visao.sapo.ptsvicente - 26 out. 12:12

Visão | A prova digital em processo penal

Visão | A prova digital em processo penal

Um telemóvel, um aparelho que todos temos, armazena todo um conjunto de informação em ambiente digital que pode ser utilizado para a investigação criminal de qualquer crime. Veja-se, por exemplo, que os dados de localização armazenados no telemóvel podem fornecer dados relativos à data, hora e locais onde o utilizador esteve e, dessa forma, permitir relacioná-lo com vários furtos ocorridos

A prova digital está longe de ser a prova dos crimes informáticos.

Na atualidade a prova digital é importante para a investigação da prática de qualquer tipo de crime.

Não só porque cada vez mais a informática é utilizada para a prática de crimes, mas também porque mesmo quando não utilizada para a prática do crime é possível obter provas dos mesmos armazenadas em ambiente digital.

O uso da informática é cada vez mais recorrente em todos os sectores da vida em sociedade, desde a defesa nacional, passando pela atividade científica, económica e financeira, na saúde, na educação, na segurança social e na Administração Pública em geral.

A prova digital corresponde a toda a informação passível de ser obtida ou extraída de um dispositivo eletrónico (local, virtual ou remoto) ou de uma rede de comunicações.

Pelo que o recurso a tal meio de obtenção de prova é hoje uma realidade habitual em qualquer investigação criminal, não só na criminalidade informática, mas é igualmente essencial na criminalidade económico-financeira, nos crimes contra o património, ou mesmo nos crimes contra as pessoas.

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Por outro lado, o recurso à automação das nossas casas e veículos pode, no futuro, permitir, por exemplo, que alguém consiga aceder remotamente ao sistema eletrónico de um veículo e utilizá-lo para atentar contra a integridade física ou mesmo a vida dos seus ocupantes.

A prova digital apresenta caraterísticas que a diferenciam dos meios de obtenção de prova clássicos: assume carácter temporário, podendo deixar de existir rapidamente; é fungível, dada a facilidade de substituição dos dados informáticos por outros; é volátil, pois facilmente se escondem esses dados, podendo ser ocultados ou suprimidos, do suporte original; e é frágil, exigindo especiais cuidados no seu manuseamento.

A legislação existente é manifestamente desadequada às especificidades da prova digital.

Para além disso a teia legislativa nacional é muito complexa, sobrepondo-se em camadas sucessivas, que ora parecem divergir e ganhar autonomia, ora parecem convergir e superar-se sucessivamente, tornando quase impossível a tarefa do magistrado que a tem de interpretar.

Exemplo disso são as dificuldades de conjugação entre as normas especificas previstas na lei do cibercrime e a sua conjugação com as normas relativos aos meios de obtenção de prova clássicos como as interceções telefónicas, a apreensão de correspondência ou o regime das buscas.

Pela sua presença na investigação de qualquer crime seria importante equacionar a reunião no Código de Processo Penal de toda a legislação relativa à prova digital e não num diploma marginal.

Por outro lado, a regulamentação deverá distanciar-se da prevista para os meios de prova clássicos e adequar-se às suas especificidades, designadamente à rapidez como a informação pode deixar de estar disponível ou como pode ser ocultada e que não se compadece com o formalismo exigido para os meios de obtenção de prova clássicos.

Será igualmente importante criar um quadro legal para as chamadas “buscas online”, determinando-se quando, em que medida e os moldes em que podem ser efetuadas.

Também carece de regulamentação a localização das viaturas dos suspeitos através da tecnologia GPS ou de qualquer outro dispositivo com recurso à mesma tecnologia.

Impõe-se ao legislador que crie um quadro normativo nesta matéria, onde além da necessária preocupação com a defesa dos direitos fundamentais, crie as condições para um efetivo exercício do ius puniendi estadual.

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