observador.ptManuel Villaverde Cabral - 23 mai. 21:57

O que fazer?

O que fazer?

Se a UE quisesse acabar de vez com a abstenção e, sobretudo, com os «soberanistas», deveria pôr o eleitorado de todos os países a votar na mesma lista de cada um dos partidos europeus.

Não estou a invocar a pergunta-chave que Lénine pediu de empréstimo a Tchernischevski enviado anos antes pela polícia do czar para a Sibéria. Mais terra a terra, pergunto tão só o que fazer no domingo que vem em matéria de eleições europeias? O voto português, como o da maioria dos países da União Europeia (UE), excepto os cinco ou seis com maior população, conta pouco e não sai do trivial: «populares» ou «socialistas», mais um para cá, menos outro para lá. Já no conjunto da União, desta vez, as sondagens internacionais vaticinam que a aliança entre «populares e socialistas» que vem governando a UE há décadas poderá ter que se alargar aos «Liberais», o que seria finalmente algo de novo!

O caso do Reino Unido volta a ser importante, pois ainda poderá dar muitos deputados aos inimigos da UE se porventura não conseguir sair da União, como aparentemente não consegue. Perante o pequeno número de deputados que Portugal pode dar a cada um dos dois grandes grupos parlamentares que até agora têm contado para a orientação da UE, a importância do voto português é baixa para não dizer mínima, tanto mais que cerca de 80% dos votantes elegem deputados pertencentes ao eterno grupo dos «dois e meio» (PS, PSD e CDS)!

É daí que vem boa parte da abstenção maciça do eleitorado português, a qual chegou a dois-terços nas anteriores eleições. Se a UE quisesse acabar de vez com a abstenção e, sobretudo, com os «soberanistas» de extrema-direita e de extrema-esquerda, que só querem sair da União ou, pelo menos, da moeda única, a UE deveria pôr o eleitorado de todos os países a votar na mesma lista de cada um dos partidos europeus, os quais apresentariam listas de candidatos originários de todos os países sendo eleitos segundo a percentagem do partido em questão e não da nacionalidade de cada um. Nessa altura, talvez os eleitores de cada país de sentissem mais perto dos deputados dos partidos europeus e não dos «partidos locais», que são especialista em dizer uma coisa cá e outra lá. Mas isto já são ideias avançadas demais para a burocracia que domina a UE desde sempre à imagem do remoto ideal do pós-guerra: centro-direita/centro esquerda. Talvez precisemos de um «centro radical» como aquele de que já tenho falado aqui.

A maioria dos comentadores e dos jornalistas portugueses despreza o significado da abstenção e falam das sondagens como se a abstenção, que se eleva hoje em Portugal a 50% em média, não existisse. Ainda há dias, uma sondagem vendia a ideia de que 80% dos eleitores iriam votar de certeza ou quase. Iriam… mas não irão, como sabemos. Longe disso. Nem nas eleições legislativas quanto mais nas europeias!

Pela minha parte, sou dos que pensam que a abstenção é a prova maior da falta de reconhecimento do eleitorado português, como consumidor da representação política oferecida pelos partidos, num sistema eleitoral imposto sem referendo há mais de 40 anos e, entretanto, blindado pelos tais «dois partidos e meio» para que a oferta não mudasse até hoje como não mudou. E quando a oferta não evolui ou, quando é obrigada por pressão internacional a evoluir, nega que evoluiu, o que sucede é perder os clientes. É aliás de reparar que, para bem ou para mal, os partidos portugueses ainda não descobriram as «redes sociais», que entre propaganda e «fakenews» fazem agir os eleitores noutros países!

Nestas condições de mercado político-partidário arqueológico, para não dizer mentiroso, como um partido que propagandeia no meu bairro que «é preciso aproveitar o dinheiro que vem da União Europeia»!, pouco ou nada há a fazer… Nesta penosa dúvida, que de resto se dissipará rapidamente na segunda-feira seguinte a fim de nos virarmos para as novas escandaleiras que estão para vir de certeza, para não falar de pior, resta ponderar o que Portugal tem hoje em dia a menos e o que tem a mais.

O que temos a menos não será propriamente a Liberdade. Ninguém vai preso se não votar nem se disser mal do governo do dia. Pode talvez perder o lugar na lista para um emprego mas não mais do que isso. O que mais falta é juntar liberalismo à mera democracia eleitoral a que hoje se reduz o nosso sistema. Neste sentido, um voto na «Iniciativa Liberal» faria sentido para identificarmos quanto há de espírito de iniciativa entre nós. Já no que diz respeito àquilo temos decididamente a mais e precisamos urgentemente de varrer para debaixo do tapete é a corrupção. Todos o sabem e, nesse sentido, outro voto indicado para domingo que vem é «Nós Cidadãos», já que o exercício da cidadania é também algo que nos faz muita falta.

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