sol.sapo.ptsol.sapo.pt - 23 jul. 13:40

Nuno Magalhães: ‘Não faz parte dos meus planos avançar para a liderança do CDS’

Nuno Magalhães: ‘Não faz parte dos meus planos avançar para a liderança do CDS’

O líder parlamentar do CDS deixa o lugar em outubro. Nas legislativas, admite que uma maioria de centro direita não é provável, mas afasta-se de cenários de sucessão no partido.

Vai deixar a liderança da bancada.Porquê? Está cansado?

É uma decisão que nada tem que ver com cansaço, falta de gosto ou para dedicar mais tempo à família. Prende-se com uma simples razão:  oito anos depois e duas legislaturas - uma a apoiar o Governo e outra na oposição - com dois presidentes diferentes, está na altura de dar o lugar a outros. E, felizmente, o CDS tem muitas pessoas com capacidade para ser presidente do grupo parlamentar. 


Qual foi o pior momento dos oito anos que foi líder da bancada?

Os primeiros dois anos do Governo de Passos Coelho, entre 2011 e 2013, foram momentos muito difíceis. Até porque temos família, amigos, vizinhos, pessoas que conhecemos, temos vida e tomámos medidas até contra nós próprios que também nos prejudicaram. Não estou a dizer que fomos os mais prejudicados porque infelizmente houve pessoas bem mais prejudicada.

Perdeu amigos?

Não. Felizmente tenho bons amigos. Mas ninguém gosta de tomar medidas impopulares. 



Quais foram as principais dificuldades para fazer oposição num partido que tem 18 deputados?

Combater a máquina de propaganda do PS, a capacidade de desinformação em relação às medidas do PS ou a capacidade que o PS tem em rejeitar as propostas do CDS. Dou o exemplo da natalidade, que passado um ano apresenta como suas, iguaizinhas, às [propostas do CDS] no programa eleitoral. Por isso, disse a António Costa que era ótimo a anunciar, péssimo a executar e excelente a roubar ideias. Porque rejeita no Parlamento as ideias quando vêm da oposição e, depois, passado um tempo, torna-as suas. 

O PS plagiou as vossas ideias?

No caso da demografia, arriscar-me-ia a dizer que foi um plágio.  É evidente que ninguém descobriu a roda. Não é tanto isso que critico. O que não acho normal é rejeitar e votar-se contra as propostas e passado um ano apresentar essas mesmas propostas como suas.  É um pouco tornar tudo isto numa farsa. E o PS faz isto com uma eficácia que pouca gente repara. Esse truque político foi pouco publicado e transmitido . 


O CDS andou sozinho na oposição?

O CDS andou muito tempo sozinho a denunciar o que estava a acontecer na Saúde, com as consultas e as cirurgias por realizar e as situações de rutura nos hospitais. Andámos muito tempo sozinhos. Depois fomos sendo cada vez mais acompanhados por partidos que à 2ª feira dizem uma coisa e na 6ª feira votam noutra. 


Só na Saúde?

Continuamos também sozinhos a denunciar o estado de rutura em que estão as forças de segurança, que não têm dinheiro para ter veículos. Também andámos sozinhos quando denunciámos o que estava a acontecer com os transportes, nomeadamente com a ferrovia e com a travessia do Tejo. Denunciámos que o que se passou em Tancos foi uma vergonha e merecia ser objeto de uma comissão de inquérito. Estivemos sozinhos também nos incêndios e numa moção de censura que apresentámos.


O PSD depois acompanhou-vos…

Pois acompanhou, com certeza. Mas perguntou se nos sentimos muitas vezes sozinhos. Sim, sentimo-nos muitas vezes sozinhos. 


O PSD não esteve à altura do CDS?

O adversário do CDS é a esquerda e o PS em particular. E tenho o PSD como um partido amigo do CDS, com quem nos entendemos naturalmente e não precisamos  de fazer teatros. Não me verá a fazer nenhum comentário sobre o PSD. É um partido que respeito e com o qual o CDS deve ter boas relações. E quero dizer aos portugueses que, se nos derem a responsabilidade de uma maioria, não tenho a menor dúvida de que teremos uma coligação oficial. Temos uma foto. Não teremos uma espécie de farsa em que temos partidos que vão a manifestações contra medidas do Governo que apoiam. Isso não teremos. 

Tendo em conta os resultados das sondagens, o CDS pode sonhar com a maioria?

Não é uma questão de sonho. Se me pergunta: ‘Acha que isso é provável?’ Não é. ‘Se é possível?’ Acho que ainda é, vamos ver. Não será fácil.

O resultado das europeias foi um choque para si?

