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Mais de um quinto dos benefícios fiscais não tem objetivo definido

Mais de um quinto dos benefícios fiscais não tem objetivo definido

Governo quer poupar 90 milhões por ano até 2022. Grupo de trabalho recomenda extinguir ou reclassificar casos onde não há fins claros nos apoios.

Opacos, dispersos, e sem escrutínio. Há mais de meio milhar de benefícios de fiscais e em pelo menos 127 deles, ou mais de um quinto, não se descortinam objetivos económicos ou sociais que os justifiquem. A conclusão é de um grupo de 12 especialistas nomeado no ano passado pelo governo para apoiar a revisão dos 542 itens espalhados por mais de 60 diplomas que este ano se prevê que gerem uma despesa fiscal de 11,7 mil milhões de euros.

O grupo pede a criação de uma unidade técnica de acompanhamento dos benefícios fiscais que realize avaliações a cada cinco anos, e que poderá ficar sob controlo da Assembleia da República à semelhança da Unidade Técnica de Apoio Orçamental.

Além disso, cada novo benefício deve ter na sua origem uma avaliação que defina objetivos e ser monitorizado anualmente quanto à sua evolução, de acordo com uma grelha comum. Os prazos em que vigoram os benefícios devem também ser claros, com revogações e prorrogações explícitas.

O relatório final deste grupo de trabalho é apresentado esta segunda-feira na Universidade Católica do Porto. Face à proliferação de isenções, deduções e reduções de imposto, admite que há ��um aparentemente facilitismo na criação dos mesmos”. E diz que a falta de clareza quanto aos fins procurados devem levar a que o governo considere extingui-los ou deixe de os considerar efetivamente benefícios fiscais.

Trata-se da terceira avaliação aos benefícios fiscais existentes em Portugal – a última data de 2005 – e acontece com o governo a contar com um cenário de 90 milhões de poupanças na despesa fiscal já a partir de 2020 com a revisão. O estudo não recomenda a extinção de nenhum benefício em particular, mas admite que em vários casos não é possível saber sequer que despesa geram e quantos contribuintes beneficiam – 80% dos benefícios em IRS e mais de 50% em IRC. Sucede, por exemplo, com os benefícios às conta-poupança reformados, analisadas no documento.

Noutros casos, provavelmente, seria mais eficaz considerar a realização de despesa direta, defende-se. É o que se aponta, por exemplo, para os benefícios fiscais concedidos a portadores de deficiência, que veem agora até 15% dos seus rendimentos excluídos de IRS. O relatório destaca que aqueles “que não paguem IRS não têm acesso ao mecanismo de proteção previsto” e admite que “poderia ser mais eficaz considerar um instrumento de despesa direta que chegaria a todos os indivíduos”.

Ilusão política e fraca responsabilização

Afinal, nota o documento, 50% das famílias e um terço das empresas do país não beneficiam da despesa fiscal ao não pagarem impostos. Mas os benefícios fiscais “fazem parecer que o governo é menor e que proporciona maiores benefícios”. “Isto cria a ilusão de eficiência política quando, na realidade, os benefícios fiscais podem não ser mais eficientes que programas de despesa direta”.

Por isso, uma das recomendações é para que os orçamentos do Estado passem a considerar a despesa fiscal com tanto detalhe quanto consideram a despesa direta – nomeadamente, com uma classificação orgânica que responsabilize cada ministério pelos custos com os benefícios.

“Ao não serem imputados aos ministérios, os benefícios fiscais funcionam como bandeiras de política de um determinado ministério sem a correspondente responsabilização pelos seus custos”, alerta.

Outra das propostas é para que os governos passem a considerar o corte da despesa fiscal nas ações para reduzir o défice. E que cada novo benefício criado seja compensado do ponto de vista do equilíbrio orçamental.

O relatório destaca que a despesa fiscal, tal como hoje é considerada nos orçamentos, equivale a 6% do PIB – ou a 2%, quando se excluem as taxas preferenciais de IVA. Trata-se de “um instrumento de políticas públicas materialmente pesado e que deve, por isso, ser utilizado com todo o rigor”, diz.

Outra das sugestões deixadas é a de que o governo aproveite o levantamento feito pelo grupo para iniciar uma base de dados pública online que vá sendo regularmente atualizada, e que traga informação simplificada ao contribuinte sobre a forma de aproveitar os benefícios. Ao mesmo tempo, propõe que este inclua uma espécie de conta-corrente com o saldo da despesa fiscal consumida por cada contribuinte.

O relatório do grupo de trabalho faz fichas de monitorização para 18 benefícios fiscais, 11 dos quais medidas cujo prazo foi prorrogado pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, até ao final deste ano e cuja continuidade estará dependente da avaliação.

Outros cinco são os benefícios em IRC e IRS com impactos de despesa mais pesados, como o Regime Fiscal dos Residentes Não Habituais, e ainda o Sistema de Incentivos Fiscais à I&D Empresarial. Neste último caso, é feita uma avaliação mais detalhada do custo benefício, com o grupo de trabalho a concluir que por cada euro que o Estado deixa de cobrar há um investimento superior a esse valor em inovação.

O relatório não considera na lista de benefícios as taxas de IVA mais reduzidas que passaram a ser incluídas como despesa fiscal a partir de 2017 – embora a decisão não tenha sido consensual – e exclui de qualquer avaliação os benefícios concedidos às empresas da Zona Franca da Madeira. Segundo o documento, porque o assunto está neste momento a ser alvo de uma avaliação pela Comissão Europeia.

O trabalho agora divulgado foi liderado pela economista Francisca Guedes de Oliveira e no grupo de 12 peritos incluem-se sete funcionários da Administração Tributária e Ministério das Finanças.

Alterado às 13h45. O governo pretende reduzir a despesa em benefícios fiscais em 90 milhões anuais até 2022, e não 2023.

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