ionline.sapo.ptCarlos Carreiras - 8 dez. 09:34

Políticas de habitação: respostas que os portugueses exigem

Políticas de habitação: respostas que os portugueses exigem

Não espanta que o novo ano nos traga uma história velha: os portugueses continuarão a ficar mais pobres. De tal forma que, já em 2022, vamos arrastar os pés até aos últimos lugares da União Europeia.

Qual é o horizonte estratégico de Portugal? Onde queremos estar daqui por dez anos?

Em que setores de atividade económica queremos ser melhores do que os melhores?

Sabendo que não pode fazer tudo para todos, quais são as funções das quais o Estado não pode demitir-se? Qual o nível de fiscalidade que estamos dispostos a suportar para ter esses serviços? E quais desses serviços podem ser deixados à iniciativa privada garantindo que ninguém é excluído?

Estamos a mês e meio das legislativas e nenhum cidadão sabe responder a estas questões. Porquê? Porque nenhuma liderança lhes aponta um vislumbre de esperança ou de clareza política.

Por isso, não espanta que o novo ano nos traga uma história velha: os portugueses continuarão a ficar mais pobres. De tal forma que, já em 2022, vamos arrastar os pés até aos últimos lugares da União Europeia. Com quase mais 20 anos de avanço na integração, deixámo-nos ultrapassar por praticamente todos os países de Leste que só ligaram as suas economias aos fundos europeus em 2004. Se temos algum amor-próprio e sobretudo algum tipo de preocupação com o país que vamos deixar aos nossos filhos e netos, temos de nos inquietar. Temos de perceber as causas de estarmos sempre a ficar para trás. Com anos e anos de políticas assistencialistas na saúde, na educação e também na habitação, é intrigante que não só não tenhamos conseguido descontinuar a pobreza, como a cada ano que passa a situação só tenda a agravar-se (veja-se o número de crianças e idosos em pobreza ou a decrepitude de vários serviços do Estado).

Com brevíssimas exceções, a falta de coragem e de estratégia de quem governa o país é a principal razão da generalização da pobreza. As reformas na saúde, na educação, na justiça, na saúde e na segurança social continuam por fazer. Parece-me, porém, que o tempo de empurrar os problemas com a barriga está a chegar ao fim. Estamos num momento de ou vai ou racha. Para começar, a economia hiperglobalizada e digitalizada imprimiu uma velocidade de mudança avassaladora. Quem não se adaptar, quem não correr, vai ficar para trás. Em segundo lugar os dinheiros do PRR e do Portugal 2030 significam que, pela primeira vez em muito tempo, o dinheiro não será um problema para o nosso país. O problema será tempo para executar os projetos que a Europa se predispõe a pagar para recuperarmos a nossa economia. Em terceiro e último lugar, a pandemia destapou muitos problemas que sucessivos governos foram varrendo para debaixo do tapete. Com os cidadãos saturados da pandemia e da elevadíssima carga fiscal, questionando cada vez mais a utilidade dos impostos que pagam que não se traduzem em serviços, acabou o jogo do empurra: é para fazer ou para fazer.

A Habitação é uma das áreas de política pública em que os portugueses exigem respostas. Independentemente daquilo que o Estado Central venha ou não a fazer, em Cascais temos o nosso rumo definido e queremos dar respostas aos cidadãos.

Nesse sentido apresentámos ontem uma versão preliminar da nossa Estratégia Local de Habitação (ELH), desenvolvida por uma equipa da Câmara de Cascais com académicos da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.

A estratégia aponta um desígnio: garantir acesso de todos a habitação condigna e desenvolver políticas de habitação verdadeiramente transformadoras. Mas antes de lá chegar faz um retrato duro da realidade de Cascais no que diz respeito à população elegível para o Primeiro Direito – ainda assim mais favorável do que a dos concelhos de dimensão equivalente.

Em números: há 2509 famílias para realojar em Cascais. Destas, 1904 estão em situação de carência habitacional (vivem em anexos, garagens e outras instalações sem dignidade); e 605 na situação que se convencionou de carência economia (ou seja, ou têm casa arrendada mas estão na iminência de despejo por dificuldades económicas).

A escassez de habitação é um problema transversal a diversas classes e estratos. O que implica que as soluções tenham de ser distintas ao abrigo de um grande programa de habitação pública que não se restringe às necessidades identificadas no programa 1ºDireito.

Reabilitaremos o parque habitacional público que é hoje 2.8% do total de casas no concelho. Com a execução do nosso projeto, esse número chegará aos 3.3%. Melhor mas insuficiente porque a nossa ambição é que, no fim da década, a habitação pública atinja os 30% do total do parque habitacional do concelho. Como é que chegamos lá? Cascais entrará em múltiplas frentes.

(1) Construção. Temos previstos 800 novos fogos, que já sinalizamos para candidatura a linhas de financiamento nacionais e europeias no valor aproximado de 165 milhões de euros, em todas as freguesias: Encosta da Carreira, Sassoeiros, Bairro Calouste Gulbenkian, Adroana, Fontaínhas, Rana e Bairro Marechal Carmona.

(2) Arrendamento acessível. Dotámos o orçamento municipal de 2022 com verbas para programas de renda acessível não apenas para população vulnerável, mas também para professores e profissionais de saúde deslocados e estudantes. Outras formas de suporte, como apoio direto aos beneficiários, aquisição ou reabilitação também são equacionados.

(3)Habitação partilhada e colaborativa. Pretendemos que seja o estado da arte das políticas de habitação holísticas, reinventando os bairros sociais de primeira geração com serviços partilhados elevados índices de inteligência territorial.

(4) Regeneração e sustentabilidade. Trabalhando os bairros para o conforto térmico e sustentabilidade ambiental e energética, um requisito essencial para o século XXI e que representa ganhos económicos para as famílias.

Depois do Congresso da Habitação, há dois anos, este será o documento fundacional da nossa política de habitação, com implicações políticas e departamentais de várias ordens. Fixei no meu Gabinete a equipa de Trabalho da Habitação e alterámos o nosso organograma com uma nova diretoria municipal focada na captação e execução de fundos. No que depender de nós, não ficará um euro por executar dos dinheiros europeus.

Criámos um Conselho Municipal de Habitação para acompanhar a execução do programa. Criaremos os instrumentos, em conformidade com a Lei de Bases, a saber a “Carta Municipal de Habitação” e o “Ralatório Municipal de Habitação”, e seremos muito criteriosos no modelo de governance deste programa de habitação pública. A política de habitação não rima com eleições – mas rima com gerações. Isso quer dizer que se pressupõe um compromisso estável e duradouro para executar as políticas. Tenho a convicção de que em Cascais o alcançaremos. Era útil, ao País e sobretudo aos portugueses em maior dificuldade, que o mesmo acontecesse ao nível nacional. Para que Portugal deixe de ser um país adiado.

Presidente da Câmara Municipal de Cascais

Escreve à quarta-feira

Com vista para o Atlântico

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