jornaleconomico.sapo.ptAna Pina - 26 jan. 00:07

Otimismo quanto baste

Otimismo quanto baste

Este não é o tempo de pôr em prática estratégias partidárias que só alimentam o ceticismo e a desconfiança. É o tempo de ter humildade democrática, reconhecer os erros cometidos e unir esforços para combater a pandemia.

Vivemos momentos excecionais numa conjuntura de crise mundial onde, para além das medidas essenciais de saúde pública e de apoio à economia é preciso também uma certa dose de otimismo.

Não o otimismo que Voltaire criticava, através da ironia e da sátira, no seu livro “Cândido ou o Otimismo” (1789), mas sim aquele otimismo realista, viável e possível, nestes tempos difíceis.

A crise que atravessamos é certamente a mais séria que a maioria de nós já viveu e o ceticismo parece querer ocupar todo o espaço possível para o otimismo.

É difícil injetar otimismo em tempos de pandemia, com a morte de milhares de pessoas, com o Serviço Nacional de Saúde (SNS) em rutura; com cuidados de saúde insuficientes; com desemprego; com déficits e dívidas crescentes; com pagamentos em atraso; com falta de apoios financeiros; com estabelecimentos de ensino encerrados; com os serviços públicos a meio gás; sem o suporte essencial dos amigos e (em muitos casos) completamente isolados dos entes queridos.

Este artigo não pretende atenuar a situação, justificar erros ou dar esperanças infundadas a quem enfrenta momentos dramáticos e extraordinários.

Pretende-se deixar claro que o otimismo é uma ferramenta que nos ajuda a enfrentar desafios em vez de nos deixar ficar dominados pelo medo ou desespero. Ser otimista é ser capaz de enfrentar os aspetos sombrios da realidade, com uma perspetiva que nos incentiva a ser persistentes e positivos.

Como disse Helen Keller, “o otimismo é a fé que conduz à realização. Nada pode ser feito sem esperança e confiança.” Mas aqui o apelo que se faz é ao otimismo realista, sem excessos e na medida certa.

No passado dia 13 de janeiro foi decretado o prolongamento do estado de emergência com restrições em todas as áreas e setores da economia. Já no dia 21 mais medidas restritivas foram anunciadas. Este será um confinamento que irá agravar ainda mais a crise económica e por isso terá consequências em todas as famílias.

É imperioso que se inverta a situação e é nestes momentos de alerta que temos de parar e pensar. Em situações onde o perigo está presente (como a que vivemos), o otimismo excessivo pode ter graves consequências. O que normalmente é uma força positiva torna-se uma fraqueza perigosa.

Por acreditarmos que as coisas vão funcionar bem, mesmo quando há poucas evidências disso, tendemos a minimizar os riscos, as suas consequências, a subestimar os custos e a ignorar os sinais de alerta.

Chegámos ao ponto de achar que a nossa vulnerabilidade à Covid-19 é pouca acreditando, sem qualquer justificação, que temos menos probabilidade de ser atingidos por este vírus que está a consumir a sociedade e a economia.

Temos de ser otimistas, sim! Mas também responsáveis e realistas percebendo como podemos beneficiar de uma postura otimista e, ao mesmo tempo, minimizar qualquer risco para nós e para os outros.

Durante a pandemia temos visto a reação do Governo que, num ambiente imprevisível, tem vindo a criar um certo nível de incerteza que gera desconfiança. Esta incerteza é um dos principais obstáculos a ultrapassar e mesmo com uma boa dose de otimismo os tempos que aí vêm são de uma exigência cada vez maior.

Temos problemas que se agravam ao nível das empresas, do emprego, do crescimento do país e da economia em geral. Muitos criticam a ausência de estratégia, mas este é precisamente o momento em que, por via de uma situação dramática e de crise de saúde pública, a prioridade deve ser a de estar ao lado dos que nos governam.

Não devemos nunca perder o sentido crítico, mas o apelo deve ser ao otimismo e principalmente à confiança de que conseguiremos superar esta crise que, infelizmente, já matou milhares de portugueses e contagiou centenas de milhar.

No plano individual não podemos facilitar e temos de exigir, de todos, um sentido de responsabilidade adicional que valorize, acima de tudo, a vida humana.

Os nossos profissionais de saúde são hoje os militares que estão na linha da frente e que nos defendem, num autêntico cenário de guerra contra um inimigo invisível e com um enorme grau de imprevisibilidade. Valha-nos esses bravos heróis em quem depositamos as nossas vidas.

Só depois – em paralelo, mas sem o mesmo destaque – vem a salvaguarda de elementos como a economia, o trabalho, as empresas e tudo o mais. Sem a garantia de salvaguarda das vidas humanas de que valem as medidas e políticas de qualquer tipo? Nada!

Já no plano político aceitemos que este não é o tempo de pôr em prática estratégias partidárias que só alimentam o ceticismo e a desconfiança. Este é o tempo de ter humildade democrática para reconhecer os erros cometidos e também o tempo de unir esforços para o combate desta pandemia.

Aos críticos, que podem eventualmente ter uma certa razão, pede-se que adiram ao otimismo (real e responsável) e enquanto as “bombas” caem sobre todos nós, ajudem a abrigar os mais frágeis e reforcem as fileiras para o combate de uma vida.

Depois de vencida a guerra, aqui estaremos todos de volta ao ru��do mediático e às estratégias e interesses diversos. Uns para apelar a uma alternativa, outros para apostar na continuidade, mas só alguns de nós com a legitimidade de quem, no momento mais difícil, deu a mão aos que combatiam em vez de os deixar cair.

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