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Venezuela: “Esta é a hora escura da minha terra”

Venezuela: “Esta é a hora escura da minha terra”

“O país desmorona-se, lentamente. Nas ruas, respira-se desespero, ódio, tristeza, terror. Reina o caos sobre a sobrevivência.&

“O país desmorona-se, lentamente. Nas ruas, respira-se desespero, ódio, tristeza, terror. Reina o caos sobre a sobrevivência.” O fotojornalista venezuelano Juan Pablo Bellandi dedica todos os trabalhos de fotografia documental à situação política e social do seu país — e Endless Countenances não é excepção. Desenvolvida durante o início da revolta popular contra Maduro, em 2016 e 2017, a série descreve os rostos de dor de quem vive aprisionado num país em decadência. “A situação é catastrófica”, diz ao P3, em entrevista via e-mail, a partir de Caracas. “A queda dos preços do petróleo e a má gestão económica (corrupção) deixaram marcas profundas no país. Há filas intermináveis à porta de supermercados quase vazios. Os produtos de primeira necessidade escasseiam e os preços estão inflaccionados, o que impede que a maioria das pessoas os consiga adquirir. As condições sanitárias do país são terríveis, a taxa de mortalidade é muitíssimo alta devido ao mau funcionamento dos hospitais. Há uma população inteira doente que não pode ser tratada.” Como “cereja no topo do bolo”, Bellandi refere o aparecimento, em grande força, do crime organizado “que converteu a Venezuela num dos países mais perigosos do mundo”.

Para o fotógrafo, nada descreve melhor o que se vive na Venezuela do que a expressão gravada no rosto dos venezuelanos, onde é visível “uma mescla de esperança, desespero e dor”. Endless Countenances, que pode ser traduzido por “Semblantes Infinitos”, pretende lembrar-nos que as possíveis leituras políticas ou de grande escala sobre a crise venezuelana mingam perante tal “esmagadora tragédia humana”. Num poema que partilha com o P3, Pablo descreve a situação: “Há mães que esperam os filhos assassinados às portas das morgues abarrotadas, debaixo do calor caribenho, e que vêem a sua dor reflectida no rosto de outras mães. Há crime comum e organizado, narco e freak, corrupto e poderoso. O som das motas militares, policiais, e de gangsters é conhecido de todos. Salta, esconde-te. Protesta ou lança pedras. O poder irá dispara sobre ti com uma Glock ou uma AK-47 de fabrico russo. Durante a noite, ouvem-se disparos à distância, como uma feliz melodia que adoça as nossas cidades. A bota negra e a boina vermelha contracenam no teatro do absurdo enquanto avança a fila da fome e da morte. A violência é o sistema. Esta é a hora escura da minha terra, a Venezuela.”

Juan Pablo nasceu em Mérida, na Venezuela, em 1990. Estudou fotografia em Buenos Aires, na Argentina, e foi um dos finalistas da Ian Parry Scholarship, do Leica Oskar Barnack Award e da Joop Swart Materclass.

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