Cinquenta anos depois de termos visto nascer a primeira área protegida (AP) no nosso território, Portugal tem ainda um longo caminho a percorrer em matéria de gestão e de financiamento com vista à conservação dos valores naturais, particularmente, num contexto global em que assistimos a uma perda de biodiversidade sem precedentes em resultado da ação humana depredatória.

Apesar da sensação de omnipotência que as conquistas e avanços tecnológicos falsamente nos transmitem, continuamos hoje tão dependentes como antes do mundo natural para garantirmos a existência de condições da vida na terra e para nos propiciar as mais essenciais das nossas necessidades: oxigénio, alimentos e água limpa.

Dificilmente pode ser contestado que a perda da biodiversidade representa um risco para a saúde humana, contudo, 70% dos valores naturais em Portugal estão em “mau estado” ou “degradados” . E ainda que as AP apresentem um bom nível de implementação, sobretudo, quando comparado com o que se passa noutros países latinos, subsistem diversas fragilidades, conforme uma auditoria recente do Tribunal de Contas .

De forma incompreensível, muitas são as AP que não dispõem de um qualquer plano de gestão ou de outro tipo de instrumento de planeamento com orientações de gestão. E, entre as que dispõem de tais instrumentos, o grau de implementação das ações neles previstas é inferior a 30%. O que sucede na maioria dos casos é que a gestão da conservação da natureza é, sobretudo, passiva e só, pontualmente, é feita com objetivos e metas claras de recuperação e/ou de manutenção de espécies, habitats e ecossistemas.

Também o financiamento das AP e do combate à crise da biodiversidade apresentam debilidades, quando os recursos financeiros são, sobretudo, provenientes do orçamento do ICNF e continua por aprofundar a implementação de instrumentos como a remuneração dos serviços dos ecossistemas.

Acresce que está por implementar, há mais de 16 anos, a Lei das Finanças Locais, ao abrigo da qual, e numa discriminação positiva, ficou inscrita a transferência anual de 60 milhões de euros para os municípios que possuem AP, prejudicando em quase mil milhões de euros as populações locais já de si sujeitas às necessárias regras mas inibidoras de determinadas atividades económicas.

Continuamos ainda sem acertar no modelo de gestão das AP, particularmente quando se opta por um modelo que se limita a proceder à transferência de competências para os municípios, sem assegurar igual transferência de meios humanos e financeiros, e criando, como refere a FAPAS, um “ caldo de indefinição entre “gestão” e “cogestão”, que resultará numa verdadeira “congestão ” com perda de importância e de protagonismo do ICNF.

As AP ficam assim mais vulneráveis à voracidade da expansão das atividades económicas, nem sempre compagináveis com o objetivo de conservação da natureza. Precisamos, por conseguinte, de repensar a estratégia para a gestão das AP, para evitar aquela que poderá vir a ser uma crise de meio século com impactos imprevisíveis.

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