expresso.ptexpresso.pt - 21 nov. 15:16

Pedro Norton de Matos: “O planeta está doente, mas tenho uma grande esperança nas gerações mais novas. A minha geração dificilmente muda”

Pedro Norton de Matos: “O planeta está doente, mas tenho uma grande esperança nas gerações mais novas. A minha geração dificilmente muda”

Quando criou o GreenFest e o BlueFest, estes festivais verdes eram vistos como uma espécie de 'eventos de hippies'. Hoje são um movimento. Pedro Norton de Matos acredita que serão as novas gerações a travar a batalha da sustentabilidade. A solução passa pelo triângulo 'regulamentação, consumidores e empresas'. Se os nossos avós praticavam economia circular, com desperdício quase zero, então é possível. Basta redesenhar os produtos, mas Norton de Matos teme que só se acorde quando tivermos as barbas a arder: “o planeta não tem lado de fora”, alerta. Oiça aqui o episódio completo

Pedro Norton de Matos é o convidado desta semana do podcast Ser ou não ser. Há 15 anos, quando criou o conceito dos festivais verdes, sabia que eram vistos como “uma espécie de eventos de hippies, de utópicos ou mesmo de lunáticos”. E, apesar de ainda haver um longo caminho a fazer, a verdade é que numa década muita coisa mudou. Por exemplo, “o lixo passou a resíduo e hoje é visto como um recurso, entrando na esfera da economia circular”. Para o gestor já não há retorno. O cerco está a apertar.

Algumas empresas ainda utilizam as métricas em que melhor ficam na fotografia para comunicarem ao mercado as suas políticas de sustentabilidade, mas com as novas regras de reporte impostas pela Comissão Europeia, que entram em vigor já em 2024, isto tem tendência a abrandar. “Haverá um referencial único, então vão-se comparar maçãs com maçãs. Desta perspectiva, o ‘greenwashing’ vai sendo cada vez menor. Se acaba de um dia para o outro? Não! Mas o crime não compensará”. As sanções e as penalizações financeiras funcionarão como uma espécie de polícia que colocará um travão. Além disso, a reputação das marcas e a valorização para o accionista pesará na balança, antes de as empresas pensarem em divulgar algo para o mercado que não seja verdade.

TOMAS ALMEIDA

Otimista por natureza, fala dos negacionistas em relação, por exemplo, ao aquecimento climático, utilizando a metáfora do copo meio-cheio e do copo vazio. Ou seja, o otimista vê o copo cheio. O pessimista vê o copo vazio. Depois, vem o oportunista e bebe-o. “Estamos perante a situação em que os oportunistas podem beber o elixir da esperança de um futuro. Não sou favorável a radicalismos!”. E explica: em termos climáticos, o Acordo de Paris, que estabeleceu o objetivo de cortar 55% das emissões dos gases com efeito de estufa até 2030, tentando que a temperatura não subisse mais do que um grau e meio, já não será superado. São dados concretos. Não há como negar.

O gestor recorre ainda à comparação do efeito da febre no corpo humano. “Se tivermos 38,5 graus de febre, como nos sentimos? E, se aumentarmos mais um grau e meio?”. A nossa temperatura de conforto dará lugar a um estado físico em que se fica fora de combate. E, se a temperatura continuar a aumentar? “É isto que está a acontecer ao planeta. O planeta está doente”, afirma Pedro Norton de Matos. Os negacionistas, avança, argumentam que sempre existiram e vão continuar a existir alterações climáticas: “É verdade que as alterações climáticas sempre existiram, mas nunca houve uma aceleração igual à que assistimos desde a década de 50”.

Se pegarmos nos indicadores socioeconómicos, verificamos que o PIB aumentou, a população cresceu, o saneamento básico foi implementado, a educação melhorou, mas à custa de quê? Qual é a fatura a pagar? “A partir da década de 50, assistiu-se a um aceleramento dos gases efeitos de estufa, acidificação dos oceanos e dos solos, perda de biodiversidade e extinção de espécies. Há uma relação causa – efeito claríssimo”. E afirma: “Sinto com muita mágoa que ao fim de 15 anos muitos dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estejam longe de ser atingidos. É frustrante. O mesmo acontece com os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio. Portanto, as barbas estão a arder”.

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A solução? Está num simples triângulo. “Num dos vértices está a legislação, no outro vértice, os consumidores e, por fim, as empresas”. O gestor diz também que o órgão mais sensível do nosso corpo é o bolso. “Numa filosofia materialista, tudo o que se possa colocar ou tirar do bolso, nós sentimos”. Aplicado à sustentabilidade há provas evidentes. “O saco de plástico quando começou a ser taxado levou a mudança de comportamentos. Não pelo valor, mas porque ia ao bolso do consumidor”.

O gestor do GreenFest e do BlueFest ressalta ainda o facto dos nossos avós praticarem economia circular. “Era desperdício quase zero”, por isso, no seu entender “não é utopia pensar no desperdício zero e na economia circular”. Hoje temos mais conhecimento e mais tecnologia. Temos obrigação de o fazer. E brinca: “se um gato tem sete vidas, porque é que um produto não pode ter, pelo menos, tantas vidas como um gato?”. O importante é mudar o paradigma. “É preciso repensar o desenho dos produtos. É necessária uma revolução de mentalidades porque viciámos num determinado modelo e estamos a pisar linhas vermelhas com efeitos irreversíveis”.

Acredita, no entanto, que serão as novas gerações a ter um papel decisivo. “Vejo o mundo pelos olhos das minhas netas. Tenho grande esperança nas gerações mais novas. Pela educação, formação, investigação e desenvolvimento. A minha geração dificilmente muda”. É uma esperança que renova a cada dia quando cuida do seu jardim. “Quem cuida de um jardim tem esperança no futuro. Quando está a semear acredita que a semente vai germinar, quando está a transplantar, acredita que o transplante será bem-sucedido, quando está a podar, vislumbra a nova forma em termos técnicos e funcionais, logo o objetivo será cumprido. Portanto, o jardineiro acredita no futuro”.

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'Ser ou não ser' é um podcast semanal sobre o mundo da sustentabilidade, da ecologia e da responsabilidade. A cada episódio, mergulhamos em tópicos relevantes, desde práticas individuais até iniciativas globais, com convidados apaixonados por este tema. Damos voz a líderes de empresas, ativistas, empreendedores e especialistas, para partilharem experiências e soluções inovadoras para um futuro mais sustentável. 'Ser ou Não Ser' é um podcast do Expresso SER, com moderação da jornalista Teresa Cotrim e o convidado residente Frederico Fezas Vital, professor e consultor na área da inovação social, impacto e empreendedorismo. A coordenação está a cargo de Pedro Sousa Carvalho.

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