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Resiliência no Serviço Nacional de Saúde e na saúde

Resiliência no Serviço Nacional de Saúde e na saúde

A nossa saúde depende não apenas dos cuidados, mas também dos sítios onde vivemos, da qualidade das nossas casas e dos nossos empregos, do nosso nível de escolaridade e, sobretudo, de sermos pobres ou ricos.

Resiliência é a capacidade de absorver, adaptar e transformar o sistema face aos choques externos. A pergunta mais debatida, nos tempos da pandemia, foi a da resiliência do Serviço Nacional de Saúde (SNS), mas pouco foi dito sobre a resiliência da saúde. São estes dois temas que importa distinguir.

Do lado do SNS, houve aspetos menos bem-sucedidos e talvez previsíveis, e sucessos importantes e inesperados. No sentido das dificuldades, o agudizar de adversidades anteriores geraram constrangimentos na manutenção do nível de atividade dos serviços que existia no período pré-pandemia, com quedas em 2020 de 19% nas cirurgias e de 10% nas consultas, entre outros.

Esta quebra tem várias causas, amplamente exploradas, como o receio dos próprios utentes em deslocar-se aos cuidados de saúde, o forte aumento do absentismo e saída dos profissionais, ou a necessidade de reduzir a atividade para garantir o cumprimento das normas de isolamento. De notar que, apesar da aparente inevitabilidade da situação, a quebra não foi igual em todos os hospitais e centros de saúde, com alguns a manter a sua capacidade em níveis relativamente elevados. Este ponto volta a levantar a antiga questão da capacidade de gestão dos hospitais públicos, muito heterogénea e sem apuramento claro das diferenças nas nomeações e reconduções dos seus dirigentes.

Numa ótica mais positiva, é de destacar sobretudo uma flexibilidade a que não estávamos habituados a ver no SNS. Exemplos abundam desta flexibilidade interna e externa. Internamente, foi dada uma autonomia, pouco imaginável antes da pandemia, aos gestores hospitalares, como a capacidade de substituir profissionais sem autorização prévia, ou a possibilidade de rever os processos de cuidados, com a introdução em grande escala da telemedicina. Também houve autonomia para reorganizar, num curto espaço de tempo, os centros de saúde, com a criação dos centros de atendimento aos doentes covid.

Externamente, houve agilidade no pedido de ajuda a quem podia colaborar. Exemplo disso foi a abertura à academia, através do apoio no desenho de estratégias de combate à pandemia. Outro exemplo foi a capacidade de criação de registos eletrónicos de doentes e pessoas em isolamento, com apoio de empresas tecnológicas. Outro exemplo ainda foi a vacinação, que recebeu um apoio decisivo do Exército. Um último exemplo, enquanto tanto se fala da descentralização e da reticência dos autarcas em assumir competências na área da saúde, foi o forte envolvimento das autarquias no combate à pandemia.

A Escola Nacional de Saúde Pública e o PÚBLICO assinalam a Semana Europeia de Saúde Pública, que, em 2022, tem por lema "Saúde ao longo da vida". Esta é uma iniciativa da European Public Health Association (EUPHA), com o apoio da Organização Mundial da Saúde (OMS)

Ora, pouco se falou da resistência mais global da nossa saúde face à pandemia. Houve pessoas que perderam emprego e rendimento, houve crianças que deixaram durante meses de serem escolarizadas, houve um aumento forte da taxa de pobreza. As consequências de curto prazo foram apontadas sobretudo na saúde mental, essencialmente nos jovens; mas a longo prazo, sentiremos as consequências de as pessoas terem ficado mais pobres, menos escolarizadas, e com menos acesso aos cuidados de saúde. Esta é a bomba de retardamento da pandemia. O que é prioritário para a construção da resiliência para as próximas pandemias, que inevitavelmente irão acontecer, é a criação de uma sociedade menos desigual, economicamente mais robusta e com uma saúde pública no topo da agenda política.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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