O resultado das europeias não foi um choque. Foi, seguramente, inesperado e uma desilusão. Mas, se quiser, utilize a palavra choque. Ninguém estava à espera daquele resultado. Mas é preciso não esquecer que 70% das pessoas não foram votar. É bom que quem ganhou tenha a humildade de perceber que ganhou com cerca de 30% dos 30% que votaram, o que também não é propriamente um resultado extraordinário. 


A questão dos professores teve consequências?

Não sei se teve só que ver com a questão dos professores. Terá tido a sua influência, houve eleitorado que não percebeu. A presidente do partido já disse que o CDS não foi capaz de comunicar bem a sua posição. 


Quando votaram o diploma dos professores na AR não se apercebeu que vinha aí uma crise?

Se me tivesse apercebido não teríamos votado da maneira como votámos.


Quando se aperceberam da crise? 

Apercebi-me que havia algo de encenação a partir do momento em que no final da tarde há a votação e passado uma hora surge essa encenação da parte de António Costa.  


Sobre o futuro, vai cumprir o mandato como deputado até ao fim? 

O meu futuro é fazer campanha em Setúbal e ser deputado até ao fim se as pessoas me derem mais essa honra. Com menos funções na liderança da bancada mas com mais atenção para o distrito. É uma coisa de que sinto falta, mais trabalho de comissão, porque um líder parlamentar sabe tudo, mas não põe a mão na massa. Usando uma imagem futebolística, sinto falta de jogar. Não vou nem para o banco, nem para a bancada, nem para fora do estádio. 


Qual é a meta do CDS para as legislativas? 20 deputados? 

A presidente do partido já disse que o objetivo é crescer.


Não quer quantificar? 

Nunca quantifiquei votos nem deputados.


Se o CDS conseguir pouco mais de dez mandatos, contra os atuais dezoito, a líder do CDS fica em xeque?

Estou focado em que o CDS tenha muito mais do que isso, tenha pelo menos aquilo que neste momento tem. Depois veremos. Não devemos perder tempo, nem energias a fazer cenários. 


O que será uma derrota para o CDS? 

Não gosto de entrar para uma campanha eleitoral a pensar em derrotas. Não penso  nisso e nem consigo quantificar. O CDS tem de perceber de onde partiu, que dos resultados das europeias e não das sondagens, e o que tem. 


Se a líder do CDS pusesse o lugar à disposição, avançava?

Diz-me a experiencia política que não devo dizer nada de irrevogável. Mas isso não faz parte dos meus planos. Não só porque não acredito que isso se coloque, mas porque tenho outro tipo de horizontes e objetivos.  Acredito que o CDS vai ter um bom resultado, e acredito que a presidente do CDS é a melhor que o CDS pode ter e vai continuar.


As derrotas tiram-lhe o sono?

Não. O que me tira o sono é pensar que não estou a fazer tudo para ter uma vitória. As derrotas nunca me tiram o sono. 


Fazer uma coligação pós-eleitoral com o PSD de Rui Rio é diferente de fazer uma  coligação com o partido de Passos Coelho? 

Sim. Este PSD é diferente porque o CDS pura e simplesmente não admite uma coligação com o PS de António Costa e este PSD admite.


Mas isso não retira espaço ao discurso de uma maioria de centro-direita?

Não sei se retira. Tenho o dever de respeitar a tática do PSD, porque também não gosto que façam isso ao meu partido. Mais uma vez saberemos fazer das divergências, convergências.


O CDS mudou o tom do discurso depois das europeias?  

Não. O CDS sempre foi uma oposição crítica, aguerrida. 


Assunção Cristas atirou a toalha ao chão quando mudou de registo?

Com certeza que não, nem tem motivos para isso. Com a pré-campanha para as legislativas é natural que a presidente do partido fale daquilo que as pessoas mais querem ouvir. E é o quê? O que o CDS vai fazer, o que o CDS pensa em termos de impostos, em termos de Saúde ou em termos de Segurança.


Há alguma guerra entre o PSD e o CDS sobre quem baixa mais os impostos?

Da parte do CDS não, por dois motivos: primeiro, já tínhamos dito há bastante tempo que a prioridade seria a baixa de impostos, segundo, o CDS faz uma coisa diferente do PSD, ao não fazer um cenário macroeconómico.


O CDS usa os dados programa de estabilidade.

Usamos aquilo que o Governo apresentou em Bruxelas e que  aceitou como bom que iria acontecer. Não somos nós que fazemos as contas, não estamos a ser otimistas, nem pessimistas. Se quer que lhe diga até, estou convencido que seria possível ter ido mais longe. Mas não optámos por isso. 


A vossa proposta é mais realista do que a versão do PSD?

