www.publico.ptdavid.pontes@publico.pt - 19 set. 06:27

Verdades incómodas e meias verdades

Verdades incómodas e meias verdades

Em frentes diversas, o bispo do Porto e o reitor da Universidade de Coimbra tornaram-se anteontem o centro da polémica e há boas razões para os ouvir e excelentes razões também para tentar perceber aquilo que eles

não disseram. Afinal, os dois debruçaram-se sobre duas das lutas mais importantes do nosso tempo: a condição feminina e os desafios das alterações climáticas.

Numa nota, o bispo do Porto, D. Manuel Linda, revoltou-se contra o facto de as autoridades terem tardado na detenção do suspeito de homicídio da freira Maria Antónia, em São João da Madeira, e atacou também o silêncio dos grupos que normalmente se empenham em denunciar estes casos, nomeadamente as feministas. As críticas não são injustas. Continua a faltar algum sentido de urgência às autoridades nos casos de cariz sexual e é estranho que organizações que se empenham em contabilizar as vítimas de violência de género se tenham esquecido de um caso tão marcante como o da freira.

Mas a preocupação do bispo em criticar os deputados que considera “radicais”, os organismos que dizem “defender os direitos humanos”, ou as feministas, tem também inerente o incómodo que muitos deles continuam a provocar numa Igreja que, sejamos justos também, contribuiu durante séculos para a secundarização da mulher e que ainda faz menos do que devia para que ela tenha igualdade de direitos e oportunidades.

Grande incómodo despertou o reitor Amílcar Falcão, ao anunciar no arranque do ano que as cantinas da Universidade de Coimbra iam deixar de servir carne de vaca. Note-se que o anúncio não era que se ia deixar de servir carne, mas a de integrar a vaca na ementa, espécie cuja criação alguns estudos mostram ser a mais prejudicial para o ambiente.

Não faltou quem falasse de proibição, de fundamentalismo, de alarmismo para classificar a opção do reitor. Percebe-se a revolta dos produtores, mas muitos dos indignados que, nas redes sociais não demoraram a partilhar imagens proteicas, deviam levantar os olhos do prato e perceber que só poderemos ganhar a corrida para salvar o planeta se alterarmos profundamente alguns dos nossos hábitos.

Da universidade espera-se o exemplo e por isso faz bem o reitor em enunciar esta medida com o seu quê de simbólico. Mas fará mal se ela não vier seguida de um empenho mais alargado e contínuo na diminuição do impacto ambiental da sua instituição. Tal como os partidos que se apressaram a colocar o ambiente como uma das prioridades nos programas para as legislativas, todos têm de perceber que os tempos já não estão para populismos. Não serão perdoados.

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