ionline.sapo.ptLuís Menezes Leitão - 18 set. 10:06

A recondução da procuradora-geral da República

A recondução da procuradora-geral da República

O que não parece fazer sentido algum é ter-se transformado a eventual recondução da actual PGR na questão política mais importante do país

Todos os anos, o “Jornal de Negócios” faz uma escolha dos 50 mais poderosos na economia portuguesa. Há já algum tempo que tem colocado na lista a procuradora-geral da República (PGR), Joana Marques Vidal, que todos os anos sobe consistentemente, tendo ficado este ano em 28.o lugar. Sabendo-se que a PGR muito pouco poder económico tem, a escolha é explicada pela enorme influência que os processos colocados pelo Ministério Público têm tido sobre os vários poderes da sociedade, desde o económico ao político e tendo chegado também recentemente ao futebol.

Esse enorme ascendente político do PGR torna extremamente controversa quer a sua nomeação, quer a sua recondução no cargo. Tal viu-se com Cunha Rodrigues, que esteve 16 anos no cargo, precisamente porque, na altura, o mandato era ilimitado e ninguém se atrevia a questionar a sua continuidade. A questão resolveu-se através de revisão constitucional em que se estabeleceu um mandato de seis anos para o PGR (art.o 220.o, n.o 3 da Constituição). É de salientar, no entanto, que esse mandato não garante a permanência do titular no cargo durante todo esse período, uma vez que continua a poder ser a todo o tempo exonerado pelo Presidente da República, sob proposta do governo (art.o 133.o m) da Constituição).

É manifesto que nada na lei proíbe a renovação do mandato do PGR, tendo a posição da ministra da Justiça neste sentido (que alguns vieram logo secundar) correspondido a uma tentativa de arranjar argumentos formais para uma não recondução, num caso em que faltavam quaisquer razões substanciais. Essa intervenção da ministra da Justiça abriu, no entanto, uma caixa de Pandora, passando toda a gente a opinar sobre as vantagens ou não da recondução da PGR. Quase todos os que se pronunciaram fizeram um balanço muito positivo do mandato da actual PGR, com a excepção de Rui Rio, que disse que não avaliava positivamente esse mandato, mas nunca explicou porquê. Por isso, as razões apontadas para a não recondução centraram-se na desvantagem da permanência do PGR no cargo por um período longo (12 anos) ou de um PGR poder tentar agradar ao governo no seu primeiro mandato, na perspectiva de uma eventual recondução. Sabendo-se que, a todo o momento, o PGR pode ser exonerado, desde que o governo o proponha e o Presidente o aceite, não se vê que esses argumentos façam sentido.

. Neste fim-de-semana, o “Expresso” fazia notícia de primeira página sobre o “acordo à vista para manter a PGR” e, no interior, o bastonário da Ordem dos Advogados debatia com o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público a recondução da PGR, pronunciando-se aquele a favor e este contra. Compreende-se que o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público tenha a sua posição sobre quem deve liderar o Ministério Público, mas já se compreende menos que o bastonário da ordem discuta o caso. Não parece que a actual ou qualquer futuro PGR alguma vez venha a pronunciar-se sobre quem deve ser o bastonário da Ordem dos Advogados. De forma muito mais adequada, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça disse, numa entrevista ao mesmo jornal, que não iria pronunciar-se sobre o assunto.

A recondução da PGR é um assunto demasiado importante e sensível para andar a ser discutida na praça pública desta forma. Aguarde-se serenamente que aqueles a quem compete decidir o façam.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

Escreve à terça-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990

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