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Exame | Sam Altman e a demissão da OpenAI: Quão longe é longe demais?

Exame | Sam Altman e a demissão da OpenAI: Quão longe é longe demais?

Imaginemos que Bill Gates, fundador da Microsoft, era demitido em 1995 – logo após o lançamento de um produto revolucionário como o Windows 95. Foi mais ou menos isso que aconteceu durante este fim-de-semana, quando a administração da OpenAI, empresa de inteligência artificial (IA), decidiu despedir – para surpresa de todos – o “menino de […]

Imaginemos que Bill Gates, fundador da Microsoft, era demitido em 1995 – logo após o lançamento de um produto revolucionário como o Windows 95. Foi mais ou menos isso que aconteceu durante este fim-de-semana, quando a administração da OpenAI, empresa de inteligência artificial (IA), decidiu despedir – para surpresa de todos – o “menino de ouro” Sam Altman.

Comparado muitas vezes com o próprio Bill Gates, Altman fundou a empresa que no ano passado lançou o ChatGPT, um “chat” criado com IA que ameaçava, por exemplo, destronar motores de busca como o Google. A demissão foi decidida pela administração da empresa. A Microsoft não foi consultada, mesmo tendo injetado cerca de 13 mil milhões de dólares (11,88 mil milhões de euros) na empresa – sendo o maior investidor.

E se o guião se confundir com o de uma novela, atente neste desfecho: a OpenAI contratou um presidente substituto (Emmett Shear, ex-líder do Twitch foi o escolhido) e, esta segunda-feira, a Microsoft contratou o próprio Sam Altman para liderar uma nova equipa de investigação em IA, evitando o risco de o perder para alguma empresa rival.

“Se a Microsoft perdesse Altman, ele podia ter ido para a Amazon, a Google, a Apple ou para uma série de outras empresas de tecnologia que queriam ter o rosto da IA”, começa por explicar Dan Ives, analista de tecnologia da WedBush, à EXAME, acrescentando que “agora que está a liderar a equipa de IA da Microsoft, esperamos que muitos cientistas e programadores da OpenAI se juntem a ele”.

Os bastidores da demissão e a tarde de 6 de novembro

No comunicado que anunciava a demissão de Sam Altman, a administração da OpenAI argumentou que o jovem “não foi consistentemente sincero nas suas comunicações com a administração, prejudicando a sua capacidade de exercer as suas responsabilidades”.

A administração da empresa é constituída por cinco membros. Quatro deles votaram a favor da demissão. Ilya Sutskever, o único co-fundador que ainda se mantém na administração, Adam D’Angelo, Tasha McCauley e Helen Toner. O único a votar contra foi Greg Borckman, co-fundador, que saiu em protesto e se juntou a Altman na equipa da Microsoft.

Mas afinal, o que levou a este desfecho?

“A decisão esteve relacionada, em primeiro lugar, com os receios em torno da eficiência da sua liderança. Os problemas relacionados com a falta de transparência levaram a uma grande perda de confiança na administração”, começa por explicar à EXAME, Wilson Chan, CEO da Permutable AI, empresa de IA britânica.

Ken Sterling, professor e advogado especialista em tecnologia, acrescenta que “havia ainda vários relatos de que o Sam tinha outros projetos em desenvolvimento e que poderiam ser possíveis concorrentes da OpenAI”.

Neste campo entra, entre outras coisas, o projeto de cripto Worldcoin, lançado em julho deste ano, o projeto de semicondutores com base em inteligência artificial (ver capítulo sobre investimento do Médio Oriente) e uma nova empresa de “harware” com base em IA, em parceria com o Jony Ive – antigo “guru” do deign da Apple.

Apesar do apoio dos investidores e dos clientes, a maioria da administração estava muito cética com o progresso que a OpenAI estava a ter nas mãos de Sam Altman. Brockman apoiava as ideias de Altman. O resto da direção, não. “A aceleração da empresa estava a ultrapassar a zona de conforto da direção, que levantava questões sobre o uso responsável da IA”, continua Wilson Chan.

O confronto era tão intenso que levou Altman a suspender, nos últimos dias, a versão paga do ChatGPT (20 dólares/mês), que permitia o acesso a um modelo de linguagem mais avançado (o GPT-4) – uma versão melhorada no treino da IA.  

Ilya Sutskever tem sido uma das vozes mais sonantes no que toca às preocupações lançadas sobre os perigos da IA. A sua relação com Sam Altman piorou desde outubro, quando o agora membro da Microsoft tentou diminuir a influência de Sutskever na administração, de acordo com a Bloomberg.  E no evento de 6 de novembro, data da conferência da empresa, foi quando o barco começou a afundar.

