dn.pt - 23 set. 23:45
Administrações dos principais hospitais do país à espera do que decide o novo CEO do SNS
Administrações dos principais hospitais do país à espera do que decide o novo CEO do SNS
Os presidentes dos centros hospitalares universitários Lisboa Norte e Lisboa Central já terminaram os seus mandatos, os de Coimbra e do Algarve acabam no final do ano. E o próprio Fernando Araújo irá encerrar funções no do São João. Até agora, não se sabe se o ministério vai resolver já esta questão ou se esperará pelo início das funções executivas da direção executiva do SNS, mas no meio hospitalar há já quem diga que as decisões deveriam ser tomadas já.
O decreto-lei que regula o novo Estatuto do SNS já o estipulava, mas esta sexta-feira o ministro Manuel Pizarro deixou bem claro. "O diretor executivo terá toda a autonomia para nomear todos os cargos de gestão que considerar adequada", afirmou durante a conferência de Imprensa em que confirmou Fernando Araújo como presidente da direção executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Neste sentido, há, pelo menos, duas administrações dos principais hospitais do país que poderão ver já a sua situação resolvida a partir de outubro, se a equipa ministerial entender que esta não se deve prolongar por mais tempo, pois os mandatos já terminaram em fevereiro e maio deste ano. Se não for assim, estas e outras administrações terão de aguardar por janeiro de 2023, até que a direção executiva do SNS entre oficialmente em funções.
Neste momento, e segundo apurou o DN, as duas situações que aguardam há mais tempo por a renomeação ou saída são as dos conselhos de administração dos centros hospitalares universitários Lisboa Norte - que inclui Santa Maria e Pulido Valente, cujo presidente, Daniel Ferro, iniciou mandato em maio de 2019 com término neste ano - e Lisboa Central - que tem seis polos (São José, Santa Marta, Curry Cabral, Capuchos, Maternidade Alfredo da Costa e o pediátrico D. Estefânia), em que a presidente, Rosa Matos, que foi igualmente secretária de Estado no mesmo período que Fernando Araújo, no tempo do ministro Adalberto Fernandes, iniciou mandato em fevereiro de 2019 e que o terminou ao fim de três anos.
Mas há ainda para resolver a administração do Centro Hospitalar Universitário São João, no Porto, dirigido até agora por Fernando Araújo, e cuja equipa terá de ser reajustada com a sua saída. Depois, há as administrações que assumiram funções em plena pandemia, como a do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, presidida por Carlos Santos desde junho de 2020, e do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, liderada por Ana Varge Gomes também na mesma altura, e que vão terminar funções neste ano civil, final de dezembro.
A questão aqui é mesmo se a nova equipa do ministério considerará a liderança das unidades como uma prioridade imediata ou não, podendo deixar a decisão para o novo dirigente do SNS.
A verdade é que no setor da Saúde a expectativa em relação a esta equipa é grande. Não só em relação "à forma como vai funcionar e estabelecer pontes entre as várias regiões do país", mas também em relação "à escolha de possíveis novos dirigentes", como referiram algumas fontes ao DN. Há mesmo quem sustente que "o melhor era clarificar já tudo", até para não se criar "um vazio de poder" ou um "ambiente que não seja motivador ao funcionamento das unidades". O DN contactou o Ministério da Saúde sobre esta questão, mas até à hora do fecho da edição não obteve resposta.
O médico que gosta de gestãoFernando Araújo, de 66 anos, é licenciado e doutorado em Medicina pela Faculdade do Porto e especialista em imuno-hemoterapia, e assume ser um médico que gosta gestão. Fez mesmo uma pós-graduação na área na Universidade Católica do Porto, por considerar que esta é cada vez mais uma característica fundamental para a medicina. Tem como marca os elogios aos profissionais do SNS , mas também críticas às lideranças (considerando que é mesmo uma das fragilidades do SNS), à demasiada politização dos cargos públicos e à centralização da gestão da saúde em Lisboa. Por isto mesmo, terá proposto a sede da nova direção no Porto, o que já o conseguiu.
Fragilidade das liderançasNuma entrevista ao DN, precisamente há um ano, e depois de ter sido distinguido com o Prémio Kaizen, pelos serviços prestados pelo seu hospital durante a pandemia, Fernando Araújo reconheceu que "o país está bem servido de profissionais médicos, de enfermagem e de outros técnicos ligados à saúde, que têm demonstrado ao longo dos anos uma enorme competência e capacidade para exercerem a sua atividade", mas "do ponto de vista da gestão temos uma falha". "Penso que não temos apostado na formação pré ou pós-graduada nesta área. Um médico, um enfermeiro ou um farmacêutico podem ser muito bons tecnicamente, mas isso não quer dizer, e ao contrário do que se pensava no passado, que sejam bons gestores", argumentou.