Mal seria se não pensasse assim. A nossa é segura e certa. Não conheço como é que o PSD chegou a esses números. Há uma coisa que sei por experiência própria. Quem está no Governo é quem realmente conhece os números no seu rigor. Com isto não estou a criticar a proposta do PSD. São caminhos diferentes, opções diferentes. A nossa foi esta: não perder um segundo a discutir com António Costa se o cenário macroeconómico do CDS está bem ou se está mal. O CDS já foi o partido do contribuinte…Nunca deixou de ser. Infelizmente as circunstâncias em que governou com a troika deixou de exercê-lo de forma tão efetiva, não porque não queria, mas porque não podia.


Qual é a mensagem do programa eleitoral do CDS?

A mensagem é simples: ter soluções concretas para os problemas reais de pessoas reais. Esta maioria de Governo pensa e espera resolver problemas com ideologia. Nós preferimos tentar resolver problemas com propostas concretas, focadas para melhorar a vida das pessoas. É essa a mensagem que o CDS deve passar.


Nas Europeias, o CDS usou muita ideologia e perdeu.

Também. Mas são eleições diferentes em momentos diferentes para contextos diferentes. O Parlamento Europeu não é a Assembleia da República e creio que essa deve ser a mensagem do CDS. E isso até é algo injusto porque, na verdade, todos os dias Nuno Melo tinha uma medida para a Europa e assisti porque participei na campanha eleitoral. Mas não foi culpa de Nuno Melo. Foi responsabilidade de todos. Todos os candidatos digladiavam-se entre si. Mas não foi isso que passou, já fizemos a análise e retirámos as conclusões desse resultado, vamos partir para outra.


No rescaldo as europeias, o Presidente da República tocou num ponto que causou alguma irritação, ao antever uma crise na direita nos próximos anos. De quem será a culpa? Do PSD ou do CDS?

Na sequência dessas declarações, aquilo que dissemos ao Presidente da República, quando nos recebeu,  é que o CDS estaria e estará a fazer tudo, com estas propostas, para que isso não aconteça. E estou convencido de que isso não vai acontecer.


O CDS já assumiu que, se Marcelo Rebelo de Sousa concorrer a novo mandato, o apoiará. Essa posição foi tomada cedo demais?

Penso que não. Se o CDS apoiou na primeira volta uma personalidade que granjeou, durante o mandato, o apoio da esmagadora maioria dos portugueses e, se essa personalidade quiser voltar a candidatar-se, não vejo nenhuma razão, nenhum motivo razoável ou  lógico para que o CDS não o apoie. Foi um bom mandato, posso concordar mais ou concordar menos, com esta ou com aquela intervenção, com esta ou aquela medida..


Com qual não concordou?

Não vou dizer por uma questão de respeito institucional. 


Regressando aos resultados das legislativas. As sondagens dão um grande avanço ao PS.  Receia que o PS tenha maioria absoluta?

Creio que seria péssimo para o país. Já vimos no que dão maiorias absolutas. As sondagens são o que são. Dou muito pouco crédito às sondagens. Os portugueses irão ter tempo para fazer uma análise profunda nos meses que faltam para as eleições, mas alerto para o risco muito grande para o país que o PS tivesse maioria absoluta. Estou concentrado para que o CDS tenha o melhor resultado possível para que contribua para uma maioria de centro-direita e não do PS e de esquerda.


Onde caiba o PSD e o Aliança?

Onde caiba, seguramente, o PSD e outros partidos, nomeadamente o Aliança.


Fecharia a porta a algum partido para formar uma coligação de centro-direita? 

A um. O CDS já rompeu com uma coligação autárquica por força de determinado tipo de ideias com as quais não se revê.


Está a falar do CHEGA, de André Ventura?

Estou.


André Ventura não teria lugar numa coligação com o CDS?

Se o CDS rompeu uma coligação pré-eleitoral, em Loures, por força de não se rever em determinado tipo de ideias, parece-me que será muito complicado. Não é uma matéria que tenha sido discutida, e nem acho que vá ser. Não vai ser preciso.


Acha que o CHEGA vai conseguir eleger algum deputado?

Tenho que respeitar a vontade popular.


Para o CDS, o CHEGA é de extrema-direita?

Não vou qualificar. Se quer a minha opinião pessoal, o CHEGA tem coisas com as quais concordo e tem outras com as quais discordo frontalmente. Tem também coisas que penso que nem são exequíveis e até um pouco tontas.


Quais? 

Não vou estar a qualificar, acho deselegante.   


O CHEGA tem manifestado uma vontade de aproximação ao VOX de Espanha. E Nuno Melo chegou a dizer que o VOX não era um partido de extrema-direita...