A plateia ansiava por este momento. Sam Altman sobe a palco na primeira grande conferência da empresa. O entusiasmo era geral e aumentou de tom quando o rosto da OpenAI anunciava uma empolgante novidade: a empresa atingia o patamar dos 2 milhões de clientes, onde se incluíam 92% das 500 maiores empresas do mundo para a Fortune. Mas se a plateia aplaudia cada anúncio de Altman, Sutskever e companhia acompanhavam com preocupação. Tudo porque Altman fez uma série de divulgações que iam contra a política resguardada da empresa, como novas versões do ChatGPT – que permitem a cada utilizador moldar este recurso à sua maneira, fazendo soar os alarmes da segurança proclamada pela administração.

Na verdade, um ponto que separava Altman dos restantes era bastante simbólico: a OpenAI nasceu como um projeto de investigação e a administração era ainda controlada por cientistas e engenheiros “puros”, incomodados com o caminho mais comercial que Altman vinha a trilhar.

Uma vitória para a Microsoft?

Os especialistas ouvidos pela EXAME são unânimes. O desenrolar de todos os acontecimentos resultaram numa vitória para a Microsoft, que assim agarra o nome mais sonante da inteligência artificial no mundo. E a reação em bolsa (subida de mais de 2%, indica otimismo por parte do mercado)

“Parece que a Microsoft ganhou”, começa por dizer Thi Thumasathit, presidente da Gleen, empresa de “chatbots” criados com IA para empresas. “A Microsoft vai continuar a contratar outros membros da OpenAI (…) e eventualmente comprar na totalidade a empresa”.

Após a sua demissão, uma grande maioria dos trabalhadores questionou a competência da administração, numa carta assinada por 650 dos 770 empregados da OpenAI, em que exigiam o regresso de Sam Altman. Um dos signatários era o próprio Ilya Sutskever, que lamentou a crise na empresa, através do X (ex-Twitter).

I deeply regret my participation in the board's actions. I never intended to harm OpenAI. I love everything we've built together and I will do everything I can to reunite the company.

— Ilya Sutskever (@ilyasut) November 20, 2023

Já Jeff Schumann, presidente da Aware HQ, empresa que também fornece serviços de inteligência artificial a empresas, considera que “a integração de Sam Altman e de parte da equipa da OpenAI na Microsoft marca uma alteração significativa na indústria da inteligência artificial. E não é apenas uma contratação simbólica; é central para o sucesso da empresa num setor feroz e competitivo”.

“Em resumo, parece que a administração da OpenAI estava a jogar na mesa de poker das crianças e pensavam que tinham ganho”, avança Dan Ives, até que Satya Nadella, líder da Microsoft, tomou conta da ocorrência e virou o jogo, conclui.

Os investidores do Médio Oriente

Quando nasceu, em 2015, a OpenAI foi desenhada para ser uma entidade sem fins lucrativos, por uma equipa que incluía Sam Altman e ainda Elon Musk – dono da Tesla, do X e da SpaceX – saiu em 2018, depois de uma tentativa falhada de assumir a empresa.

Todo o financiamento que foram obtendo foi para “desenvolver a inteligência artificial de modo a beneficiar a humanidade como um todo”. Mas Altman quis pô-la a dar dinheiro, porque acredita ser essencial para a desenvolver. E, para esse destino lucrativo, criou uma subsidiária com um princípio chave. Este braço da OpenAI ia captar financiamento, mas caso os lucros superassem em 100 vezes esse financiamento, o dinheiro remanescente ia ser doado. Ora, para gerar receitas, Altman achava necessário democratizar as suas funcionalidades (como demonstram os anúncios feitos por Altman no evento, a 6 de novembro). Outro choque com a visão da maioria da administração.

Nas semanas que antecederam a demissão de Altman, um novo capítulo de cisão entre ambas as partes e que envolve, novamente, dinheiro. Altman foi bater à porta dos maiores fundos do Médio Oriente, à procura de novos financiadores para um novo projeto: uma empresa de semicondutores com base em inteligência artificial, capaz de rivalizar com a Nvidia, líder do mercado. A Bloomberg avança que houve reuniões com o Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita e com o fundo privado Mubadala Investment, com base nos Emirados Árabes Unidos.

Os esforços de Altman para captar novo financiamento surgem numa altura fulcral para a empresa. A OpenAI está a finalizar uma operação que irá permitir a todos os funcionários venderem as suas ações (num regime de opções, como parte do seu vencimento), numa operação que avalia a empresa em 86 mil milhões de dólares (78 mil milhões de euros).

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