expresso.ptexpresso.pt - 30 mar. 15:57

Covid-19. Numa Índia em quarentena, trabalhadores migrantes são agredidos e fumigados pela polícia

Covid-19. Numa Índia em quarentena, trabalhadores migrantes são agredidos e fumigados pela polícia

Ainda não terminou a primeira das três semanas de quarentena decretadas pelo primeiro-ministro indiano e já se acumulam casos de brutalidade policial, de falta de comida e abrigo e até de mortes. “Há relatos de terror vindos das grandes áreas metropolitanas. A maioria dos migrantes já não tem condições financeiras para viver lá por causa da renda e da falta de oportunidades de trabalho. Vários milhares estão presos nas fronteiras estaduais”, conta ao Expresso uma professora de Bombaim

Já é descrita como uma das maiores migrações na história moderna da Índia. Após o anúncio de uma quarentena nacional de 21 dias, centenas de milhares de trabalhadores migrantes iniciaram longas jornadas de regresso a casa – a p��. Com o encerramento súbito de muitos negócios, ficaram sem trabalho nem teto, uma vez que grande parte deles comia e dormia onde trabalhava. Em menos de uma semana, mais de uma dezena destes trabalhadores morreu, revelam os hospitais. A quarentena foi decretada na última terça-feira pelo primeiro-ministro, Narendra Modi, quatro horas antes da sua entrada em vigor.

A medida tem como objetivo conter a propagação do coronavírus e visa toda a população do país, ou seja, 1,3 mil milhões de pessoas, o que equivale a quase um quinto da população mundial. No entanto, os mais afetados são aqueles que se mudaram para as grandes cidades para conseguirem trabalho (e agora se veem privados de abrigo e ganha-pão) e os milhões de indianos que vivem em bairros de lata, onde dezenas de pessoas partilham os mesmos espaços, não havendo quaisquer condições para assegurar o distanciamento social. A quarentena, que inclui uma proibição de viagens interestaduais, deixou a população migrante encalhada nas metrópoles e à mercê da brutalidade policial.

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“Há relatos de terror vindos das grandes áreas metropolitanas. A maioria dos migrantes já não tem condições financeiras para viver lá por causa da renda e da falta de oportunidades de trabalho”, conta ao Expresso a professora Archana Solanki. “Vários milhares estão presos nas fronteiras estaduais em muitas partes da Índia”, acrescenta, a partir de Bombaim, a capital financeira da Índia e do estado de Maharashtra, onde se têm registado os números mais elevados de casos de infeção de covid-19.

“Isto aconteceu hoje”, conta Solanki, partilhando um vídeo que mostra um grupo de migrantes a ser fumigado com uma solução química antes de ser autorizado a entrar na cidade de Bareli.

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“Estas imagens provocaram um enorme furor e denúncias de comportamento desumano das autoridades em relação aos pobres”, diz a professora, que atualmente colabora com a Teach For India. Trata-se de uma organização sem fins lucrativos que recruta licenciados e profissionais de ensino para trabalharem com alunos desfavorecidos. “Com as escolas encerradas, estamos a tratar de tudo por telefone e computador. Os estudantes enviam-nos uma fotografia dos seus trabalhos de casa, nós corrigimo-los e enviamo-los de volta”, explica.

Pacote de ajuda pode não chegar aos que mais precisam

O jornal “The New York Times” escrevia este domingo que “milhares de migrantes em Nova Deli, incluindo famílias inteiras, enfiaram as suas panelas e cobertores em mochilas, alguns equilibrando crianças nos ombros, e caminharam por estradas interestaduais”. “Alguns planeavam caminhar centenas de milhas. Mas, ao chegarem à fronteira de Deli, muitos foram agredidos pela polícia” e obrigados a interromper a marcha, prossegue o diário.

Apesar das ordens do Governo central para permitir o transporte de bens essenciais, como comida e medicamentos, durante a quarentena, muitos vendedores queixam-se que os seus camiões de entregas estão a ser parados pela polícia e as suas lojas obrigadas a fechar. No sábado, milhares saíram às ruas no estado de Querala, no sul do país, alegando que não comiam há vários dias. As forças de segurança exortaram-nos a dispersar para sua própria segurança. No dia seguinte, o Executivo de Modi ordenou que os estados encerrassem as fronteiras e que os migrantes permanecessem onde se encontravam, refere ainda o “Times”.

A Índia, que já tem uma das maiores populações de sem-abrigo do mundo, viu a situação agravar-se nos últimos dias, garantem trabalhadores de organizações não-governamentais. Ao segundo dia de quarentena, o Governo anunciou um pacote no valor de 20 mil milhões de euros para ajudar os milhões de pessoas que ficaram em trabalho. Contudo, ainda não é claro de que forma essa assistência chegará aos que dela mais necessitam. A ajuda pressupõe um registo nas bases de dados nacionais ou uma morada, requisitos que muitos migrantes não cumprem.

Segundo os dados mais recentes, há 1.071 casos confirmados de infeção com coronavírus e 29 mortes na Índia.

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