www.jornaldenegocios.ptPedro Santana Lopes - 11 dez. 20:20

Os tempos dos Jokers

Os tempos dos Jokers

Quando esse desprezo pelos seres humanos atinge os cuidados de saúde e os serviços de proteção social a que as pessoas têm direito, fica criado o cocktail explosivo para fenómenos do tipo dos coletes amarelos, ou piores. - Opinião , Máxima.

Vale a pena ver o "Joker". É um bom filme de Martin Scorsese e uma interpretação extraordinária de Joaquin Phoenix. É um filme pesado, que reflete consideravelmente o que são as consequências dos lados mais negativos da sociedade em que vivemos.

Não quero contar o filme, mas está ali em causa o que é e pode ser a revolta de muitos seres humanos excluídos pela sociedade. Hoje em dia, com o stress, as pessoas gritam em vez de falarem, correm cheias de pressa, e muitas vezes desprezam o seu semelhante. A sociedade é de facto muito desigualitária, e ao lado de muitas pessoas com uma vida razoável circulam todos os dias pessoas com vidas dramáticas.

Ao fim e ao cabo, é tudo isso que está na origem das explosões sociais que vão acontecendo um pouco por toda a parte e, nomeadamente, em França. Basta ir, hoje em dia, a Paris, mesmo nos Campos Elísios, e constatar como a cidade foi "tomada" por pessoas de todos os credos, de todas as raças, de todas as condições sociais e, naturalmente, de variadas convicções políticas. As urbes europeias, os países, eles próprios, tornam-se verdadeiramente ingovernáveis, porque cada vez mais existe raiva comunitária. A globalização da informação circulando a velocidade estonteante torna acessível a todos o que antes, mesmo sendo ética e legalmente admissível, era, todavia, reservado.

Nos dias de hoje, todas as pessoas sabem quanto ganham, quanto têm e o que fazem os vizinhos, os conhecidos, os desconhecidos, os artistas, os políticos, os empresários, os investigadores, as empresas, os escritórios e ateliês. Não há segredos. Por isso mesmo, quem vive mal, quem vive muito mal, quando toma conhecimento dos níveis de vida dos que vivem melhor, ou dos que vivem mesmo muito bem, indignam-se. E, então, quando esse desprezo pelos seres humanos atinge os cuidados de saúde e os serviços de proteção social a que as pessoas têm direito, fica criado o cocktail explosivo para fenómenos do tipo dos coletes amarelos, ou piores.

Eu sei que o tempo é pouco para o mainstream dedicar muito tempo a assuntos sérios. Aconteceu assim, na campanha eleitoral, e mesmo antes, com os temas da Saúde e da Segurança Social. Houve quem lhes desse prioridade, só que quase ninguém quis saber. Mas, é bom prestar atenção: ou se tomam medidas para corrigir, tão rapidamente quanto possível, esta situação ou, daqui a não muito tempo, alastrará a raiva e a fúria. Quem não tem nada ou quem tem muito pouco irá atrás de quem tem muito, e não haverá Estado com força suficiente para pôr cobro a esses novos fenómenos. Há emergência na questão das alterações climáticas mas também há urgência em matéria de desequilíbrios sociais. Convençam-se disso. 

Advogado

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