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Tancos - Recolha de armas abre guerra entre MP e militares

Tancos - Recolha de armas abre guerra entre MP e militares

A Judiciária Militar não informou os procuradores titulares da investigação de que tinha encontrado o material de guerra furtado

O diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), do Ministério Público, convocou a Polícia Judiciária Militar (PJM) para uma reunião urgente ontem à tarde para esclarecer a recuperação, na madrugada desta quarta-feira, do material militar desaparecido da base de Tancos, em junho passado. Com exceção das munições de 9 mm, a PJM recuperou todo o material, entre o qual os lança-granadas e as granadas de mão ofensivas. O Ministério Público (MP), titular da investigação, não foi informado da diligência da PJM e quer garantias de que a investigação não ficou comprometida.

Na reunião estiveram presentes, além do diretor do DCIAP, Amadeu Guerra, e de um representante da PJM, os procuradores que têm coordenado a inquérito-crime e responsáveis da Unidade Nacional de Contraterrorismo (UNCT) da PJ, que o MP tinha chamado a coadjuvar a investigação e que também não foi informada pela PJM de que o material tinha sido encontrado.

Um comunicado divulgado pela PJM ao final da manhã de ontem adiantava que no âmbito de investigações de combate ao tráfico e comércio ilícito de material de guerra tinha recuperado, "com a colaboração do núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé, o material de guerra furtado dos Paióis Nacionais de Tancos". Informavam ainda que o material, intercetado na zona da Chamusca, já tinha sido levado para os Paióis de Santa Margarida, à guarda do Exército, onde está a ser realizada a peritagem para identificação mais detalhada.

Questionado sobre porque não tinha o MP sido informado, a PJM não respondeu ao DN, nem porque tinha sido chamada a GNR. Terá sido uma denúncia anónima para o número de piquete da PJM a dar a informação sobre a localização do material, facto que vai ser averiguado pelo MP.

O mal-estar é notório ao mais alto nível e algumas fontes policiais e do MP ouvidas pelo DN admitem que Amadeu Guerra pode fazer queixa à hierarquia das Forças Armadas por a PJM não ter cumprido o dever funcional de comunicar ao titular da investigação todos os factos e diligências no âmbito do inquérito em curso. Por outro lado, o MP quer também que se avalie até que ponto a PJM preservou, mantendo eventuais vestígios e provas, o local onde foi encontrado o material, bem como o próprio material. "É fundamental garantir que não houve intenção de esconder alguma coisa que não interessava aos militares que se soubesse", explica um procurador já reformado, que pediu anonimato e a ressalva de que não conhece o caso "ao detalhe". Acrescenta que "seria natural que, sendo a investigação do MP e da UNCT, [estes] tivessem sido chamados para acompanhar a recuperação do material e garantir que não se levantassem dúvidas sobre a intenção dos militares".

Foi por decisão da Procuradoria-Geral da República (PGR) que esta investigação foi atribuída à PJ, sendo retirada a coordenação da PJM, que ficaria obrigada a uma "total colaboração institucional". "Na sequência de análise aprofundada dos elementos recolhidos, o MP apurou que tais factos se integram numa realidade mais vasta. Estão em causa, entre outras, suspeitas da prática dos crimes de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo internacional", justificou, na altura, em comunicado oficial.

A investigação da UNCT avaliou todas as hipóteses, mas, nos últimos tempos, já se inclinava mais para a possibilidade de o material nunca ter chegado a sair do país e estar a ser vendido à peça, conforme o DN chegou a noticiar. De acordo com o Expresso, havia vários suspeitos sob vigilância e tinha pedido ajuda a Espanha para saber onde podia ter sido comprado um equipamento usado para arrombar os paióis, só à venda naquele país.

Militares refutam críticas

Fontes militares desvalorizaram as críticas, perguntando se a PJ costuma chamar ou avisar previamente o MP quando faz uma apreensão de droga.

Aquela não foi uma operação de busca, precisou ao DN uma dessas fontes ouvidas sob anonimato por não estarem autorizadas a falar sobre o caso, acrescentando - com uma nota de ironia - que os militares não queriam show off nem ver fotografias da cena do crime nos jornais. Por outro lado, desde o início do caso que o DN ouviu várias fontes da Defesa criticarem a forma como a PJ - ao contrário de casos anteriores - (não) estava a envolver a PJM nesta investigação.

Um dos exemplos dessa alegada falta de colaboração da PJ foi o de saber que telemóveis ficaram registados nas antenas existentes na zona, durante o período estimado para o furto - um dos vários pedidos feitos pela PJM à PJ e que ficaram por responder ou cuja resposta foi algo do género "não tem relevância", indicaram as fontes.

O facto é que, tendo recebido a denúncia ontem de madrugada, a PJM destacou investigadores que estavam na zona há semanas, com militares do Núcleo de Investigação da GNR de Loulé - no âmbito de um outro processo relacionado com comércio ilícito de armamento, explicaram as fontes militares.

De acordo com algumas das fontes, os investigadores estavam longe de imaginar que iam encontrar o material furtado dos paióis de Tancos. A expectativa era recolher "coisas do Ultramar", armas e ou granadas que tivessem ficado a descoberto após as fortes chuvadas ocorridas naquela região durante o dia de terça-feira.

Perante os caixotes encontrados, foram chamados os técnicos do Laboratório de Polícia Técnico-Científica da PJM e especialistas na desativação de explosivos do Exército, que fizeram o levantamento da cena do crime e as perícias necessárias antes de proceder à transferência do material para os paióis do Campo Militar de Santa Margarida.

Registe-se que, para os militares, o caso constitui um crime estritamente militar, cuja investigação "é da competência específica da PJM".

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