dinheirovivo.pt - 21 nov. 07:00
Microsoft 10 - OpenAI 0
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Satya Nadella é bem capaz de vir a ser lembrado como o melhor e mais influente CEO da Microsoft de sempre depois do fundador Bill Gates. Numa sucessão de absurdos que deixaram todos na indústria de Inteligência Artificial de queixo caído, o conselho de administração da OpenAI demitiu o líder Sam Altman, depois tentou recuperá-lo e a seguir voltou a fechar-lhe a porta. Nadella demorou exactamente zero segundos a tomar a única decisão que fazia sentido para a Microsoft perante o sucedido - contratou o executivo por detrás do ChatGPT na hora e pô-lo à frente de uma novíssima unidade de IA na tecnológica.
O que se passou nos últimos dias não foi menos que bizarro. O conselho de administração da OpenAI tomou a decisão surpreendente de demitir Sam Altman por considerar que a OpenAI, fundada sem fins lucrativos, estava a ser desvirtuada. Dado o sucesso estrondoso do ChatGPT desde que foi lançado, há precisamente um ano, mandar o responsável por isso embora de forma brusca pareceu inusitado, até um pouco suspeito.
No surpreendente comunicado inicial, o conselho disse que a saída de Altman se deveu ao facto de este "não ter sido cândido" nas suas comunicações com os directores, o que está a ser entendido como uma acusação de que o ex-CEO lhes mentiu.
Em causa estarão preocupações com o crescimento acelerado da OpenAI e a aparente divergência entre essa aceleração e a missão inicial, que é garantir o uso da IA em benefício de toda a humanidade. O ChatGPT e sucessores não estão necessariamente a ir nessa direcção.
Mas a OpenAI, fundada em 2015, não escolheu propriamente um filantropo para a liderar. Sam Altman era o presidente da YCombinator, talvez a aceleradora de startups mais conhecida do mundo, com um modelo de financiamento e de retorno de alto ritmo. Foi esse o espírito que levou para a OpenAI quando se sentou na cadeira de CEO, em 2019.
Pior, depois de o demitir e nomear como CEO interina Mira Murati, a OpenAI anunciou que o próximo CEO seria Emmett Shear, co-fundador do Twitch, mas ontem de manhã um dos instigadores da saída de Altman mudou de ideias. Juntou-se a uma carta aberta que centenas de empregados da empresa escreveram a pedir ao conselho de administração que reconsiderasse. Sam Altman tinha mesmo passado o Domingo na sede da empresa, e julgou-se que estava em curso um abandono do golpe da liderança.
Isso não aconteceu, e em poucas horas a Microsoft chegou num cavalo branco e levou não apenas Altman mas também o presidente da OpenAI, Greg Brockman.
É uma séria vitória para a casa-mãe do Windows, que investiu 10 mil milhões de dólares na empresa (sendo a sua maior accionista) e integrou parte da tecnologia em vários produtos, como o motor de busca Bing. Altman e Brockman estão na linha da frente da Inteligência Artificial Generativa, que ameaça mudar o trabalho, a educação e a (des)informação tal como os conhecemos. A Microsoft, que beneficiou bastante da sua ligação e investimento na OpenAI, posiciona-se assim claramente na liderança deste caminho.
Do outro lado, a OpenAI fica a apanhar os cacos deste processo, como se tivesse acordado na quinta temporada de "Succession". Foi tudo mal feito. Primeiro, deixando que o ChatGPT fosse lançado sem salvaguardas nem transparência e queimasse que nem fogo em mato seco. Depois, decidindo num rompante dar um pontapé no CEO e duvidar da decisão logo a seguir, abrindo um vazio de liderança e provocando o caos entre os funcionários.
E por fim, parecendo querer voltar a enfiar o génio na lâmpada depois de soltar. Não há um consultor de comunicação nos quadros desta empresa? Não temos uma mente sã a explicar que esta balbúrdia pública é uma centrifugadora de talento?
Triste é perceber que, por detrás do caos, o conselho de administração está coberto de razão. Sam Altman passou os últimos meses a pressionar para acelerar o lançamento de produtos, enquanto vários membros do conselho queriam abrandar e privilegiar uma abordagem cautelosa. Algo que permitisse garantir o respeito pela missão original. A IA é uma tecnologia demasiado poderosa para seguirmos com o mote de "mover rápido e partir coisas." Estamos fartos de ver os efeitos nefastos da aplicação de princípios clássicos de mercado a produtos que mudam o tecido da sociedade.
A urgência do conselho de administração da OpenAI veio tarde e maltrapilha. Talvez ainda seja possível salvar a missão, mas o génio está, de facto, fora da lâmpada. E a Microsoft, que foi de todas a tecnológicas a mais perspicaz desde o início, limpou este jogo (literalmente) dez a zero.