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Coronavírus: trabalhadores migrantes borrifados com lixívia na Índia

Coronavírus: trabalhadores migrantes borrifados com lixívia na Índia

Milhares de pessoas regressam a casa a pé ou em autocarros sobrelotados, depois do fecho de lojas e fábricas nas grandes cidades. Índia prepara-se para um aumento de casos nas próximas semanas.

Dezenas de trabalhadores indianos que tentavam regressar às suas casas nas zonas rurais do país, em fuga das grandes cidades após o encerramento de lojas e fábricas por causa da pandemia do novo coronavírus, foram alinhados num terminal de autocarros no estado de Uttar Pradesh e borrifados com desinfectante. Uma acção que o governador atribuiu ao “excesso de zelo” e que deixou várias crianças a queixaram-se de ardor nos olhos e vermelhidão na pele.

O caso aconteceu em Bareilly, uma cidade a meio caminho entre Nova Deli e a fronteira do Nepal, com um grupo de 50 migrantes que tinham acabado de regressar a pé da capital indiana e que esperavam fazer o resto da viagem até às suas casas de autocarro.

E ilustra o pesadelo que espera centenas de milhares de migrantes indianos à medida que a pandemia do novo coronavírus vai avançado no segundo país mais populoso do mundo. Sem trabalho na capital e noutros centros urbanos, muitos deles querem regressar a casa, onde se sentem mais protegidos.

“Estávamos sentados, à espera de comida enquanto aguardávamos o autocarro no terminal, quando uns homens vestidos com fatos de protecção começaram a pulverizar-nos”, disse um dos migrantes, Mohd Afzal, à agência de notícias indiana IANS.

“Disseram-nos que faziam parte das equipas de higienização e que estavam a higienizar-nos. As crianças começaram a chorar e as mulheres também ficaram em choque”, disse Afzal.

De acordo com a agência indiana, os migrantes foram borrifados com hipoclorito de sódio diluído, a base das lixívias comerciais.

“O químico tinha um cheiro esquisito e depois do que aconteceu muitos de nós decidimos prosseguir viagem a pé”, disse Afzal, que regressava da cidade de Noida, nos arredores de Nova Deli, para Shahjahanpur, a mais de 300 quilómetros de distância.

O principal responsável do Governo indiano em Bareilly, Nitish Kumar, disse no Twitter que pediu uma punição para os responsáveis e explicou que a equipa de higienização actuou com “excesso de zelo”, já que apenas tinham ordens para desinfectar os autocarros.

Confrontos com a polícia

Num país com um sistema de saúde frágil, e onde milhões de pessoas ainda vivem em pobreza extrema apesar do forte crescimento económico da última década, o regresso a casa dos migrantes que ficam sem trabalho pode acelerar o alastramento do vírus às regiões mais remotas da Índia, e tornar quase impossível o controlo da pandemia entre os seus 1,3 mil milhões de habitantes.

Sem trabalho em Nova Deli e outras grandes cidades, e sem um plano organizado para o regresso a casa, muitos dos trabalhadores migrantes são colocados em quarentena em instalações improvisadas e sobrelotadas, ou em autocarros onde viajam centenas de quilómetros uns colados aos outros.

Em Surate, na costa ocidental da Índia, 300 quilómetros a norte de Bombaim, a polícia usou gás lacrimogéneo para dispersar uma multidão de migrantes indianos que exigiam autorização para regressarem a casa por terem ficado sem trabalho.

“A polícia tentou convencê-los de que isso não seria possível porque os autocarros e os comboios estão parados, mas os trabalhadores recusaram-se a cumprir as ordens e começaram a apedrejar os agentes”, disse à Reuters o comissário adjunto da polícia da cidade, Vidhi Chaudhari.

No dia 24 de Março, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, pôs todo o país debaixo de uma ordem de isolamento até 15 de Abril, na maior operação do género em todo o mundo. Mas poucos acreditam que as restrições vão ser levantadas dentro de duas semanas – segundo as autoridades de saúde do país, a Índia ainda está a semanas de sentir o maior impacto da pandemia.

Desde o anúncio de Modi, no início da semana passada, milhares de trabalhadores migrantes indianos foram vistos a regressar às suas casas a pé, cobrindo distâncias de centenas de quilómetros. Muitos viajam com os seus filhos e durante a caminhada têm pouco acesso a água e comida.

“A situação está a mudar todos os dias e temos novos desafios pela frente, como o facto de as populações migrantes estarem a deslocar-se de um sítio para outro”, disse à agência Reuters S. K. Singh, director do Centro Nacional para o Controlo de Doenças da Índia.

Até esta segunda-feira, há 1071 casos registados e 29 mortes por covid-19 no país. Um número ainda distante do que acontece em países como os Estados Unidos, Itália ou Espanha, mas que pode crescer de forma alarmante nos próximos dias e semanas.

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