www.publico.ptpublico.pt - 22 jul. 20:03

Mercado negro, gangues e clima de medo: o “preocupante” retrato da (in)segurança no Porto

Mercado negro, gangues e clima de medo: o “preocupante” retrato da (in)segurança no Porto

Executivo de Rui Moreira e CDU fizeram propostas para combater insegurança causada pelo tráfico de droga. Fim do bairro do Aleixo alastrou problema. Câmara lamenta falta de meios da PSP e pede mais poderes para esta força policial

A visita foi informal, mas Rui Moreira tornou-a pública, na reunião de câmara desta segunda-feira, para ilustrar aquilo que considera ser um retrato “preocupante” da falta de segurança na cidade - uma realidade já confirmada ao seu executivo tanto pela Polícia Municipal como pela Polícia de Segurança Pública e a Polícia Judiciária. Este domingo, o presidente da câmara deu um passeio junto ao bairro Pinheiro Torres, em Lordelo do Ouro, e viu “tráfico a partir das janelas dos automóveis”. À luz do dia e sem qualquer pudor: “Só não me ofereceram droga porque viram que era o presidente da câmara, mas não os incomodou minimamente.” As descrições não se ficam pela venda descarada. Pior do que isso, considera, é o clima de medo que parece ter tomado conta de algumas zonas da cidade e particularmente de alguns bairros camarários: “Temos tido relatos de pessoas que têm medo de sair de casa e quase de ir à janela, dizendo que os bairros foram controlados por gangues”, disse. “Há cidadãos que se sentem sequestrados nas suas casas ou fora das suas casas. Quase expulsos dos bairros. Não por serem despejados por nós, mas por serem despejados pelos vizinhos.”

As palavras foram contundentes. Neste momento, afirmou Rui Moreira, o Porto tem territórios “debaixo de ameaça”, subjugados a um “poder alternativo”. Há, “nalguns sítios, um supermercado de droga instalado” e a situação junto ao Fluvial é “terrível”. O “mercado negro” ganhou “condições ideais” para funcionar”, estando a distribuição “praticamente assegurada através de uma descriminalização”. Foi por tudo isto – e pela convicção de que a garantia de segurança pública é um dever do Estado e não local – que o executivo de Rui Moreira levou a votação na reunião camarária um conjunto de recomendações a fazer ao governo de António Costa.

Para a PSP poder actuar, acredita, não basta ter mais meios (embora também isso seja essencial: já lá vamos). É preciso que tenha mais poderes. Por isso, propôs Rui Moreira, recebendo votos favoráveis do PSD e abstenções do PS e da CDU, é preciso que se “aprovem todas as medidas legislativas que possam dar às autoridades policiais competentes maior segurança jurídica para actuarem em situações de tráfico e de consumo de produtos estupefacientes susceptíveis de pôr em causa a tranquilidade, segurança e bem-estar das populações”.

Sublinhando ser favorável à descriminalização, Rui Moreira considerou haver algumas incongruências na forma como este assunto é encarado. Consumir “debaixo de telha”? Sim. Consumir “na via pública à vista das crianças e à porta das escolas”? “Entendo que não. Há limites para tudo.” A actual lei, considerou, protege em demasia os consumos e põe em risco a cidadania. “O espaço público não pode ser apropriado por gangues nem pelo mercado negro”, anuiu o presidente da câmara, propondo um meio-termo: “Não propomos recriminalizar, mas dizer que há locais na via pública onde o consumo não pode ser tolerado.”

Manuel Pizarro pediu a palavra para sublinhar a complexidade do problema - que nenhum Estado do mundo conseguiu ainda resolver - e lembrar que “a descriminalização não é uma autorização para o consumo”. E há mais: “Se achamos que o toxicodependente tem uma doença não podemos dizer ao mesmo tempo que ele é um criminoso”, disse o socialista, trazendo ao debate o “elefante dentro da sala” chamado bairro do Aleixo: “Era evidente que o desaparecimento do bairro ia conduzir à metastização do problema.” Álvaro Almeida, do PSD, concordou que o Aleixo “isolava o problema” e o fim do bairro significou um crescimento da visibilidade da droga: “Há um problema de segurança sério na cidade. E uma necessidade de acção policial. É preciso criar a sensação de segurança que se perdeu.”

Para dotar a PSP de mais meios – algo também recomendado nas propostas enviadas pelo executivo de Moreira -, a autarquia já fez a sua parte. Com votos favoráveis da oposição, aprovou a cedência a esta força policial de dez viaturas da Polícia Municipal. O contacto com o Ministério da Administração Interna tem sido constante e Rui Moreira já propôs até o “policiamento gratificado”, com dinheiro camarário, “em zonas particularmente sensíveis”. Uma ideia acolhida prontamente e que para o autarca é um reconhecimento, por parte do ministério, da falta de recursos da PSP. “A percepção de segurança está em queda. E isso é uma responsabilidade do Estado.” Ainda que a nível local também haja dois programas no terreno, “é claramente preciso mais”, admitiu.

O programa de emergência social apresentado pela CDU – aprovado por unanimidade – relata um problema em crescimento que “atingiu níveis elevados de alarme social”. Para isso, dizem os comunistas, “contribuíram muitos anos de abandono de intervenção pública estruturada” em bairros, locais onde notam falta de intervenção social.

Recusando que este seja essencialmente um “problema de polícia”, Ilda Figueiredo propôs “informar o governo da gravidade da situação e propor a criação urgente de um programa integrado de intervenção nas zonas de forte concentração de bairros municipais e do IRHU”. Como se combate o problema? Com “policiamento de proximidade”, mas também formando “equipas multidisciplinares” que promovam a “integração e inclusão através do diálogo social com as populações e colectividades existentes, com propostas de animação cultural e desportiva, de educação social e cultural”.

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