O que Nuno Melo disse é que, em Portugal, há uma dualidade de critérios entre partidos que são extremistas à esquerda e que não são de extrema-esquerda, e entre partidos que são extremistas à direita e que são logo qualificados de extrema-direita. Foi isso que Nuno Melo disse e concordo. Porque é que continuamos a considerar o Podemos, que é um partido semelhante ao Bloco de Esquerda, como um partido de centro-esquerda, e rotulamos logo o VOX como um partido de extrema-direita? Por isso é que não qualifico o CHEGA. Porque não conheço bem as suas ideias e programa eleitoral. Penso que o país não conhece mais do que duas ou três ideias do CHEGA. É me difícil rotular um partido cuja a única coisa que sei são a castração química para pedófilos, a pena de morte, a redução do número de deputados. Não concordo com nenhuma.


São essas ideias que considera tontas?

Dessas três algumas são tontas, outras merecem o meu frontal desacordo. Mas há um alerta do CHEGA que percebo e há muitos anos que defendo: a defesa das Forças de Segurança. Isso percebo, agora, é muito poucochinho para se poder ter qualquer tipo de entendimento. Até porque as outras três discordâncias de fundo são discordâncias civilizacionais.


As forças de segurança são um tema que acompanhou ao longo dos anos. Que avaliação faz do atual ministro da Administração Interna?

Pior do que mau. Penso que o ministro Eduardo Cabrita é inexistente. Quem manda em quase todos os Ministérios, mas sobretudo na Administração Interna, é  Mário Centeno, que, manifestamente, não gosta das Forças de Segurança e dos polícias. E vimos que o ministro Eduardo Cabrita não tem a mais pequena força para resolver, já não digo um problema, mas metade de um problema que tenha que ver com polícias. E há problemas que não custam dinheiro.


Tais como?

Tais como a dignificação das polícias, tais como quando há um polícia agredido, ou quando há uma acusação disto ou daquilo, que generalizada e genérica para toda a Polícia. O que é que o ministro da Administração Interna faz? Defende a Polícia? Não. Defende quem acusa a Polícia.


Está a falar das acusações de racismo?

Estou a falar de acusações de racismo. É uma generalização inaceitável. O ministro da Administração Interna  deveria ser o primeiro a vir dar uma resposta firme e dizer: eu confio na polícia. Esta é a minha polícia. E mais uma vez o PS demonstra - até -  desprezo para com as forças de segurança. É  mais um Governo em que isso acontece, e que a mim me choca. As Forças de Segurança  são pilares essenciais do Estado de Direito Democrático, pilares essenciais de uma sociedade. Se há comportamentos racistas, e há seguramente dentro da polícia como dentro de todos os setores de atividade, que sejam punidos. Agora, não aceito  generalizações . E o ministro da Administração Interna, por omissão, pelo silêncio, ou até por condescendência, aceitou isso. Acho isso inadmissível. Lá está, como lhe dizia , aqui o impacto orçamental é zero.


Mas isso não significa que não haja racismo na Polícia.

Claro que não.  A polícia portuguesa, conheço-os bem, há muito tempo, não é racista. Na Polícia, como noutros setores de atividade, haverá seguramente pessoas, que nesta ou naquela vez, tenham tido comportamentos racistas. Esses devem ser punidos. Agora não se pode fazer é uma generalização. E não se pode ser conivente com essa generalização.

Disse no início da entrevista que Tancos foi uma vergonha. Que responsabilização devia ser atribuída ao primeiro-ministro?  

Custa-me acreditar que o primeiro-ministro tenha dito, como disse, e reiterou há poucos dias, que tinha total confiança no ex-ministro da Defesa e que o tinha procurado inquirir. Ficámos a saber que houve um hiato de tempo em que realmente custa a acreditar que o primeiro-ministro nunca tivesse, pelo menos, a ideia, a tentação de fazer um determinado tipo de perguntas ao ministro da Defesa. António Costa também é responsável politicamente sobre o que se passou em Tancos. Mais que não seja pela omissão, mais que não seja pelo que deveria ter feito e não fez.


Uma última pergunta, algo desgarrada, mas que não posso deixar de colocar: Paulo Portas deixou a atividade política mas vê-o a regressar em 2026 como candidato presidencial?

Vejo o Dr. Paulo Portas muito feliz com o que está a fazer. É raro nos encontrarmos, mas quando nos encontramos falamos de várias coisas e  não muito sobre política.  O que eu posso dizer-lhe é que Paulo Portas é um extraordinário político, com uma capacidade extraordinária, capaz de desempenhar qualquer lugar.


Inclusive Presidente da República?

Com certeza, mas depende dele.

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