Carlos Pinto - 24 nov. 08:45
A viagem e a revisão constitucional
A viagem e a revisão constitucional
Com esta Constituição da República, quanto à economia, ao social, ao território e ao parlamento, estaremos daqui a vinte anos como estamos hoje.
1. Quando se discute a viagem do Presidente da República a um país estrangeiro para assistir a um jogo de futebol, com a intensidade que acontece em Portugal, parece fácil concluir que a noção de Estado vagueia entre o domínio do reality show e a Feira do Relógio.
É normal que um cidadão eleito para o mais alto cargo institucional, goste de futebol.
E também é normal que lhe apeteça ver um jogo no Catar, nas Bermudas, no Estádio da Tapadinha ou em Marvila.
O que não é normal é que uma decisão do Parlamento sobre uma viagem para ver a bola, assente arraiais como se se tratasse de um assunto crucial para os portugueses.
Ora, por causa de um preceito constitucional que obriga a autorizar a viagem, poucas vezes se revelou a vacuidade de um Parlamento de génese representativa tão obsoleta, como neste caso.
A síntese é fácil de elaborar …
O Parlamento representa cada vez mais e substantivamente os partidos e não os cidadãos; como o Presidente da República representa os cidadãos que o elegeram, enquanto o Estado não se dá ao respeito com estas minudências; entretanto a comunicação social tem filtros de porosidade alargada cabendo tudo o que é popular e controverso, o país discute uma viagem que, no final, será mais um evento, inócuo, improdutivo e indiferenciado…
Reuniões de comissões parlamentares transmitidas em direto para o país, conferências de imprensa depois estendidas aos estúdios de tv, um alarido de coisa importante para o entretenimento.
Enquanto isto os gravíssimos problemas que atravessamos desmerecem da atenção das Instituições que, sobre eles, os problemas, apenas sobrevoa a superficialidade do seu enunciado.
No Portugal de hoje, a degradação não é apenas do SNS, quanto à saúde dos portugueses.
É também da (ir)responsabilidade dos eleitos quanto à saúde da democracia.
2. A Revisão Constitucional
Ao abrir-se um período de revisão constitucional, esperar-se-ia que os partidos olhassem a oportunidade para impulsionar as mudanças necessárias, onde a Constituição, por ação ou omissão, é obstáculo ao desenvolvimento do país.
O texto originário de 1976, sendo demasiado programático e apesar das revisões efetuadas, tem setores onde a utopia campeia e, outros, onde a desatualização face à nova realidade nacional e internacional, é evidente.
Oxalá, tenhamos razões para celebrar o engano.
Covilhã, novembro de 2022