sol.sapo.ptFilipe Pinhal - 21 out. 15:05

Salazar não foi um acaso

Salazar não foi um acaso

Salazar não foi um déspota igual aos ‘lá de fora’, porque Portugal não tem dimensão para gerar ditadores.

Por quase quarenta anos, o Doutor Salazar ocupou-se dos destinos do Império, sem contestação que fosse além de um discreto rosnar para o lado, salvo nos escassos grupos oposicionistas, onde havia quem desse o corpo ao manifesto.

O homem de Santa Comba não apreciava os partidos políticos e gostava da censura, mas não era um déspota igual àqueles que ‘havia lá fora’, porque Portugal não tem dimensão para gerar ditadores! Depois, o homem fazia uso dos bens da Nação com parcimónia e surge agora com a auréola de santo, em contraste com a nova praga das democracias: a rapina!

Ordeiro e manso, o povo português deixa-se pastorear por qualquer ‘messias’ que apareça a prometer mais dinheiro ao fim do mês. No século XIX, tivemos caciques que pagavam as chapeladas com um porco a assar no largo da igreja e um pipo de vinho com a torneira aberta. Os sucessores republicanos, nem isso. No geral, eram operários da indústria, empregados do comércio e intelectuais pobretanas, que não tinham para sustentar a família, quanto mais os de fora.

Já a democracia produziu os ‘barões’ que vestiam em Paris e frequentavam SPAs, mas tinham como aspiração máxima serem bem-sucedidos nas intrigas das sedes partidárias.

Cada país tem os déspotas que consegue produzir e os ‘pais da pátria’ que mais se ajustam às colunas dos jornais de referência e aos debates nas televisões, que outorgam títulos de senadores da república, após indecifráveis ‘provas de doutoramento’, prestadas à mesa dos restaurantes da moda. Os títulos são vitalícios, as famílias e os cortesãos dizem-nos homens providenciais e, com tocante modéstia, eles acreditam.

No passado, o acrisolado amor aos cargos fê-los correr riscos que poucos conseguiram evitar: convenceram-se de que eram visionários e infalíveis e, com o tempo, tornaram-se homens sós, arbitrários nas decisões… e insubstituíveis.

Foi assim que ganharam raízes e fundiram na mesma entidade a pessoa e o cargo, abolindo fronteiras entre a esfera pessoal e o domínio patrimonial das organizações administradas, fossem elas a câmara municipal, o clube desportivo, a empresa, o jornal, a universidade, o sindicato ou a corporação de bombeiros: ‘eles é que sabem, eles é que devem estar!’ Quando afastados do cargo, arrogam-se o direito de ensinar… exibindo a obra feita e reclamando a ‘herança moral’.

Semanalmente, vemos exemplos do vício nos treinadores reformados: o seu tempo passou, mas eles empolgam-se quando fazem as equipas, ditam as táticas e, no final dos jogos, imputam as derrotas aos árbitros. Ainda agora, o professor Cavaco Silva veio apontar os erros cometidos no partido que liderou… quando ainda não era político.

Com a proverbial ausência de dúvidas, agora que já é político profissional, falou grosso e sacou do seu joker, no caso da sua joker, para salvar a pátria e o PSD. Ele é que sabe como se faz! Sensato, o Dr. Rui Rio fez o que devia: deixou-o a falar sozinho. O país não deu por nada.

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