Nuno André - 7 ago. 10:27
Educar antes de proibir
Educar antes de proibir
A magia não se reduz ao ilusionismo, e muito menos à bruxaria. No seu sentido mais lato, conhecer e entender a magia é mergulhar no conhecimento do mundo que nos rodeia.
A palavra proibido parece exercer um certo encanto sobre a maioria dos seres humanos. É o fascínio a razão pela qual Frei João de Santa Anna – conforme explicação do próprio no catálogo da Biblioteca do Palácio de Mafra datado do início do séc. xix – decide colocar apenas a letra P na legenda da estante dos livros proibidos, sem os referir diretamente.
Corria ainda a segunda metade do séc. xviii quando o Papa Bento xiv fez chegar a Portugal um Breve que autorizava a posse e o estudo das obras que constavam do Índice dos Livros Proibidos, contrariando assim as ordens da Inquisição. Com este gesto se percebe a atitude da Igreja que, em vez de reduzir a cinzas aqueles conhecimentos, sentiu a necessidade de os estudar e compreender. Pode ver-se nesta atitude um sinal de inteligência e prudência que contrasta com decisões muitas vezes precipitadas.
A exposição Magia, um olhar sobre um tesouro oculto, patente no Palácio de Mafra, destaca obras de grande valor como Thesouro de Prudentes, cujo prólogo inquietante alerta para o facto de o livro ter sido editado com o fim de que todos dele tirassem proveito, reconhecendo, porém, que só os prudentes o fariam, pois só estes sabem estimar as coisas naquilo que valem.
Não sou eu que o digo, são autores como Gaspar Schott ou Athanasius Kircher, dois investigadores e autores jesuítas do séc. xvii que reclamam para o mundo da magia a técnica, o conhecimento e o fascínio provocado pela ciência, pelas regras da física, da matemática, da química, dos astros… Recorde-se que, por estas alturas, o saber era enciclopédico e por isso se cruzavam facilmente a medicina, a filosofia, a química, a teologia, a matemática, a astrologia e muitas outras áreas.
A luz, outrora encarada como metáfora do conhecimento, é agora o objeto de estudo. A Athanasius Kircher se deve a divulgação de um dos engenhos mais maravilhosos que alguma vez o homem inventou – a lanterna mágica. Com esta lanterna conseguia projetar imagens reais na parede, à semelhança do que hoje fazemos com um projetor – aliás, é ela o primeiro passo para se chegar a ele.
Todos estes investigadores foram ousados nas suas pesquisas porque arriscaram a vida enquanto teorizaram. No final, deixaram obra feita ao marcar o mundo, deixando-o um pouco diferente.
Não se exige que cada um de nós seja um inventor, muito menos que paute a sua vida pela ousadia. Pede-se, no mínimo, que cada um seja capaz de oferecer um pequeno contributo para melhorar o mundo, e um dos maiores contributos que podemos dar à humanidade é um filho. Mas não um filho de qualquer maneira. Um filho educado e preparado para continuar a grande obra.
Para que não seja necessário proibir é essencial educar. Só assim as gerações futuras saberão reconhecer e estimar as coisas naquilo que valem.
Professor e investigador