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As feridas da Direita e o desafio da Esquerda

As feridas da Direita e o desafio da Esquerda

Os dados da abstenção, apesar de elevados, mostram que mais pessoas do que o esperado mobilizaram-se num contexto adverso. Já os resultados condensam reconfigurações em curso na política portuguesa.

A candidatura de Marisa Matias, que apoiei, não foi capaz de criar a mobilização desejada à Esquerda. Mas, se formos objetivos, o mesmo se dirá das candidaturas de Ana Gomes e João Ferreira. Não acho que o resultado à Esquerda tivesse sido melhor com menos candidaturas, pelo contrário. Três campanhas combativas somaram mais votos, mas não diminuíram o alcance eleitoral de Marcelo Rebelo de Sousa.

Na ponta final, agitando uma mais que improvável segunda volta, o candidato apoiado por PS e PSD acabou por juntar mais votos que em 2016. O voto de Esquerda em Marcelo quase deu a Ventura o almejado segundo lugar (mesmo com menos meio milhão de votos que o segundo classificado de há cinco anos, Sampaio da Nóvoa).

Por sua vez, o candidato da extrema-direita beneficiou da desistência e desintegração da Direita tradicional. É do CDS e dos extremos conservadores do PSD que vem o voto em Ventura. Rio também ajudou, quando celebrou com o Chega um acordo nos Açores, desistindo de fazer a cerca ao extremismo como fazem tantos partidos de Direita na Europa. Quem ouviu Rui Rio na noite eleitoral já sabe que, nas autárquicas, os lugares do PSD vão contar mais que os princípios democráticos e republicanos. Mas há gente na Direita que não quer entrar nas aventuras perigosas de Rio com os protofascistas. E é nesse espaço que António Costa quer expandir-se, com o alto patrocínio de Marcelo Rebelo de Sousa. Nada que não tenhamos visto com Macron em França, o protagonista de uma aliança entre socialistas e liberais.

A normalização da aliança do PSD com a extrema-direita para "chegar ao pote", assim como a ancoragem do PS no status quo com Marcelo, são más notícias para o país. Trata-se, antes de mais, de uma estratégia de mera conservação do poder sem qualquer programa de avanços em direitos sociais. E uma estratégia de vistas curtas, pois quanto mais largo o espectro político do centro, mais estreita a sua capacidade de protagonizar mudanças relevantes a favor da maioria da população.

Eleições presidenciais não são legislativas. A sondagem de domingo, feita à boca da urna, atribui ao Bloco o dobro dos votos que teve a candidata apoiada pelo partido. Temos muitos exemplos que nos provam que as pessoas sabem distinguir os seus votos entre eleições. Se o PSD aliado com a extrema-direita é um perigo, o centrão nunca trouxe boas soluções ao país. Só uma política consistente em torno da defesa do emprego e dos salários, dos serviços públicos, do combate às desigualdades e à desintegração social pode fazê-lo. O Bloco de Esquerda cá estará, na luta por uma maioria capaz de avanços nesse programa para Portugal.

* Deputada do Bloco de Esquerda

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