expresso.sapo.pt - 10 dez. 09:14
Classe política espanhola precisa de ouvir preocupações dos eleitores do Vox, diz Manuel Valls
Classe política espanhola precisa de ouvir preocupações dos eleitores do Vox, diz Manuel Valls
O antigo PM francês e candidato à presidência da Câmara de Barcelona alerta que o avanço do Vox representa um sério desafio ao status quo político. O partido de extrema-direita conquistou na semana passada 11% dos votos e 12 assentos no Parlamento andaluz. Um acordo entre PP, Ciudadanos e Vox será moral e politicamente comprometedor, alerta Valls
A classe política espanhola precisa de ouvir as preocupações dos eleitores que apoiam o partido de extrema-direita Vox em vez de os descartar como extremistas. Quem o diz é o antigo primeiro-ministro francês e candidato à presidência da Câmara de Barcelona Manuel Valls, em entrevista ao jornal inglês “The Guardian”, divulgada esta segunda-feira.
Para Valls, que foi chefe do Executivo francês entre 2014 e 2016 durante a presidência de François Hollande, alerta que o avanço do Vox nas eleições regionais da Andaluzia na semana passada representa um sério desafio ao status quo político. O partido conquistou 11% dos votos e conseguiu 12 assentos no Parlamento andaluz, tornando-se o primeiro partido de extrema-direita a obter representação desde a morte do general Franco em 1975.
“É um fenómeno político importante e penso que vai continuar”, disse Valls, acrescentando: “Muitas pessoas dizem que são apenas 11% mas [Marine] Le Pen, a Alternativa para a Alemanha e a Liga [em Itália] também começaram dessa forma, conseguindo assentos no Parlamento ou num conselho municipal. E agora estão a expandir-se porque se encontram no centro do debate político.”
“A primeira coisa a fazer é não insultar os eleitores”O fim do sistema político bipartidário tradicional em Espanha abriu espaço ao Vox e a outros partidos, enquanto muitos andaluzes se sentiram ignorados pelos grandes partidos políticos, avaliou Valls. O candidato autárquico reconheceu ainda que o combate à extrema-direita não teve sucesso até agora na Europa, que se encontra numa “crise política, social, económica e cultural”.
“A primeira coisa a fazer é não insultar os eleitores. Penso que houve outro fenómeno na Andaluzia, que foi não se falar sobre os problemas dos eleitores”, considerou, dizendo que “houve uma reação contra isso”. Os principais partidos espanhóis – o PSOE (no poder), o PP e o Ciudadanos – precisavam de “ocupar o centro moderado” e, ao mesmo tempo, reivindicar o patriotismo da extrema-direita.
Embora o PSOE tenha obtido o maior número de votos na Andaluzia, está longe da maioria. O próximo Governo regional deve ser formado até ao fim do mês e poderá ser uma coligação entre o PP e o Ciudadanos, caso o PSOE se abstenha, ou resultar de um acordo entre os dois partidos de direita e o Vox. Valls classifica esta segunda hipótese como moral e politicamente comprometedora: “Penso que seria um erro para o PP, e para todos, fazer acordos com o Vox.”
O “cordão sanitário” em FrançaO líder do PP Pablo Casado “disse que o Vox tem os mesmos valores que o PP e eu acho que foi um erro básico”, avaliou. “Não é apenas uma questão moral, é também um erro estratégico porque estarão a enviar um sinal para os seus eleitores. Se lhes disserem que outro partido partilha os mesmos valores, eles [os eleitores] desaparecem. Estarão a dar-lhes permissão para votarem noutros”, refere.
Na entrevista, Valls serve-se do exemplo francês para dizer: “O que tem funcionado em França há muitos anos – e ainda funciona – é que a direita estabeleceu um cordão sanitário e sempre afirmou que não haveria alianças com a Frente Nacional”. A melhor abordagem seria atender às preocupações estruturais das pessoas, como a imigração, a economia e a crise da independência catalã, conclui Valls.