Carlos Encarnação - 25 jan. 22:54
Ao Postigo
Ao Postigo
Mas é, este debate, contemporâneo do caos nos hospitais, da exaustão dos profissionais de saúde, da angústia semeada. E assiste ao pronunciamento dos Sindicatos dos Professores que se juntam à Ordem dos Médicos na opção declarada pelo encerramento das escolas.
A situação do país é tão grave que já não esperava muito do debate parlamentar de hoje. Veio atrasado, veio muitos casos e muitas mortes depois. Veio depois de várias tentativas absurdas de inventar e experimentar iniciativas de confinamento.Veio depois de não ser possível explicar como se limitavam alguns ajuntamentos e se insistia noutros. Veio depois de o Governo meter os pés pelas mãos. Veio depois de recusar a sua responsabilidade no desenho inadequado da resposta e na desastrada previsão. Veio depois de recusar a responsabilidade na ineficácia e de a tentar endossar aos portugueses que em Abril eram extraordinários. Veio depois do ridículo confinamento do postigo.
Ou ao pronunciamento da Associação dos Administradores Hospitalares a dizer ser impossível manter este cenário. Ou, ao anúncio do Presidente da República da convocatória dos especialistas.
Felizmente, estudos anteriores e pareceres daqueles últimos concorreram para formar na opinião pública a indispensabilidade de mudar de critério. Nem a isso se curvou o Governo, surdo aos apelos e em verdadeiro estado de negação da realidade. Mas, agora, o primeiro dos ministros constata o seu isolamento. Está contra o mundo e cai-lhe o céu sobre a cabeça como, infelizmente e como consequência, acontece a todos nós.
Concede, finalmente, que está pronto a substituir o ensino presencial pelo ensino à distância hoje, ou amanhã, ou depois, ou para a semana. Como se o tempo fosse indiferente. Mas acrescenta uma condição: a de concluir que a estirpe do vírus inglês, aquele que há quase um mês por aqui anda, é dominante. Quer, portanto sair por cima, recusar o erro.
E é mais claro, ainda, quando se dirige ao PSD e o acusa de, caso faça o que deve, preparar a denúncia do seu recuo. Não, não é um argumento, não é a manobra de diversão admissível, é um estratagema, é uma esperteza saloia. Por menos que se esperasse deste debate, talvez se não aguardasse tanto. Perdeu a razão, o primeiro. E a compostura. O futuro próximo do país repousa no medo. Talvez as pessoas se recolham em casa. Talvez receiem não ter cuidados médicos. Talvez tentem salvar-se. Sabem que o momento não pode ser pior. Têm culpa pela sua falta de civismo mas não estão sozinhos na culpa. Há um mês atrás cortejos de ministros e de secretários de Estado e de diretores-gerais e particulares corriam a anunciar a boa nova da vacina próxima.
Infelizmente, nos dias seguintes, foi necessário esclarecer como o tempo de aplicação da mesma vacina vai ser longo, como setores merecedores de máxima proteção vão recebê-la mais tarde, como estamos tão dependentes da cadência do seu fornecimento. Até à próxima segunda-feira a campanha eleitoral servirá de cortina de fumo com os insultos, a procura de notoriedade, o bâton e a candidatura a secretário-geral a tentarem chamar a atenção.
Depois, fecha-se o postigo. Será o país com a crueza da realidade.