visao.sapo.ptapfigueiredo - 20 mai. 09:20

Visão | O PSD e a varíola dos macacos

Visão | O PSD e a varíola dos macacos

Eu cá não sou nenhum Vasco Pulido Valente (que já agora Pinto Balsemão detestava) mas admito que, com a idade, vou estando cada vez melhor vacinado para os ímpetos reformistas do PSD que têm o mesmo efeito na mudança estrutural do país do que uma aspirina contra a varíola dos macacos

Daqui a oito dias, logo após a estreia da 4ª temporada de ‘Stranger Things’ e na data em que antes se celebrava o pronunciamento militar que daria origem ao Estado Novo, o PSD vai a votos perante a indiferença do País. Não será arriscado especular que haverá mais pessoas, fora do partido, preocupadas com os casos da varíola dos macacos em humanos do que há interessadas em saber quem ganha as eleições internas, se Jorge Moreira da Silva ou Luís Montenegro. Internamente, reina o suspense nas distritais e entre os militantes, enquanto Moreira da Silva denuncia que Montenegro foge aos debates e Montenegro critica que Moreira da Silva não quer debater. Cá fora, nos cafés, nos barbeiros e nos táxis, reina um desolador desinteresse por esse assunto como tema de conversa.  

Nas eleições em que Rui Rio ganhou a Paulo Rangel, votaram 35.991 militantes. Inscritos havia 46.664. Para quem não sabe, o militante número 1 do Partido Social Democrata é Francisco Pinto Balsemão. Recentemente, Balsemão publicou as quase mil páginas da sua autobiografia, onde detalha diversos episódios da sua vida como empresário e como político, listando os amigos que o acompanharam e acompanham no caminho, mas também os seus ódios de estimação. 

A páginas tantas, mais exatamente na página 626, deram-me que pensar as “5 bandeiras e os 12 desafios” definidos aquando dos 40 anos do partido, celebrados em 2014, já lá vão portanto uns oito. Eis as 5 bandeiras: Libertar a sociedade civil; Promover o crescimento sustentável e a competitividade; Garantir a igualdade de oportunidades à partida; Modernizar o Estado; Afirmar Portugal no Mundo. E eis os 12 desafios: Reformar o sistema político; Reformar o Estado; Reduzir despesa para baixar impostos; Reformar a segurança social; Reforçar a competitividade (as exportações têm de ascender a 50% do PIB); Remover os obstáculos à natalidade; Combater a desertificação do Interior; Apostar na inovação empresarial; Desenvolver a Economia Verde; Investir no Crescimento Azul; Reforçar a coesão social; Exercer uma clara opção europeia.   

Daqui a dois anos, quando o PSD celebrar os seus 50, Jorge Moreira da Silva ou Luís Montenegro, um deles, será o 19º presidente do partido. E esse presidente terá como tarefa olhar para a lista acima e copiá-la. Porque os desafios, com exceção da “clara opção europeia”, permanecerão por vencer, já que ninguém acredita que qualquer das reformas mencionadas seja feita daqui até 2024.

Para quem leu as duas moções de estratégia que vão agora a votos, intituladas “Direito ao Futuro” e “Acreditar”, a conversa é duplamente deprimente. As boas intenções reformistas, as promessas progressistas e as perspetivas otimistas chocam de frente com a realidade, como um mosquito contra o vidro de um carro na autoestrada. 

Peguemos num exemplo apenas. Ao longo da história do PSD (e se eliminarmos o período de intervenção da Troika pela sua excecionalidade), só me recordo de um líder então na oposição – Marques Mendes em 2006 – ter apresentado uma alternativa ao modelo de segurança social; Um sistema misto, em que uma parte dos descontos do trabalhador continuaria a reverter para todos e outra parte seria canalizada para uma conta individual de capitalização.

De acordo com esta proposta, para gerir as contas individuais de capitalização existiria obrigatoriamente um fundo público gerido pelo Estado ou uma instituição pública, a par de fundos privados, cabendo ao trabalhador escolher qual a entidade que preferia. O ministro socialista Vieira da Silva fez orelhas moucas, os jornalistas estiveram-se quase todos nas tintas para uma proposta que falava do futuro das gerações e de um colapso “longínquo” a vinte anos do sistema e a proposta que nasceu em setembro estava morta no Natal. E assim ficou, a reforma da segurança social, resumida a “um desiderato”, “um novo paradigma” e coisas que o valham. 

. Podem dizer que a esperança é a última coisa a morrer e talvez seja verdade. Mas a paciência, essa, é das primeiras. 

Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

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