ionline.sapo.ptMaria Helena Magalhães - 19 set. 11:19

“Pés para que vos quero…”

“Pés para que vos quero…”

Livre-pensadora, Frida Kahlo viveu de forma excruciante. São dela as palavras: “Pés para que vos quero se tenho asas para voar”

Está patente no Centro Português de Fotografia (CPF), no Porto, a exposição “Frida Kahlo – as suas fotografias”, e é deveras interessante. Frida Kahlo, insigne pintora mexicana do séc. xx (1907 – 1954), é mundialmente conhecida, e nem por todos apreciada, pela crua originalidade das suas telas que retratam, de forma pungente, a dor e o sofrimento, físico e não só, que a acompanharam na sua curta vida. Desde a poliomielite que contraiu na infância, ser praticamente atropelada, grave e irremediavelmente, por um elétrico, passar por várias cirurgias e longos internamentos, até à amputação de uma perna, aos 46 anos, Frida viveu de modo excruciante. Não menos dolorosa, todavia, terá sido a sua vida com Diego Rivera, também ele notável artista mexicano, com quem casou, descasou e voltou a casar e a quem idolatrou e de quem suportou todo o tipo de infidelidades – Diego era um femeeiro inveterado –, mesmo indo além do seu amplo conceito de vida conjugal: Frida era uma mulher livre-pensadora, alheia a qualquer tipo de preconceito. Esteve sempre muito à frente do seu tempo! Deixou vasta obra, autorretratos, muitos, paisagens e cenas de inspiração indígena – ela própria fazia questão de exibir trajes regionais; é célebre a garridice dos seus vestidos e adornos. Figura icónica de mulher ainda hoje reconhecida. Dela as palavras: “Pés para que vos quero se tenho asas para voar.” E voou até nós.

Dedicada às artes, Frida tinha particular fascínio pela fotografia; fotografou e, acima de tudo, fez-se fotografar. Na brochura do CPF, dela pode ler-se o seguinte escrito: “Sabia que o campo de batalha do sofrimento se refletia nos meus olhos. Desde então, comecei a encarar diretamente a objetiva, sem pestanejar, sem sorrir, decidida a mostrar que seria uma boa lutadora até ao fim.” E foi.

À excelente exposição fotográfica está associado um documentário, igualmente interessante, com depoimentos vários de quem conhece a obra ou conheceu a artista. Particularmente comovido o de Lila Downs, cantautora mexicana, natural de Oaxaca, ela de igual modo ciente das suas origens mestiças e pondo-as à vista, que confessa ter encontrado em Frida Kahlo a inspiração e o modelo. Lila, antropóloga de formação, revela nas suas composições uma forte consciência política. É sobretudo ativista social, denunciando. A sua ligação a Frida Kahlo é evidente, no modo e no discurso. As letras das canções que canta ou compõe são disso sinal. É vibrante a sua interpretação de “Paloma Negra”, a imortal canção mexicana do compositor de música ranchera Tomás Méndez, cujo teor assenta como uma luva a Frida Kahlo e à sua história de vida. Lila Downs assume-o e canta-a magistralmente.

Tal como a história de Frida, a história do México está recheada de episódios trágicos. Se mais não houvesse, a luta aos cartéis de droga e ao que lhes está associado já seria empreitada bastante, mas o vizinho estadunidense promete infernizar o governo mexicano, não obstante a negociação do estrambólico acordo comercial Estados Unidos-México, logo seguida da requentada pretensão de que o México pague o badalado muro. Mas está de chegada o novo presidente eleito, Manuel López Obrador, apodado esquerdista nos média. Baterá o pé a Trump? A ver vamos.

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