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A pensar nos Jogos Olímpicos com um pezinho de dança

A pensar nos Jogos Olímpicos com um pezinho de dança

O breaking é uma dança acrobática, executada por dançarinos conhecidos por b-boys e b-girls. É visto como uma representação artística e desportiva, que ganhou o estatuto de modalidade olímpica em Paris 2024. Portugal entrou no ritmo e os novos campeões nacionais são bastantes criativos e ambiciosos

Este estilo de dança urbana foi criado por afro-americanos e latinos nos bairros de Nova Iorque (EUA), nomeadamente no Bronx, na década de 1970, e acabou por pacificar as violentas disputas territoriais que existiam na altura entre bairros. Os jovens começaram por se afastar dos gangues e a violência de rua deu lugar a “batalhas” entre crews, grupos de dançarinos que utilizavam a sua energia de forma positiva e criavam movimentos espetaculares para serem os melhores. Tudo começou quando o DJ Kool Herc introduziu uma nova forma de misturar as músicas, o break, nas festas de rua que organizava nos bairros nova-iorquinos. Na prática, prolongava a parte instrumental ao mesmo tempo que introduzia sonoridades “arranhadas” criando novos ritmos, que ficaram conhecidos por hip-hop. As pessoas, muitas delas de comunidades marginalizadas pela sociedade americana, dançavam de uma maneira tão especial nos breaks das músicas que ganharam designações próprias como break-boys e break-girls, mais tarde passaram a chamar-se simplesmente b-boys e b-girls. 

Os breakers sempre dançaram vários géneros musicais: break beats, funk, rap e soul. É curioso verificar que as batidas de break são encontradas em todo o género de músicas e alguns breaks famosos vêm de faixas inesperadas, uma das quais é o break da opera rock Jesus Christ Superstar. Esta cultura espalhou-se por todo o mudo, com os principais b-boys e b-girls a aparecerem em videoclipes e filmes de Hollywood, como foi o caso de Flashdance (1983), Breakin the Movie (1984) e Beat Street (1984). Já antes, em 1969 James Brow tinha realizado alguns shows com os dançarinos Boogie Boys, os precursores dos atuais b-boys, e a primeira aparição televisiva do breaking foi com o grupo Los Angeles Lakers, na abertura do programa de música americana Soul Train.

Uma das características mais marcantes do breaking é a sua natureza competitiva, não admira que se tornasse uma modalidade desportiva na década de 1990, com dançarinos profissionais e centenas de eventos em todo o mundo. Desde 2004 que as competições ganharam uma nova dinâmica com o Red Bull BC One e as espetaculares batalhas individuais. Neste caso, o DJ escolhe a música e os atletas enfrentam-se na tentativa de criar uma espécie de coreografia, onde muitas vezes transmitem mensagens e contam histórias. A cada música, o concorrente tem 60 segundos para executar os seus movimentos. Pode parecer fácil, sobretudo para os especialistas da dança, mas é mais complicado do que parece. 

A arte de dançar

Nas competições, os atletas fazem movimentos e improvisam ao ritmo das músicas tocadas pelo DJ, e os elementos do júri atribuem notas a essas atuações tendo em conta a personalidade, técnica, variedade, criatividade, performance e musicalidade. Há oito movimentos que importa reter. Os power moves são os elementos mais dinâmicos do breaking. Um power move acontece quando se impulsiona o corpo numa rotação contínua, equilibrando-se nas mãos, cotovelos, cabeça, costas ou ombros. Um trick é quando se adiciona um toque pessoal a elementos básicos do breaking. As possibilidades são infinitas e o improviso bem feito sempre fica bem. Flip é quando um breaker pula e gira uma ou mais vezes enquanto está no ar. Esses movimentos acrobáticos e cambalhotas são utilizadas para deixar as suas apresentações mais dinâmicas. O Top Rock é uma sequência de passos feitos em pé, antes de iniciar os seus movimentos no chão, e não costuma ultrapassar oito tempos de uma música. É nestes movimentos de mãos e braços que o bailarino mostra toda a sua ginga e capacidade de entrar no ritmo da música. O Go Down é o movimento que o breaker usa para sair do Top rock e começar a dançar no solo. Essa transição deve ser feita sem que haja quebra no ritmo. Footwork é quando um breaker está no solo e coloca as mãos no chão para dar suporte ao corpo enquanto move os pés e as pernas em movimentos rítmicos de rotação circular, em linhas retas ou diagonais. Um freeze é quando o b-boy ou b-girl mantém uma determinada posição por alguns segundos. É geralmente feito para marcar algum momento mais dramático da música ou para finalizar uma sequência de movimentos. Transition é qualquer movimento que utilizem para finalizar passos ou combinar footworks, freezes, tricks e/ou power moves. O segredo é executar cada um destes movimentos com perfeição e combiná-los com originalidade sempre dentro do ritmo.

