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A grande ameaça da covid-19

A grande ameaça da covid-19

O esforço coletivo, a ação conjunta enquanto comunidade, o especial cuidado com a franja populacional mais idosa, a imperiosa cautela face àquilo que é a capacidade dos nossos Serviços de Saúde são os alicerces fundamentais para vencer esta pandemia.

A OCDE define a população idosa como “pessoas com idade acima de 65 anos”, sendo a relação entre a população idosa e a população em idade ativa (15-64 anos) denominada por aquele organismo como taxa de dependência da terceira idade. Porém, a comparabilidade dos dados referentes à população idosa é afetada por diferenças, dentro e entre os países, na forma como, quer as regiões, quer a geografia das comunidades rurais e urbanas, são definidos.

Apesar das supracitadas especificidades, que não alteram de modo substancial os resultados estatísticos globais, verificamos, sem a menor surpresa, que as bases de dados do INE sobre estimativas anuais da população portuguesa e europeia, atual e num futuro próximo, mostram claramente pirâmides etárias de base estreita e tendencialmente alargadas no meio e no topo, indicando o envelhecimento crescente das respetivas populações.

Em 2015, na retoma da pós-crise financeira, no contexto europeu, Portugal apresentava o 5.º valor mais elevado do índice de envelhecimento (rácio de 143,9%) e o 3.º valor mais baixo do índice de renovação da população em idade ativa (relação entre o número de pessoas em idade potencial de entrada no mercado de trabalho – 20 aos 29 anos de idade – e o número de pessoas em idade potencial de saída desse mesmo mercado de trabalho – 55 aos 65 anos de idade).

Ora, no final de 2019, aquando do início do processo de elaboração do Plano Nacional de Saúde 2021-2030, vários especialistas nacionais e internacionais discorriam sobre o próximo ciclo de planeamento estratégico em saúde, de base populacional, em Portugal, que decorrerá na próxima década, sendo os principais desafios assinalados o crescente envelhecimento da população, a “epidemia” de doenças não transmissíveis, as iniquidades em saúde, as alterações climáticas, o fortalecimento do sistema de saúde, as migrações e as emergências em saúde pública.

Estando nós, em 2020, ainda no dealbar do novo Plano Nacional de Saúde e no término vigente do anterior Plano, a calamidade inerente à pandemia pela covid-19 antecipa dramática e inesperadamente alguns dos problemas inerentes à gestão de crises globais como aquela a que estamos a assistir. Se atendermos a alguns dados estatísticos reais e previsionais que atrás referi, constatamos facilmente a perigosidade pública de uma epidemia ou de uma pandemia como a que o vírus do momento nos impõe, sem experiência prévia acerca do seu comportamento, do seu grau de agressividade, da sua capacidade de propagação, enfim, em termos de saúde pública, entenda-se de mal-estar bio-psico-social e da sua prevenção, gestão e resolução com o menor número de danos e efeitos colaterais possíveis.

Se atentarmos nas conclusões que a missão da OMS em Wuhan descobriu em Fevereiro, das quais merece relevante destaque o facto de o novo coronavírus ter uma taxa de contágio diferenciada em função da idade, propagando-se mais facilmente em faixas etárias mais avançadas, a demografia do nosso país impõe uma consciência coletiva para o perigo iminente e para a fronteira ténue que nos separa de uma verdadeira calamidade. Isto porque nesses dados recolhidos pela OMS, a taxa de mortalidade cresce concomitantemente com o aumento do escalão etário infetado!

Dos dados recolhidos até à data conclui-se que este vírus é transmitido de pessoa para pessoa, sobretudo através de gotículas respiratórias, contacto direto com secreções e aerossóis. Outro modo de transmissão é através do contacto com superfícies infetadas, sobretudo através das mãos, que posteriormente são levadas a uma porta de entrada, olhos, nariz e boca. Ora, se olharmos aos cuidados que são disponibilizados a uma grande franja dos nossos idosos, ao facto de termos de conciliar o isolamento social destes, com a continuidade, não do normal mas, como é óbvio, do mínimo basilar funcionamento das Unidades de Cuidados Continuados e Paliativos, às consequências que podem decorrer de uma anormal rotina familiar com o fecho das escolas e de um quase shut down do país, apela-se a uma consciência cívica coletiva necessária para lidar com toda esta situação.

E, por fim, quando a Ordem dos Médicos nos diz que 20% dos infetados por covid-19 são médicos, não podemos deixar de dar uma palavra de conforto e, ao mesmo tempo, de coragem e resignação, a todos os profissionais de saúde, os verdadeiros heróis neste momento de crise de saúde pública. O seu abnegado envolvimento no combate a esta pandemia mostra estarem justificadamente comprovadas muitas das reivindicações de todas as Ordens profissionais de saúde. Neste particular, não pode nem deve ser descurada a importante ação da Ordem dos Médicos Dentistas e de toda a classe profissional por ela representada ao suspender a sua atividade, porquanto há evidência científica de que os profissionais ligados à saúde oral estão mais exposta a este vírus e foi a prudência que levou o Governo a impor a suspensão da sua atividade regular, estando apenas estes profissionais disponíveis para tratamentos de caráter urgente.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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