sol.sapo.ptMiguel Pinto-Correia - 25 jan. 23:16

Responsabilidade

Responsabilidade

O contributo do CINM nas finanças regionais é inegável! Os números mais recentes disponíveis revelam uma receita fiscal efetiva de 13,3% do total das receitas da RAM (121 milhões de euros, i.e. 42,8% do total de IRC cobrado no arquipélago).

Por Miguel Pinto-Correia, economista

É do conhecimento de todos que a doutora Mortágua tem criticado fortemente o CINM – Centro Internacional de Negócios da Madeira (vulgo Zona Franca da Madeira). Assim, importa refutar os seus argumentos contra o segundo pilar da economia da Região Autónoma da Madeira (RAM).

A doutora Mortágua argumentou que o CINM é, alegadamente, utilizado com o propósito de cometer crimes fiscais. Porém, como será do conhecimento da doutora Mortágua, nos termos da Diretiva Europeia 2015/849 e subsequentes, bem como as respetivas transposições para o Direito português, as empresas do CINM, como todas as empresas em Portugal, encontram-se obrigadas nos termos da lei a reportar os beneficiários efetivos. Do ponto de vista meramente jurídico, o risco de fraude e corrupção é igual quer se trate do regime fiscal aplicável ao CINM, quer se trate do regime fiscal ‘geral’ português. 

Recorde-se ainda que a legislação relativamente ao branqueamento de capitais é aplicável a Portugal como um todo, sendo por isso o risco idêntico e as autoridades de supervisão exatamente as mesmas. Admitindo, por hipótese, que a baixa tributação decorre única e exclusivamente do Artigo 36.º-A do EBF, seja um fator agravante do risco associado a uma maior incidência de contas de passagem, tal já deveria ser do conhecimento das autoridades nacionais competentes desde a década de 80. No entanto, não é por isso de estranhar o tempo enorme que leva às empresas do CINM para abrir conta bancária, chegando por vezes aos 6 meses devido ao controlo mais apertado por parte dos bancos. 
Saberá a doutora Mortágua se as demais empresas portuguesas levam tanto tempo para abrir uma conta bancária e se estão sujeitas a tão exaustivo escrutínio, quer por parte das instituições financeiras, quer por parte do Banco de Portugal!?

Dado que o propósito do CINM é captar investimento direto estrangeiro, as empresas do mesmo encontram-se muitas vezes inseridas em grupos internacionais. Estes grupos poderão ter presença em jurisdições fiscalmente eficientes, como Malta ou Ilhas Virgem Britânicas, com dois objetivos muito claros: proteção dos ativos detidos por via da estabilidade fiscal e legislativa que oferecem (coisa que Portugal nunca garantiu em mais de 40 anos de democracia!) e o facto de proporcionarem a inexistência de quaisquer outras camadas de tributação, ficando esta unicamente a cargo do país de origem ou de destino final do investimento.

A existirem problemas de BEPS associados à utilização de empresas sediadas no CINM, como será do conhecimento da doutora, só podem ser resolvidos a nível europeu e internacional, através da medidas multilaterais que visem uma maior harmonização em termos da fiscalidade internacional, não sendo por isso um problema exclusivo ao CINM (ou a Portugal), que possa ser resolvido pelos Órgãos de Autonomia da Madeira.

Que fique bem claro: se não houvesse CINM esta receita nunca seria cobrada na RAM, e consequentemente nunca seria cobrada na República portuguesa!

Doutora Mortágua, em resumo sem o CINM a RAM perderá 10% do seu PIB; mais de 6000 ficarão desempregados; a RAM ficará muito mais endividada graças a uma perda de 13,3% das receitas fiscais efetivas; irão à falência mais de 1200 empresas; e perder-se-á cerca de 680 embarcações com pavilhão português.

Como deputada membro da Comissão de Orçamento e Finanças, a RAM, os madeirenses e porto-santenses exigem-lhe: RESPONSABILIDADE nas decisões que toma em relação ao segundo pilar de uma pequena economia insular e ultraperiférica (ferramenta única de captação de IDE para o país); RESPONSABILIDADE para com as gerações mais novas de madeirenses e porto-santenses que optam por uma carreira internacional e enriquecedora na sua terra natal; RESPONSABILIDADE para cumprir constitucionalmente o artigo 146.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira! A menos que a doutora Mortágua apoie a perpetuação de mecanismos e práticas coloniais de pobreza…

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