visao.sapo.ptvisao.sapo.pt - 15 set. 07:00

Saltar muros, salvar pessoas, no novo filme Nanni Moretti

Saltar muros, salvar pessoas, no novo filme Nanni Moretti

Os tenebrosos anos da ditadura de Pinochet, com a perspetiva dos refugiados chilenos em Itália. O documentário de Nanni Moretti, Santiago, Itália, já se estreou nos cinemas

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Há uma cena em que Nanni Moretti entrevista, na prisão, um dos poucos militares condenados no Chile por tortura e abuso de poder no tempo da ditadura de Pinochet. O militar vai-se justificando, como se falasse de uma situação de guerra e houvesse dois lados, cada um com os seus excessos. Às tantas, diz: “Aceitei falar consigo porque me disseram que ia ser uma entrevista imparcial.” Moretti responde: “Eu não sou imparcial!” Esta é a chave ética do filme e também um princípio jornalístico. Não há imparcialidade quando se ouve um assassino, um violador ou um torturador; em casos extremos, há um dever moral de tomar, implícita ou explicitamente, partido. Moretti, que talvez tivesse a secreta e ingénua esperança de encontrar traços de redenção do agressor e fica pacientemente perplexo perante a persistência boçal, tem a hombridade de lhe dizer (e nos dizer) isso na cara.

Santiago, Itália, o documentário de Nanni Moretti, é justamente feito do lado das vítimas. Conta-nos as histórias e o sofrimento de uma das mais atrozes ditaduras da América Latina. Começa, claro, em Allende, na esperança democrática e progressista, prontamente minada pelos grandes interesses, ao ponto de ser deposto e morto num golpe de Estado, fomentado, entre outros países, pelos EUA. Aos momentos de festiva liberdade dos tempos de Allende contrapôs-se o regime de sinistra crueldade de Pinochet, que perseguiu de forma obsessiva todos aqueles que apoiavam o deposto Presidente.

A Embaixada de Itália, uma das poucas que mantiveram as portas abertas em Santiago, serviu de asilo para cerca de 750 refugiados, que saltavam clandestinamente o muro em busca de abrigo. Moretti conta, essencialmente, as histórias dos refugiados chilenos, que se estabeleceram em Itália à espera da queda do regime. Santiago, Itália é um Moretti atípico, puro documentário, em que o realizador assume uma espécie de missão, um serviço público, contra o esquecimento da História. Ao enaltecer o papel de Itália durante a ditadura chilena, quando o país se tornou um porto de abrigo, Moretti faz implicitamente um contraponto com o radicalismo do ex-ministro Salvini, perante a crise do Mediterrâneo.

Veja o trailer do filme:

Santiago, Itália > De Nanni Moretti, documentário > 80 minutos

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