jornaleconomico.sapo.ptjornaleconomico.sapo.pt - 25 jan. 17:30

Mark Schwartz: “A mudança cultural das empresas não um pré-requisito da transformação digital”

Mark Schwartz: “A mudança cultural das empresas não um pré-requisito da transformação digital”

O estratega da Amazon Web Services explicou ao Jornal Económico como os obstáculos culturais, organizacionais, burocráticos, de governança e investimento são ultrapassáveis na hora de digitalizar ou migrar para a 'cloud'. "Nós contamos-lhes histórias, porque nós passámos pelo mesmo. As histórias aju

Mark Schwartz, enterprise strategist na Amazon Web Services (AWS), faz parte de uma pequena equipa de 15 pessoas que trabalham na tecnológica norte-americana como estrategas das empresas para a digitalização, depois de terem sido CEO ou diretores de tecnologia em multinacionais que passaram por um extenso processo de transformação. O autor de obras como “The Art of Business Value” e “A Seat at the Table: IT Leadership in the Age of Agility” explicou ao Jornal Económico como os obstáculos culturais, organizacionais, burocráticos, de governança e investimento são ultrapassáveis na hora de digitalizar ou migrar para a nuvem (cloud).

Como é que desenvolve uma estratégia digital paras as empresas?

Aprendemos muitas lições por nos ter acontecido connosco e o nosso papel agora é trabalhar com os clientes, grandes empresas, executivos seniores, e tentamos ajudá-los com os impedimentos ou obstáculos que a maioria das organizações enfrentam quando estão a tentar lidar com a transformação digital. Escrevemos livros, artigos e publicações em blogues, falamos em conferências, mas principalmente tentamos auxiliar empresas de grande dimensão a serem melhores a transformarem-me para o mundo digital.

Li num desses seus artigos que acredita que “é possível mudar mesmo com a existência de burocracias, gaps de comunicação”…

Sim. As organizações com as quais trabalhamos, os tipos de desafios com os quais normalmente se deparam, são coisas como mudança cultural, estrutura organizacional, burocracia, como referiu, modelos de governance e de investimento. Ou seja, são quase sempre estas questões não-técnicas. O que percebemos é que existem padrões, que há desafios que são muito típicos ou semelhantes porque falamos com muitos clientes – cada um de nós reúne-se com uns 130 clientes por ano ou algo assim. E como temos a nossa própria experiência em lidar com estas coisas temos – poderá dizer-se – truques ou técnicas que parecem funcionar bem para ultrapassar essas situações. Portanto, muitas empresas quando começa a pensar em migrar para a cloud ou transformarem-se a primeira ideia é: “Não conseguimos fazer isso. A nossa cultura não o suporta, os nossos recursos humanos não têm as qualificações”. O que lhes costumo dizer é “claro que as vossas pessoas não têm essa cultura, as skills, porque têm uma cultura de fazer as coisas como faziam ontem”. Isso acontece como todos os que vão fazer uma grande mudança. A mudança cultural não um pré-requisito para a transformação digital. As empresas não têm de mudar a sua cultura primeiro para depois se transformarem digitalmente. É um output, um resultado disso. Geralmente, a cultura de uma empresa desenvolve-se ao longo do tempo para reforçar os tópicos que as pessoas entendem tornarem-nas bem-sucedidas, mas o que as tornava bem-sucedidas ontem não é o que o que se pensa que tornará no futuro. Logo, o que se tem de fazer é alterar comportamentos que levem a uma nova maneira de fazer melhor. À medida que as pessoas se tornam bem-sucedidas, nessa nova forma, a cultura muda também.

O que é que essa nova forma implica para os gestores? Há alguma receita que dão às centenas de clientes?

Muitas vezes isso significa que os líderes têm de mudar os incentivos às pessoas que trabalham com eles, tirar os obstáculos do caminho para que os profissionais não se sintam frustrados… Nós contamos-lhes histórias, porque nós passámos pelo mesmo. As histórias ajudam muito as pessoas. Por exemplo, conto-lhes como na minha empresa*, antes de me juntar à AWS, mudámos o que é a cultura de qualidade de trabalho. Antes o trabalho das pessoas era proteger o público de software mau. Fazer um bom trabalho era travar problemas de qualidade. Contudo, nesta nova forma de fazer as coisas, numa era mais digital, não queremos que a garantia da qualidade entre só no final do processo e chegue à conclusão de a qualidade não era boa. Tu queres ter essa garantia envolvida no processo, que haja sempre qualidade e não que seja conferida apenas no fim. Ao início quando lhes explico isto acham que sou doido, mas depois pensam sobre o assunto e chegam com ideias realmente boas e dizem que vão trabalhar mais proximamente com os utilizadores.

E há CEO mais relutantes em determinados sectores ou atividades económicas ou têm todos essa postura no princípio?

Há desafios similares por todos os sectores. No meu caso, quando estava no sector público, enquanto CIO numa agência federal dos Estados Unidos, era tudo muito burocrático porque tratava temas de segurança. Talvez 30% do meu tempo seja com clientes de empresas públicas, mas 70% é com todas as indústrias [privadas]: serviços financeiros, utilities… Muitos reguladas. A diferença é na dimensão: grandes empresas, médias empresas ou startups. As grandes empresas tornaram-se grandes porque fizeram algo verdadeiramente bem, certo? Os clientes gostaram do que elas fizeram. Logo, quando se querem transformar têm de deixar de fazer o que faziam, parar esse método, e uma startup está a começar portanto não tem de parar nada.

Na transformação digital, defende uma mudança para um modelo mental baseado em pequenos investimentos e análises frequentes. Como?

A forma antiga de pensar nas Tecnologias da Informação (TI) era: planeias um projeto e o projeto tem X requisitos e depois fazes o projeto todo e no final tens um resultado. O problema é que não tens o resultado até chegares ao fim e isso demora um tempo até chegar lá, portanto todo o teu dinheiro está em risco até lá. Já não é preciso funcionar assim, com toda a tecnologia disponível, as novas técnicas. Podemos focar-nos num desses requisitos, acabá-lo, entregá-los às pessoas para utilizarem, seguir para o seguinte, fazer o mesmo e continuar até ao fim. É muito menos arriscado porque tens os resultados no momento e só depois segues para a etapa seguinte. Trabalhar assim era difícil antes, mas agora temos as ferramentas para isso, o que permite assegurar que estás a gastar o teu dinheiro nas coisas mais importantes todos os dias.

*Mark Schwartz foi CEO, administrador ou responsável de informação na Auctiva, Intrax, Serviço de Cidadania e Imigração dos Estados Unidos e Digitaltown

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