www.dinheirovivo.ptdinheirovivo.pt - 21 mai. 01:02

Inércia

Inércia

Um governo com maioria absoluta e mandato para quatro anos e meio cria a expectativa de, finalmente, começar a haver uma estratégia longo prazo, não condicionada pelo taticismo, mais ou menos populista, antes indispensável à manutenção no poder. Os primeiros sinais não são promissores. Eis dois exemplos.

O aumento dos preços dos combustíveis em período (pré)eleitoral poderá ter feito temer algo parecido com os "coletes amarelos". Nesse contexto, entende-se uma medida como o "autovoucher", por mais desasada, em termos de equidade económica e social, que a mesma fosse. Eleito o novo governo, compreende-se mal que o mecanismo tivesse sido, num primeiro momento, reforçado e, ulteriormente, substituído por uma descida nos impostos que, objetivamente, estimula as importações e o consumo, numa altura em que este bate recordes. Pior: ao fazê-lo perde-se margem de manobra para discriminar positivamente quem realmente precisa (os mais velhos, pobres e carenciados, sem carro ou que pouco o usam; as empresas mais intensivas no consumo de energia) e para se incentivar o que precisa de ser feito (a eficiência energética; a transição para tecnologias menos dependentes dos combustíveis fósseis). Não que essas prioridades não façam parte do discurso. Já os atos...

Se se percebe que haja uma contenção salarial na função pública para evitar, por efeito direto e indireto, alimentar a espiral inflacionista, percebe-se mal que falte, uma vez mais, uma perspetiva de longo prazo sobre a gestão das pessoas no aparelho de Estado. Não se consegue atrair, requalificar ou, sequer, reter os mais qualificados. Para jovens, com alternativas de emprego, a função pública deixou de fazer parte da sua agenda. O resultado é um Estado que falha aos cidadãos. Falta-lhe estratégia e gestão. Não era este o tempo certo para se apresentar uma nova política de reforma da função de recrutamento, formação, promoção e remuneração consistente e ambiciosa que desse visibilidade e futuro ao emprego público? Sem isso, a moderação salarial é apenas mais uma pedra no caixão.

Alberto Castro, economista e professor universitário

NewsItem [
pubDate=2022-05-21 02:02:00.0
, url=https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/inercia-14871934.html
, host=www.dinheirovivo.pt
, wordCount=279
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2022_05_21_119053309_inercia
, topics=[opinião, opinião: alberto castro, economia]
, sections=[opiniao, economia]
, score=0.000000]