www.sabado.ptleitores@sabado.cofina.pt (Sábado) - 15 jan. 09:00

A liberdade de expressão do Mário

A liberdade de expressão do Mário

Em nome da tolerância, temos o direito - e, em alguns casos, o dever - de não tolerar os intolerantes. Impedir a banalização do ódio não é sinónimo de ameaça à liberdade de expressão. É apenas ser civilizado - Opinião , Sábado.

Ao longo da última semana, a propósito do neofascista Mário Machado no Você na TV! da TVI, as confusões entre liberdade de expressão, censura, jornalismo, entretenimento, racionalidade e o politicamente correcto dariam para editar uma minienciclopédia. O programa das manhãs não é um programa de informação, é um talk show recreativo, e Manuel Luís Goucha não é jornalista, é um entertainer. Na "entrevista" de 3 de Janeiro a MM, não houve um enquadramento do seu historial de ódio e criminalidade sangrenta, como não houve contraditório digno desse nome. De resto, acusar o pivô de Você na TV! de mau jornalismo é o mesmo que acusar José Alberto Carvalho de não ter qualidades para apresentar o Love on Top.

O objectivo, como o timing escolhido e o tema do dia indicavam, era agitar as audiências pela presença desse "autor de declarações polémicas". Pois bem, MM não é um "autor de declarações polémicas", é o líder de um movimento neonazi - há ou havia suásticas nos seus braços por baixo do fato impecável - condenado por crimes de racismo e violência homofóbica. A atitude normal e reincidente de MM face a Manuel Luís Goucha não é responder com um sorriso de galã de instrutor de fitness, é mandar Goucha para a fisioterapia.

Para uma catrefada de opinion makers, MM tem todo o direito de ir defender "as suas ideias" a um programa de TV. Ora, MM e os seus acólitos não pensam nada. Odiar pretos, judeus e homossexuais não é pensar. MM não tem "opiniões políticas", tem calos nas mãos de dar pancada em quem lhe aparece à frente. Mesmo que MM tivesse "ideias" para apresentar ao mundo, há (imagine-se!) limites para a liberdade de expressão. Antes de mais, eles estão consagrados na lei. Depois, são traçados por um meridiano bom senso que os responsáveis pelos órgãos de comunicação social deveriam ter.

No caso de MM na TVI, o perigo de censura não se coloca porque a lei já proíbe e condena apelos à violência e declarações de ódio racial e religioso. Um indivíduo ou um movimento que defendem o ódio e o racismo colocam-se fora da lei pela simples aplicação das regras do jogo democrático. A defesa do ódio e da violência, que Mário Machado já perpetrou dezenas de vezes, é crime, e as organizações que defendem uma ideologia racista estão proibidas pela Constituição.

Normalizar o fascismo num programa de TV não é lutar contra o "politicamente correcto". Restringir essa normalização é defender um valor elementar do sistema democrático. Em nome da tolerância, temos o direito de não tolerar os intolerantes. Não se pode tolerar sem fortes pré-avisos e o devido enquadramento alguém que é criminalmente intolerante e que, como escreveu Karl Popper, responde aos esforços da racionalidade com a irracionalidade dos punhos e das armas. Impedir a banalização do ódio não é sinónimo de ameaça à liberdade de expressão. É apenas ser civilizado.

Santos e ...
Entre os heróis de 2018, esqueceram-se quase sempre os anónimos que nos salvam a vida todos os dias: os enfermeiros que nos aturam nas Urgências (são muitos), os técnicos do INEM que nos acalmam (a maioria), os bombeiros que lutam até ao limite (todos), os polícias eficazes e gentis (também os há). Sobre esses não há manchetes, ou canções.

... Pecadores
Uma coisa é a justiça social. Outra é a pura palermice. Os 90 membros estrangeiros da Hollywood Foreign Press Association parecem ter sido apanhados pela obsessão dos tempos: senão, como explicar a vitória de Bohemian Rhapsody sobre A Star Is Born, a presença de Black Panther, BlacKkKlansman e If Beale Street Could Talk como três dos cinco nomeados para Melhor Drama ou a vitória de Green Mile sobre Vice e The Favorite?


Texto escrito segundo o anterior acordo ortográfico.

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