliz do silêncio e da tranquilidade, como escreverá na advertência prévia ao primeiro volume dos Opúsculos.

Porventura tivemos e temos exílios a mais para o país que somos.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia. The post Exílio first appeared on O Jornal Económico .