E até deu exemplos: "Portugal tem excelentes cirurgiões, do melhor que há no mundo, mas não é por serem excelentes profissionais tecnicamente que são bons diretores de serviço ou que tenham capacidade para o gerir ao mesmo nível. Há outro tipo de competências que são necessárias para a gestão, como o ter conhecimentos na área, experiência e até motivação. Portanto, quando se faz a escolha para as lideranças temos de ter muita atenção a várias vertentes, como gestão de recursos humanos e impacto económico das decisões, e nem sempre as pessoas as têm. (...) Mas voltando à pergunta acho que temos excelentes técnicos, mas temos um défice transversal de gestão e de lideranças na Saúde".
Politização e autonomiaMas não só. Na mesma entrevista, Fernando Araújo admitia o que considerava serem questões fundamentais no funcionamento do SNS: "Uma é, de facto, a demasiada politização dos cargos públicos, o que não ajuda à profissionalização do sistema de saúde", e outra "é a da autonomia na Saúde" criticando o facto de o SNS estar tão dependente das decisões das Finanças. Aliás, nesta conversa já sustentava que "voltar à gestão de 2019 não é uma solução para a Saúde, isso significa que não aprendemos nada com a pandemia. Vale a pena aprender e tentar mudar algo em relação ao passado".
Planeamento é uma apostaO novo CEO do SNS destacou ainda, na altura, que "a aposta nos recursos humanos na saúde é fundamental, até porque isso tem impacto na sociedade e na economia. A pandemia mostrou que precisamos de um sistema de saúde forte para que a sociedade e a economia também o sejam. E, para isso, o sistema precisa de recursos humanos em quantidade e com qualidade, mas um reforço adequado às necessidades e não excessivo, para que possamos responder às questões que nos colocam".
Como sublinhou o ministro Manuel Pizarro, esta sexta-feira, Fernando Araújo é considerado "uma personalidade com todas as condições para dar ao SNS um aporte em matéria de gestão que todos julgamos ser necessária" - aliás, a exigência e complexidade do setor e na gestão das unidades do SNS, foi o argumento usado pelo governo para criação desta nova entidade - e nele estão agora depositadas todas as expectativas de mudança. Uma mudança que exige planeamento. Há um ano dizia mesmo que a mudança e a resolução de alguns problemas dos utentes, como o tempo de espera para consultas ou cirurgias, passava por o "poder político perceber que o mais importante (...) é o planeamento, e que este seja feito de forma mais atenta e rigorosa, porque isso trará resultados, até pode ser noutra legislatura, mas serão resultados para o país".
O médico e gestor do SNS está agora a compor a equipa com que vai trabalhar, tendo assumido ser uma "enorme honra" presidir à direção Executiva do SNS, e que o trabalho a fazer será "para os utentes", aguardando "pela nomeação formal para começar a trabalhar a 1 de janeiro".
Como vai funcionar a nova direção executiva?De acordo com o decreto-lei publicado nesta sexta-feira, a direção executiva do Serviço Nacional de Saúde, irá coordenar a resposta nas unidades de saúde públicas e será composta por cinco órgãos, ficando com o estatuto de instituto público de regime especial para garantir autonomia e emitir regulamentos e orientações.
O documento explica que a figura de "instituto público de regime especial" serve para garantir, por um lado, "a superintendência e tutela do membro do Governo responsável pela área da saúde" e, por outro, "o exercício autónomo das suas atribuições e do poder de emitir regulamentos, orientações, diretrizes e instruções genéricas e específicas vinculativas sobre os estabelecimentos e serviços do SNS".
Mas esta direção vai integrar ainda um conselho estratégico - órgão de coordenação da definição das estratégias de recursos do SNS -, que é composto pelo diretor executivo, pelo presidente do conselho diretivo da Administração Central do Sistema de Saúde, I. P. (ACSS) e pelo presidente do conselho de administração dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), uma assembleia de gestores e o fiscal único, respetivamente, os órgãos de consulta e participação e de fiscalização.
Vai também coordenar a resposta assistencial das unidades de saúde do SNS, "assegurando o seu funcionamento em rede, a melhoria contínua do acesso a cuidados de saúde, a participação dos utentes e o alinhamento da governação clínica e de saúde".