www.jornaldenegocios.ptJoão Costa Pinto - 20 mai. 20:04

A economia e o euro - (I)

A economia e o euro - (I)

Temos de reconhecer que embora o enquadramento europeu não favoreça movimentos de modernização das economias mais frágeis, muitos dos bloqueamentos com que nos debatemos são explicados sobretudo por causas internas.
1. Estatísticas oficiais recentes indicam que nas duas últimas décadas o produto "per capita" caiu cerca de 3.00% em relação ao valor médio das economias do euro. Embora este indicador global tenha de ser avaliado com cuidado, na medida em que esconde transformações qualitativas importantes, a verdade é que reflecte os bloqueamentos que continuam a travar o nosso desenvolvimento económico e social. E sobretudo explica porque é que no final de 2018 cerca de 1,5 milhões de portugueses permaneciam em risco de pobreza. É um sinal dos tempos que em vez de avaliarmos esta evolução - que em grande parte resulta de políticas públicas incapazes de induzir inovação, eficiência e crescimento - mereçam a nossa atenção algumas décimas acima da taxa média de crescimento da economia da Zona do euro.

Evolução que me reconduz tanto ao contexto como às razões que me levaram a engrossar o número dos que se empenharam a defender a substituição do escudo pela moeda única europeia. Para além dos argumentos de natureza política, considerei na altura que a adesão ao euro se justificava por três tipos distintos de razões técnicas: a solvabilidade externa da nossa economia estava a ser cada vez mais ameaçada por fortes ondas de especulação sobre o escudo (*); o recurso periódico a desvalorizações da nossa moeda protegia a competitividade externa à custa de fortes pressões inflacionistas e da estratificação de um tecido produtivo atomizado, pouco eficiente e de muito baixa produtividade; por último, a convicção de que com o euro a nossa economia ficaria exposta a pressões capazes de induzir inovação e transformações estruturais que conduziriam a aumentos de produtividade e a mais elevados níveis de rendimento e bem-estar.

2. O que é que correu mal? Porque é que não se materializaram as expectativas dos que acreditavam que a adesão ao euro induziria - ou no mínimo facilitaria - um movimento virtuoso de desenvolvimento económico e social que nos aproximaria das economias mais desenvolvidas da Europa? Terá sido o resultado de erros próprios de uma política que favoreceu um modelo de crescimento desequilibrado e insustentável. Um modelo que apostou fortemente no endividamento para financiar investimentos em infraestruturas - com retorno lento e a longo prazo - e deficits correntes crescentes; ficou antes a dever-se ao quadro institucional, jurídico/ regulamentar, burocrático e de governo, implantado na Europa do euro desde ao Acordos de Maastricht e o lançamento do euro? ou resultou sobretudo da subordinação rígida das políticas económicas das economias do euro aos princípios e concepções predominantes junto das elites alemãs? Políticas que hoje estão a bloquear a progressão do movimento de integração financeira dos mercados do euro e a travar o próprio crescimento económico da Zona do euro. A incapacidade para tirar partido do baixo custo do financiamento num programa de modernização das infraestruturas a nível europeu é um exemplo óbvio.

No entanto, temos de reconhecer que embora o enquadramento europeu não favoreça movimentos de modernização das economias mais frágeis, muitos dos bloqueamentos com que nos debatemos são explicados sobretudo por causas internas - desde erros de política económica, até ao tipo de intermediação financeira que se instalou entre nós (a continuar).

(*) - Era então responsável no Banco de Portugal pela condução da política cambial.   

Economista                           

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

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