leitores@sabado.cofina.pt (Sábado) - 12 dez. 07:00
Rosa Grilo, António Joaquim e a defesa dos arguidos
Rosa Grilo, António Joaquim e a defesa dos arguidos
Os factos que se encontram a ser julgados lembram muito os argumentos que vemos nos filmes americanos. Os homicídios em que existe um plano têm fascinado os argumentistas e realizadores da sétima arte. - Opinião , Sábado.
O processo judicial em que Rosa Grilo e António Joaquim foram acusados pela prática de um crime de homicídio qualificado é um dos mais mediáticos do ano de 2019.
Os factos que se encontram a ser julgados lembram muito os argumentos que vemos nos filmes americanos.
Os homicídios em que existe um plano têm fascinado os argumentistas e realizadores da sétima arte.
Para além das centenas ou milhares de filme sobre este tema, há séries televisivas cujo argumento é sempre a prática de um homicídio.
As pessoas têm uma especial curiosidade relativamente aos crimes de sangue.
Nos anos de 2016 a 2018, os homicídios cometidos por Pedro Dias dominaram igualmente os noticiários.
A caça ao homem, a entrega em directo do arguido à Polícia Judiciária perante a RTP, a cobertura do julgamento e os inúmeros directos televisivos, demonstram à evidência o interesse dos espectadores relativamente a este tipo de processo.
Nos processos mediáticos verifica-se que cada vez mais as defesas dos arguidos apresentam um grau de organização e recursos que não existiam no passado.
Na semana passada, o advogado de António Joaquim referiu que a defesa deste último resultou do contributo de uma equipa de 14 pessoas, de diversas especialidades.
É bom lembrar que António Joaquim é um funcionário judicial.
Se neste caso a defesa apresenta esta dimensão e características, como será relativamente aos processos que envolvem Ricardo Salgado, Armando Vara, Manuel Pinho ou outros ex-governantes ou banqueiros?
Se estiverem em causa operações financeiras, quantos pareceres de professores universitários, empresas de auditoria e revisores oficiais de contas irão aparecer?
Quantos advogados integrarão as equipas no tribunal e nos respectivos escritórios para assegurarem as defesas de personalidades conhecidas do mundo da política e da finança?
Para além deste arsenal, importa ter ainda em conta que quando existem vários co-arguidos os mesmos concertam estratégias entre si.
Em alguns processos há um verdadeiro exército a assegurar a defesa dos arguidos.
Quanto a este aspecto nada há a censurar.
A Constituição da República afirma que devem ser assegurados todos os direitos de defesa.
O que importa reflectir é se quem sustenta a acusação em julgamento está num plano igual.
É frequente vermos um único procurador em grandes julgamentos, sem que tenha qualquer apoio durante a audiência ou na rectaguarda.
O Ministério Público tem de repensar a sua intervenção em julgamentos com determinadas características.
Apesar da falta de magistrados, o Ministério Público não pode investir grandes recursos na fase de investigação e facilitar na fase de julgamento, onde tudo se decide.
O Governo anunciou recentemente um reforço de meios no combate à corrupção, bem como a consagração de novos instrumentos legislativos.
A criação de um grupo de trabalho para elaborar a legislação inovadora permite intuir que quanto a esta matéria não veremos resultados a curto prazo.
Por outro lado, no Orçamento de Estado ficaremos já a conhecer qual o reforço das verbas para a investigação criminal.
Há mais de uma década foi publicada uma Lei que estabeleceu a criação de gabinetes de assessoria técnica aos magistrados.
O objectivo destes gabinetes era auxiliarem os juízes e procuradores em áreas técnicas, como as contabilísticas ou financeiras.
Em Janeiro de 2018, a importância destes gabinetes foi reforçada no Pacto da Justiça, mas não se concretizou até hoje.
A criação de uma estratégia integrada de combate à corrupção é uma medida positiva, é importante que não venha só a ficar no papel como aconteceu com outras leis no passado…