Dançar no Rio

A final nacional Red Bull BC One teve 16 b-boys e 8 b-girls e constituiu um grande espetáculo de dança e som. O b-boy Deeogo e a b-girl Vanessa sagraram-se campeões nacionais e garantiram a presença na final mundial, no Rio de Janeiro, a 7 de dezembro, onde irão enfrentar grandes nomes do breaking internacional.  

A b-girl Vanessa, de 31 anos, é uma referência do breaking nacional. É uma paixão antiga. Frequentou a Escola Superior de Dança, em Lisboa, e com o curso superior concluído foi para Londres, em 2014, na esperança de entrar numa companhia. Rapidamente começou a entrar em competições e a ganhar fama nas battles. Foi campeã britânica, há dois anos conquistou a medalha de bronze do Europeu e, no passado fim de semana, venceu a final nacional da mais importante competição planetária. Faz parte de uma geração de breakers, que também se veem como atletas, e os excelentes resultados são fruto de uma grande dedicação e preparação física e mental. «Quando comecei no breaking, apercebi-me que sou muito competitiva. Na altura, não tinha essa noção, mas sou motivada pelo medo de ser apenas mediana, quero ser a melhor. Cada vez que vou para as battles, penso que há outras b-girls que estão a treinar mais do que eu porque querem ser as melhores. Se eu quero ser a melhor, então tenho de ir treinar também. Esta é a minha principal motivação», disse.

A breaker é uma das 40 b-girls que estarão nos dois torneios de qualificação para os Jogos Olímpicos Paris 2024. «Vencer a final nacional aqui foi essencial para a minha motivação e confiança, pois estou num processo de recuperação de uma lesão que me condicionou um pouco a performance. Agora sei que estou no caminho da recuperação para dar o meu melhor nos próximos desafios. Primeiro na qualificação para Paris e mais tarde na final mundial do Rio de Janeiro. Vou ao Brasil a pensar na vitória», afirmou convicta a tetracampeã nacional de breaking. Em relação às olimpíadas, fez questão de salientar que «o breaking vai ter uma plataforma para se mostrar e vai ser importante principalmente para as meninas». Vanessa explicou que «o processo de apuramento é muito mais doloroso a nível mental. Nós estamos sempre habituados a treinar o físico e esquecemo-nos da parte mental», salientou a pioneira do breaking português. «Vou tentar ao máximo ter um bom resultado nesses torneios», explicou a b-girl. «Não gosto de pensar muito além, porque cada vez que olhamos para cima, tropeçamos num degrau e a queda é mais forte. Neste momento estou em 11.º e acho que é um bom resultado a nível mundial. É quase um feito histórico» reforçou, lembrando que, aos poucos, as mulheres conseguiram afirmar-se num mundo essencialmente masculino, porque “os meninos” perceberam que estas não iam «tirar nada a ninguém, só adicionar». 

Na competição masculina, o b-boy Deeogo é o novo campeão nacional. «Este título representa muito para mim porque nos últimos meses tive uma lesão grave. Foi incrível batalhar neste ambiente e poder ser ator e testemunha da grande evolução que a modalidade tem registado. Agora quero um lugar no top 16 no Rio», disse com otimismo.

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