expresso.ptexpresso.pt - 22 jul. 20:57

“Plano”: uma palavra-chave para acabar com incêndios demolidores (porque incêndios “haverá sempre”)

“Plano”: uma palavra-chave para acabar com incêndios demolidores (porque incêndios “haverá sempre”)

Os incêndios nunca vão acabar mas não têm de ser estes incêndios que assustam, destroem ou às vezes até matam: Rui Barreira, diretor de Conservação da World Wide Fund for Nature (WWF), deixa um recado aos políticos e insiste numa palavra: “ plano”. Qual plano? Ele propõe um

Arde todos os anos em Portugal uma área que é, em média, duas vezes superior à dos restantes países da Europa. Segundo o um estudo da World Wide Fund for Nature (WWF), esse valor traduziu-se em 2017 em 140.000 hectares, cinco vezes mais do que a média na última década. As alterações climáticas aparecem em destaque no relatório como causa dos “superfogos”, entre os quais se inclui o de Pedrógão Grande, uma memória difícil de apagar entre os portugueses. Isso quer dizer que, a partir de agora, todos os anos vamos ter de lidar com fogos incontroláveis, capazes de tornar montanhas de verde em pó e cinza, capazes de apagar do mapa aldeias inteiras?

“Vai ser sempre assim, sim, a menos que se façam as mudanças de fundo que os ciclos políticos têm impedido”, diz ao Expresso Rui Barreira, diretor de Conservação da WWF Portugal, quando questionado sobre a inevitabilidade (ou não) de que as imagens de enormes labaredas a rodear as aldeias do interior se tornem a companhia indesejada mas permanente do verão português.

“O grande foco do investimento tem sido o combate - naturalmente, já que depois de 2017 reparámos que os dispositivos de combate não estavam preparados. Só que a única coisa que pode mesmo pôr um travão ao número de incêndios é um plano para a nossa floresta e os ciclos políticos não se coadunam com os planos a longo prazo, não há compromissos transversais a todos os partidos para uma política integrada”, considera o especialista.

Portugal é o país europeu mais afetado por fogos florestais. Nos últimos 30 anos, tornou-se o país com o maior número de ocorrências por área e onde os fogos cobrem as maiores áreas. Espanha é o país que se segue na lista mas, mesmo assim, Portugal segue a uma distância de mais 30% de ocorrências, com uma área ardida que é 20% superior à registada aqui ao lado. Apenas nos últimos dois anos, 225 pessoas morreram na Grécia, Espanha e Portugal por culpa do fogo descontrolado; 114 delas portuguesas. Portugal é o país da Europa com mais massa florestal perdida desde o início do século XXI, quarto em todo mundo. E os grandes problemas estão a norte do rio Tejo, tal como em Espanha (sendo as Astúrias e a Galiza parte de um noroeste ibérico extremamente vulnerável). Segundo os números divulgados pelo estudo, dos 16.982 pedidos de socorro da população portuguesa, 94% registaram-se a norte do Tejo.

Para que a situação se torne menos grave - “parar não vai parar porque haverá sempre incêndios” -, as populações “têm de começar a ver a floresta como fonte de riqueza”, explica Barreira. Muitos terrenos estão abandonados ou então os seus proprietários “usam-nos para ir buscar um dinheiro extra para as férias ou para o casamento dos filhos, coisa que facilmente se consegue vendendo alguma madeira”. Esta forma de exploração sazonal ou mesmo esporádica “não fixa ninguém nestes terrenos” e é o abandono que provoca outros problemas como a falta de limpeza dos terrenos ou a proliferação de espécies mais propícias a pegar fogo.

É um problema para o qual há sempre uma desculpa e nem sempre uma solução: investe-se pouco porque há demasiado risco de incêndio e há demasiado risco de incêndio porque se investe pouco. “Em primeiro lugar devemos promover o desenho de um mosaico florestal mais resistente ao fogo, não pode ser só monocultura, manchas contínuas de floresta. Só fazendo da floresta um negócio muito lucrativo é que as pessoas começam a interessar-se por ela”, diz Barreira, que oferece algumas ideias. “Há uma indústria óbvia que é da extração de madeira mas também há a da extração de resina para tintas ou medicamentos, há a possibilidade de formar empresas de limpeza da floresta e há as centrais de biomassa que deveriam ser de proximidade. Se uma pessoa puder vender o que limpa do seu terreno à central local, se calhar isso é um incentivo para limpar.”

Além de toda a prevenção, é também ao nível da implementação da lei que se deve trabalhar. “Em Portugal 99% dos casos de incêndio têm mão criminosa, no resto dos países do Sul da Europa são 96%, são números brutais, é preciso que se criminalize a sério este crime, tal como é preciso que os proprietários que não limpas as terras sejam penalizados por isso; os que o fazem podiam ter por exemplo, uma redução nos impostos”, diz Barreira.

A consciencialização dos perigos do fogo é, para o diretor de Conservação da WWF, a nota positiva de um problema trágico. “Há uma consciencialização dos riscos do fogo, por causa de todas as mortes e desastres que alertaram muita gente; há mais campanhas quanto ao risco de queimadas e etc, o que é positivo; há um investimento na formação das pessoas para as preparar para incêndios, tudo isso são passos na direção certa.” Os aviões são importantes “nas intervenções rápidas” e também porque “descansam as populações”, mas “a única forma de combater verdadeiramente os incêndios é prevenindo-os”.

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