João Paulo Correia - 4 set. 07:00
O interesse público da Comissão de Inquérito
O interesse público da Comissão de Inquérito
Em nome do interesse público, há que apurar se alguma entidade privada beneficiou direta ou indiretamente com o tratamento das crianças no SNS
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) – “Gémeas Tratadas com o Medicamento Zolgensma" é uma criação potestativa do CH, que recorreu a esta prerrogativa regimental para contornar a previsível derrota de uma votação plenária. O PS anunciou que votaria contra.
Uma vez constituída, os partidos têm de participar na CPI e cabe aos Deputados que os representam a procura de verdade no absoluto respeito pelos direitos constitucionais.
Desde a primeira hora que o CH caiu na perigosa tentação de se apropriar do Inquérito Parlamentar, procurando instrumentalizar a CPI para outros fins da sua agenda política. Ao fazê-lo sucessivamente, corre o sério risco de submeter a CPI a uma espécie de "filicídio". A CPI é da Assembleia da República. Não é propriedade do partido requerente.
O CH impôs a primeira audição a António Lacerda Sales porque estávamos em plena campanha das Europeias e fê-lo sabendo que ainda não tinha sido possível aos Deputados analisar a documentação enviada à CPI. Propôs a audição do Presidente da República (PR) antes da consulta da documentação enviada pela Casa Civil. Propôs a audição de António Costa na semana em que se iniciou o processo para Presidente do Conselho Europeu e quando nada nem ninguém o implica neste caso. Insistiu na audição de Francisco André (ex-Chefe de Gabinete do Primeiro-Ministro), que veio a confirmar-se inútil. Por fim, vem agora propor as audições de ex-membros de gabinete do anterior governo, sujeitando essas audições ao mesmo impacto público de inutilidade.
O que sabemos até agora?
A mãe das crianças fez o que qualquer mãe faria para proteger e salvar os seus filhos. O processo de atribuição da nacionalidade decorreu dentro da legalidade e da normalidade dos prazos. As crianças tinham direito ao SNS e nada veio demonstrar que passaram à frente de outras. Até hoje, 36 crianças foram tratadas com o Zolgensma.
Foi Juliana Vilela Drumond, agente de seguros da MDS Brasil, quem informou em várias ocasiões o companheiro Nuno Rebelo de Sousa (NRS) sobre o processo das crianças. Com essa informação, NRS moveu "mundos e fundos" a favor do processo. A MDS é das principais parceiras da seguradora brasileira AMIL, bem como das empresas mais destacadas da Câmara Portuguesa de Comércio de S. Paulo, liderada na altura por NRS.
Os seguros de saúde das crianças foram contratados à AMIL, que em 2019 e 2020 acumulou prejuízos. À época, a AMIL detinha o Lusíadas Saúde. As primeiras consultas das crianças em Portugal foram marcadas no Hospital Lusíadas Lisboa com a médica Teresa Moreno. Estranhamente, foram desmarcadas, pois seriam bastante para referenciar o tratamento das crianças no SNS. Nesses mesmos dias, as consultas foram marcadas no Hospital Santa Maria com a médica Teresa Moreno (!).
Os processos judiciais movidos na justiça brasileira contra a AMIL dão conta dos pagamentos milionários a que esta ficou obrigada no tratamento das crianças através do medicamento Spinraza. Aparentemente, o tratamento das crianças em Portugal desobrigou a AMIL perante a justiça brasileira, o que levará a CPI a indagar se esta circunstância permitiu à seguradora encaixar uma poupança considerável pelo facto de ficar desobrigada no tratamento das crianças.
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